Ícone de fechar alerta de notificações
Avatar do usuário logado
Usuário

Usuário

email@usuario.com.br
Relâmpago: Revista em casa por 8,98/semana

Do lixo à luz: Curitiba transforma um antigo aterro sanitário em usina solar

Conhecida por adotar iniciativas pioneiras, capital gera economia para os cofres públicos

Por Ernesto Neves, de Curitiba
Atualizado em 3 jul 2025, 13h28 - Publicado em 29 jun 2025, 08h00

A cuidadora Lucilene Pedroso, de 44 anos, lembra-se bem dos impactos que o principal aterro sanitário de Curitiba (PR) causava em seu bairro, o Caximba, na borda sul da cidade. Era ali que, ao longo de 21 anos, o lixo de dezesseis municípios, o equivalente a 3 000 toneladas diárias, encontrava seu destino. O descarte impactava profundamente a região. As crianças sofriam com doenças respiratórias e havia proliferação de insetos e ratos. Por diversas vezes, o chorume não tratado acabava vazando para o Rio Iguaçu.

Hoje, porém, é difícil reconhecer o passado marcado pela tragédia ecológica. A prefeitura de Curitiba cobriu todo o terreno do lixão, desativado em 2010, com vegetação nativa e ergueu ali um inusitado e bem-sucedido projeto de produção de energia: a Pirâmide Solar do Caximba. Trata-se de uma estrutura composta por 8 600 painéis fotovoltaicos. Sobre o solo onde durante décadas se acumulou uma montanha de lixo, agora raios de sol são captados e transformados em eletricidade, demonstrando como a cidade pode encontrar soluções inteligentes para problemas ambientais. “Virou um ponto turístico, vem gente de outros lugares para ver de perto essa transformação”, afirma Lucilene. A reportagem visitou o local como parte da Expedição VEJA, que está rodando o Brasil para conhecer projetos inovadores de sustentabilidade e destacar temas relacionados à agenda da COP30, a Conferência sobre Mudanças Climáticas da ONU que acontecerá em novembro em Belém, no Pará.

A energia gerada na Pirâmide Solar do Caximba é transferida diretamente para a rede da Copel, a concessionária de distribuição de energia da capital paranaense, por meio do chamado sistema de compensação, o que permite abater o consumo elétrico de prédios públicos municipais. A produção beneficia principalmente escolas, unidades de saúde, centros administrativos e equipamentos de assistência social. No total, cerca de quarenta imóveis são contemplados. Com isso, a prefeitura de Curitiba deixa de pagar parte significativa da conta de luz, o que representa uma economia estimada em até 2,5 milhões de reais por ano aos cofres públicos.

Segundo a administração municipal, os recursos economizados são redirecionados para áreas prioritárias. A iniciativa vai além do benefício fiscal. Ela demonstra como é possível transformar passivos ambientais em ativos sustentáveis e evidencia o papel do poder público como indutor da transição energética. “A partir do momento que você diversifica a produção energética, também impulsiona a economia e deixa a cidade mais preparada para lidar com os extremos do clima”, afirma Alessandro Bertolino, engenheiro ambiental da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

arte COP 30

Continua após a publicidade

Adaptar o antigo aterro sanitário para a construção da Pirâmide Solar foi um dos maiores desafios de engenharia urbana enfrentados por Curitiba nos últimos anos. O terreno era instável e composto por resíduos acumulados durante décadas, formando um entulho de 70 metros de altura. Foi preciso, então, reconfigurar sua base. Técnicos da prefeitura e engenheiros ambientais realizaram um extenso trabalho de compactação e cobertura do solo com camadas de material impermeável, evitando assim o risco de vazamentos e garantindo a segurança da estrutura. “É como se fosse uma gelatina, uma área muito instável”, afirma Luciana Castro, engenheira civil que participou da construção da usina. “Foram necessários quatro anos de estudo.”

As estruturas metálicas que sustentam os painéis solares foram projetadas com estacas especiais para evitar o afundamento ou movimentações irregulares do solo. Os engenheiros também mapearam áreas com emissão de gases como o metano, típico de lixões desativados, e desenvolveram um sistema de ventilação controlada. Além disso, o projeto exigiu adaptações para conectar a usina à rede elétrica da cidade e garantir eficiência energética mesmo em um terreno hostil à construção.

A Pirâmide Solar é parte de um esforço mais amplo para acelerar a geração de energia renovável em prédios públicos. Além do Caximba, escolas municipais, unidades de saúde e terminais de ônibus passaram a receber painéis fotovoltaicos desde 2022, reduzindo em 15%, em média, o custo anual da energia elétrica consumida por esses equipamentos. A prefeitura também investe em usinas distribuídas em pontos específicos, como a instalada na Fazenda Urbana do Cajuru. Além de gerar energia, esse espaço funciona como centro de educação ambiental e formação em agricultura urbana, promovendo a economia solidária e a inclusão social. A meta da administração municipal é alcançar a autossuficiência energética em 100% dos prédios públicos até 2030. Em 2024, a prefeitura firmou parceria com instituições financeiras internacionais, assegurando 600 milhões de reais em crédito por meio do programa Curitiba Carbono Neutro, para tornar viáveis projetos de energia solar e modernização da frota de transporte coletivo. “As cidades têm capacidade de criar soluções rápidas e, por isso, são fundamentais no enfrentamento da crise climática”, diz Marilza Dias, secretária municipal do Meio Ambiente de Curitiba.

Continua após a publicidade

A governança arrojada exibida por Curitiba tem raízes históricas. Nas décadas de 1960 e 1970, o urbanista Jaime Lerner e sua equipe criaram inovações como o Bus Rapid Transit (BRT), modelo de transporte rápido por ônibus que revolucionou as cidades e foi adotado em mais de 200 municípios ao redor do mundo. Também foram construídas na capital paranaense as primeiras ruas exclusivas para pedestres, depois copiadas pelo país afora. A cidade que já foi símbolo de planejamento urbano hoje é um laboratório de soluções climáticas, uma aposta essencial para manter sua liderança nacional em qualidade de vida.

Publicado em VEJA de 27 de junho de 2025, edição nº 2950

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

15 marcas que você confia. Uma assinatura que vale por todas.

OFERTA RELÂMPAGO

Digital Completo

A notícia em tempo real na palma da sua mão!
Chega de esperar! Informação quente, direto da fonte, onde você estiver.
De: R$ 16,90/mês Apenas R$ 1,99/mês
ECONOMIZE ATÉ 28% OFF

Revista em Casa + Digital Completo

Receba 4 revistas de Veja no mês, além de todos os benefícios do plano Digital Completo (cada revista sai por menos de R$ 10,00)
De: R$ 55,90/mês
A partir de R$ 39,99/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$23,88, equivalente a R$1,99/mês.