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Drama afegão: as cenas chocantes do retorno do Talibã ao poder

Enquanto os barbudos de turbante entravam governo, uma multidão de afegãos com passado de cooperação com a ocupação americana corria para a porta de saída

Por Duda Gomes Atualizado em 4 jun 2024, 12h33 - Publicado em 23 dez 2021, 06h00

Seis meses depois de se instalar na Casa Branca, Joe Biden assinou uma ordem histórica: a que pôs fim na última guerra ainda empreendida por soldados americanos em solo estrangeiro, instaurando a paz nas relações com todos os demais países pela primeira vez em muitas décadas. Seria extraordinário — não fosse a confusão que arrumou. A retirada dos últimos 3 500 militares dos Estados Unidos no Afeganistão, encerrando um conflito de vinte anos, começou em maio e tinha prazo para acabar em 31 de agosto. Duas semanas antes, o governo afegão entrou em colapso, o presidente Ashraf Ghani fugiu levando milhões de dólares e o Talibã, o mesmo grupo de radicais religiosos que havia sido deposto quando os americanos chegaram, aboletou-se de novo no governo. Enquanto os barbudos de turbante cruzavam a porta de entrada do palácio de governo, uma multidão de afegãos com passado de cooperação com a ocupação americana corria para a porta de saída — no caso, um espremido lugar nos aviões civis e militares que partiam em ritmo de ponte aérea, um atrás do outro.

Em fuga desesperada, multidões também lotaram estradas e fronteiras, de carro e a pé. Mas as cenas mais dramáticas se desenrolaram na pista do aeroporto, onde pessoas subiram nas aeronaves para que não partissem sem elas e, em casos extremos, se agarraram ao trem de pouso na decolagem. Nas cercas e portões de acesso, patrulhados por soldados dos Estados Unidos, pais entregavam filhos pequenos, na esperança de que servissem de salvo-conduto a sua própria passagem de ida. Terroristas anti-Talibã aproveitaram o caos para explodir um homem-­bomba em atentado que matou 180 pessoas. No dia marcado para o fim da retirada, 30 de agosto, o general Chris Donahue foi o último militar a embarcar no último cargueiro. Deixava para trás um país falido, com suas reservas financeiras ou saqueadas ou bloqueadas em bancos estrangeiros, e dominado pelos mesmos fanáticos que, no passado, cometeram barbaridades em nome de Alá. Quem ficou está penando. Os bancos fecharam por falta de cédulas e a escassez de alimentos afeta 95% dos afegãos. Biden alega que fez o que tinha de ser feito. Há sérias dúvidas.

Publicado em VEJA de 29 de dezembro de 2021, edição nº 2770

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