Inépcia deixou Bolsonaro no isolamento político e na retórica do conflito
Ele esgotou sua presidência no espetáculo do confronto, quase nada construiu e quase nada tem a oferecer ao eleitorado nos 16 meses até à eleição
Amanhã vai ser outro dia. Jair Bolsonaro amanhecerá menor do que estava ontem porque esgotou sua presidência no espetáculo do confronto.
Como presidente, quase nada construiu na primeira metade do mandato, por isso, quase nada tem a oferecer ao eleitorado para os próximos 16 meses que faltam até à eleição.
A inflação cresce e corrói o orçamento de oito de cada dez eleitores, chefes de famílias pobres. A estagnação econômica expulsa 20 milhões do mercado de trabalho. E a perspectiva para o ano eleitoral é de pobreza aumentando, de juros subindo e de escassez de capital. Piora, se houver racionamento de energia.
A inépcia legou ao candidato o isolamento político e a retórica do conflito. “É pela liberdade”, ele repetirá nos comícios marcados para hoje em Brasília e em São Paulo. Na realidade, é somente o clamor por uma guerra em causa própria — incluindo a parentela, enredada em múltiplos inquéritos criminais.
Bolsonaro, é necessário reconhecer, tem a virtude do político que no vácuo aberto pela oposição é capaz de pautar o debate nacional.
O país conta mais de 580 mil mortos na pandemia, cujo controle o governo perdeu desde o início, e está com a economia combalida. Mas nos últimos dois meses, por exemplo, ele impôs o rumo da discussão: o retrocesso ao voto impresso e, agora, o “golpe” no 7 de setembro.
Notável é que, dentro e fora do Congresso, seus adversários reais ou potenciais se mantêm no “modo silêncio” diante do alarido, das ameaças de incêndio do regime democrático.
Deixaram para o Judiciário, mais exatamente para o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, o papel de contenção do “Napoleão”, como o qualificam.
Esse tipo de jogo é de alto risco, como ensinou Maradona à saída de uma de suas temporadas em clínicas de reabilitação: “Tinha lá um cara que dizia que era Napoleão e outro que pensava que era San Martín [heroi da independência da Argentina, do Chile e do Peru]. E quando eu dizia que era o Maradona, ninguém acreditava.”
Bolsonaro cresceu no silêncio oposicionista, como fez durante 28 anos de mandatos na Câmara. Seu isolamento político, o derretimento nas pesquisas e a vereda rumo à liquefação em que caminha são escolhas pessoais, exclusivas.
Para a maioria não está interessada em segui-lo ao abismo, e demonstra sua insatisfação nas pesquisas, ainda falta a trilha alternativa para o amanhã — novo dia no ano 199 da Independência.