Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana
Imagem Blog

Ricardo Rangel

Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Continua após publicidade

O solipsista suicida

O governo segue a doutrina de que só existem o eu e suas sensações

Por Ricardo Rangel Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 15h14 - Publicado em 25 set 2020, 06h00

Os militares bem que deram a dica. O general Augusto Heleno acusou ONGs, índios, o PSOL e até o DiCaprio de patrocinarem fake news contra Bolsonaro e de trabalharem “24 horas por dia para manchar a nossa imagem no exterior, em um crime de lesa-pátria” (Heleno acha que governo e pátria são a mesma coisa). E disse que as críticas estrangeiras sobre o desmatamento na Amazônia visam a “prejudicar o Brasil e derrubar o governo Bolsonaro”.

Ramos atribuiu a chuva em Mato Grosso à visita de Bolsonaro, pois “Deus está com o presidente” e “continuará a abençoar o Brasil, em que pese (sic) todas as campanhas contra esse governo!”. Deus é brasileiro, está com o Messias e não abre.

A paranoia, o delírio e o messianismo (epa) deram o tom do discurso na ONU. Bolsonaro inventou que há uma campanha de desinformação contra o seu governo; que o Supremo o impediu de agir contra a pandemia; que a culpa das queimadas é de índios e caboclos; que combate o desmatamento com rigor; que não faltou atendimento nos hospitais; que cuidou dos índios; que o óleo no Nordeste foi terrorismo. E muito mais. Mais desconectado da realidade, impossível. Fosse um cidadão privado, correria o risco de ser internado pela família em um hospício.

Não se sabe se Bolsonaro acredita nas próprias lorotas, se supõe que algum país acreditará, ou se o que quer é tão somente engabelar o eleitorado. Consta que os militares exultaram com o discurso que ajudaram a escrever: ele explica a realidade como a veem (distorcida) e reclama da perseguição que fantasiam. Mas o Brasil tem imprensa e os países têm embaixadores: ninguém precisa de Bolsonaro na ONU para explicar o que está havendo aqui.

“A paranoia, o delírio e o messianismo deram o tom do discurso de Bolsonaro na ONU”

Discursos não servem para explicar — ou para enganar — nem para reclamar. “Nunca explique, nunca reclame”, ensinou Benjamin Disraeli. Discursos servem para convencer. E para obter algo. O da ONU deveria servir para convencer o mundo de que o Brasil está ciente da gravidade do problema ambiental e que vai tomar providências. Ao mentir que vai tudo bem, Bolsonaro convenceu os nossos parceiros comerciais de que a sua palavra não vale nada e que não vai mudar de atitude. E nada obteve. A União Europeia tende a enterrar o acordo comercial, nos impor sanções e buscar outros fornecedores.

Continua após a publicidade

Há um componente solipsista no governo. O solipsismo é a doutrina segundo a qual só existem o eu e suas sensações, tudo o que parece externo é, na verdade, uma extensão do eu. Bolsonaro e os militares supõem que não existe crise no ambiente porque assim o querem, e que os outros vão acreditar nisso porque eles assim o dizem. E que mentir na ONU não nos trará prejuízo.

O solipsismo do governo não se limita ao ambiente, é grave sobretudo na economia. Bolsonaro precisa cortar 20 bilhões de reais para respeitar o teto de gastos, mas desidratou a reforma administrativa, estimulou o Congresso a dar 1 bilhão às igrejas, desagrada aos parceiros comerciais, quer criar Renda Brasil e Pró-Brasil. Enquanto isso, a inflação ressurge, o juro de longo prazo sobe, a dívida fica maior e mais curta.

O solipsista não se suicida sozinho. Ele nos leva junto.

Publicado em VEJA de 30 de setembro de 2020, edição nº 2706

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.