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Política, negócios, urbanismo e outros temas e personagens gaúchos. Por Paula Sperb, de Porto Alegre

Carpinejar, sobre palestras: ‘Ninguém está escondendo nada’

Escritor diz que sua contratação para projeto em São Leopoldo se trata de um caso de inexigibilidade de licitação previsto em lei

Por Paula Sperb
Atualizado em 9 set 2017, 13h35 - Publicado em 9 set 2017, 13h22

O escritor Fabrício Carpinejar diz que sua contratação pela prefeitura de São Leopoldo, na região metropolitana de Porto Alegre, para palestras contra o bullying escolar não tem qualquer tipo de irregularidade porque se trata de um caso de inexigibilidade de licitação previsto em lei. “Falam como se eu tivesse roubado, participado de uma maracutaia. Ninguém está escondendo nada”, disse Carpinejar a VEJA.

O pagamento das palestras foi suspenso em caráter liminar pelo juiz Ivan Fernando de Medeiros Chaves. No seu despacho, o juiz argumenta que a prefeitura deveria ter esclarecido a justificativa para não exigir licitação para o programa de combate ao bullying, que prevê a realização de palestras de Carpinejar em trinta escolas públicas da cidade. No Brasil, um em cada dez alunos de 15 anos é vítima de bullying. 

“As pessoas pensam que bullying é metáfora. As pessoas não acreditam o bullying é real. Há casos gravíssimos de bullying na cidade (São Leopoldo). Uma menina se matou, há menos de um mês, porque que não sabia o que fazer. Imagina o que um gay sofre numa escola, um trans. Vejo apelidos como neguinho, meu macaco, meu mico, é um racismo muito operante”, disse o escritor à reportagem.

“O assunto não é brincadeira. E por ser de fundo emocional não significa que não tem vítimas fatais. Pais e mães entendem o que estou falando. Professores e diretores da escola suportam novas formas de bullying, presencial e digital”, escreveu na sua página do Facebook.

O escritor diz que os próprios comentários na internet sobre o caso provam como é necessário debater sobre o bullying. “Olha os comentários. As pessoas criticam minha aparência como se eu fosse um monstro”, falou a VEJA.

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A liminar respondeu a uma ação movida pela professora aposentada Márcia Vieira Coelho, que ficou indignada por ter seu salário parcelado há meses pelo prefeito Ary Vanazzi (PT) enquanto o escritor receberia por hora praticamente o piso da categoria, que é de 2.298 reais por mês.

“O orçamento de oitenta mil reais se refere à trinta palestras e mais transporte. Ou seja, o preço de cada palestra (2,1 mil) está três vezes menor do que o meu valor de mercado (7 mil por palestra)”, escreveu Carpinejar em seu perfil do Facebook.

“Não se tem nenhuma discussão sobre o artista. Ele é extraordinário, de renome, respeitado pela obra literária. Mas se discute as escolhas que o administrador público faz em momento de crise financeira grave”, disse o advogado da aposentada, João Darzone, em entrevista anterior a VEJA.

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“Fico chateado com o atraso do pagamento dos servidores. Quando o projeto foi definido, ainda não estava nessa situação. De qualquer maneira, o fundo (de onde sai a verba do projeto) é para uso na formação (na área da Educação). Seria irregular usá-lo para outros pagamentos”, disse Carpinejar.

A atual secretária-adjunta de Educação do município, Mariléia Sell, argumenta que apesar das dificuldades orçamentárias, o valor do projeto é muito inferior se comparado a ações da gestão anterior, quando o prefeito era Aníbal Moacir (PSDB). Segundo a secretária-adjunta, o governo anterior gastou 1,6 milhão de reais em um projeto pedagógico terceirizado com jogos e livros para dezesseis escolas que não obteve os resultados desejados.

‘Apelidos pavorosos’

Além da formação docente e de experiência anterior com o projeto estadual “Educar sem Discriminar”, realizado entre 2013 e 2014, quando debateu com mais de 20 mil alunos gaúchos sobre bullying, Carpinejar sofreu violência escolar na infância. Sua experiência é contada no livro Filhote de Cruz Credo (2006).

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“Eu era estranho, diferente. Tinha dificuldade de aprendizagem e recebi um diagnóstico de retardado aos sete anos. Quem me alfabetizou foi minha. Na escola, eu não podia ir no recreio (pela violência). Eu recebia apelidos pavoroso. Tinha alunos repetentes muito maiores do que eu. Eu tinha que passar a merenda, a turma m esperava no final da aula para me bater. Fiquei de pernas para o ar no refeitório….”, contou o escritor para a reportagem.

‘Sem coitadismo’

Carpinejar relembra que na escola, a menina pela qual estava apaixonado, o chamou de “panqueca”. Ao perguntar o porquê, a garota respondeu: “Tu não viu a tua cara? É toda amassada”. “Toda turma riu”, relembra o escritor. Segundo ele, a partir daí passou usar a “palavra”, a “melhor arte marcial que existe”, na sua definição. “Sou panqueca mesmo, sempre me vi como panqueca. Tu vai me comer agora ou depois?”. O escritor diz que o exemplo é dado aos alunos porque demonstra que é possível se livrar do bullying “sem coitadismo”. “Acabei namorando com ela”, revela o autor.

Cyberbullying

Segundo o escritor, a reação de parte da comunidade que não compreendeu o projeto “revela a desimportância” do tema na sociedade. “Bullying não é frescura”, diz. Para ele, a situação se agrava atualmente pelas possibilidades da violência virtual. “Hoje se exclui uma criança só por ações no Facebook, no Instagram”, opina. “Recebi um comentário d eum menino de 13 anos que pediu uma garota em namoro pelo Whatsapp e ela espalhou a mensagem dele para toda a turma, ele foi desmoralizado”, exemplifica.

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