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A conversa de Bolsonaro e Marcola sobre ‘pena de morte’

'No dia em que eu for ditador deste país, vamos resolver esse problema. Pode ter certeza disso aí', disse o presidente ao chefe do PCC, em 2001

Por Gustavo Maia Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 24 out 2022, 10h05 - Publicado em 19 out 2022, 12h41

No dia 21 de agosto de 2001, o então deputado federal Jair Bolsonaro foi até uma audiência pública em uma comissão especial de combate à violência da Câmara para ficar frente a frente com Marco Willian Herbas Camacho, o chefe do PCC, conhecido como Marcola. Durante alguns minutos, os dois trocaram impressões sobre a pena de morte no Brasil — proibida por cláusula pétrea da Constituição —, e o atual presidente da República declarou que “esse problema” seria resolvido no dia em que ele fosse “ditador deste país”.

O diálogo foi resgatado nesta terça pelo pesquisador e escritor Rodrigo Cassis, que se dedicou a analisar milhares de discursos de Bolsonaro e escreveu uma série de livros sobre o presidente intitulada “Com que moral?”.

A audiência ocorreu no dia em que Patrícia Abravanel, uma das filhas de Silvio Santos, foi sequestrada. Bolsonaro começou sua intervenção dizendo que apoiava a greve de policiais militares — também vedada pela Constituição — e justificou dizendo que Marcola “falou uma coisa óbvia” ao dizer que “quem não faz barulho não vai ser lembrado nunca”. Durante suas falas anteriores, o criminoso havia defendido as rebeliões em presídios como forma de melhorar as condições nos locais.

O então deputado falou na sequência que não empregaria Marcola no gabinete dele se ele saísse da prisão e disse que a mão de obra estava sobrando por aí “porque não há política de controle de natalidade neste país”. Defendeu pena de morte no Brasil, a exemplo do que já existe dentro dos presídios. E destacou que a punição deveria valer para “crime de colarinho branco”. Marcola concordou.

“No dia em que eu for ditador deste país, vamos resolver esse problema. Pode ter certeza disso aí. Democraticamente, não vamos resolver nunca. É a mesma coisa de chover no molhado. Assim como os senhores, acredito na pena de morte”, declarou Bolsonaro há pouco mais de 21 anos. Em 2018, ele foi eleito para o Palácio do Planalto.

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No último dia 2, primeiro turno das eleições, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, determinou que Bolsonaro, seus filhos, alguns sites e ao menos 15 pessoas ligadas ao bolsonarismo removam das redes notícias falsas que dizem que Marcola declarou voto em Lula nesta eleição.

Marcola foi citado por Bolsonaro no debate da Band do último domingo, quando o presidente questionou o ex-presidente por que ele não retirou o criminoso de São Paulo, como ocorreu no início do seu governo, em 2019. Em março desse ano, o chefe do PCC foi transferido do Distrito Federal para a penitenciária federal de Porto Velho, em Rondônia, onde está preso no momento.

Leia a seguir o diálogo na íntegra, que pode ser consultado nas notas taquigráficas da Câmara:

Deputado Jorge Tadeu Mudalen (presidente da comissão) — Com a palavra o Deputado Jair Bolsonaro.
Deputado Jair Bolsonaro — Como não participei da reunião, serei bastante breve. O Camacho falou uma coisa óbvia: quem não faz barulho não vai ser lembrado nunca.
Marco Willian Herbas Camacho (Marcola) — Exatamente.
Jair Bolsonaro — É por isso que apoio as greves das Polícias Militares. E se a PM de Brasília bobear, não reclamar também, de vez em quando não fizer seu barulho, vai acabar ficando com a remuneração igual à dos colegas do Rio de Janeiro, 600 reais por mês, uma coisa ridícula. Nossas autoridades não têm capacidade de se antecipar aos problemas. Agora, também não sou favorável ao senhor, Camacho. O senhor tem de cumprir sua pena. Eu jamais o empregaria no meu gabinete se o senhor saísse da prisão um dia. Mas o senhor pode também não querer trabalhar comigo.
Marcola — Não é só o senhor, ninguém me empregaria. Isso que é difícil.
Jair Bolsonaro — A mão de obra está sobrando por aí também.
Marcola — Exato.
Jair Bolsonaro — Porque não há política de controle de natalidade neste país etc.
Desde criança aprendi — sou do interior de São Paulo — que apenas se respeita aquele que se teme.
Marcola — Não acredito nisso.
Jair Bolsonaro — Não acredita?
Marcola — Respeito o Dr. Sebastião Coelho e não o temo.
Jair Bolsonaro — Tudo bem. Se se acabar com a disciplina, por exemplo, dentro do Exército brasileiro, do qual sou capitão, fica difícil comandar. Isso pode levar até a situações adversas. Defendo que se tem de plantar para colher na frente. Não sei se vou colher e o que vou colher um dia. Assim como os senhores dentro do presídio se respeitam, tendo em vista a pena de morte lá dentro, creio que, se implantássemos a pena de morte no Brasil, muita gente não estaria lá dentro, já estaria enterrado depois de devidamente eletrocutado. A OAB é contra a pena de morte, porque preso condenado não paga advogado, mas tudo bem. Ou o preso estaria nessa situação, ou ele pensaria mais vezes antes de cometer um delito. Por exemplo, hoje foi sequestrada a filha do Silvio Santos. Não o estou defendendo por ele ser rico. Ninguém estupra mulher feia, ninguém vai sequestrar pobre. É uma coisa óbvia. Então, não sei se o senhor falou sobre isso, logicamente é uma pergunta um tanto quanto inocente de minha parte. Penso que a pena de morte serviria para inibir em muito a criminalidade do país.
Marcola — Acho que não.
Jair Bolsonaro — Para crime de colarinho branco também.
Marcola — Aí, sim.
Jair Bolsonaro — Tem que se começar por aí.
Marcola — Se começar por cima, vai afetar embaixo. Agora, se começar por baixo, não vai afetar em cima.
Jair Bolsonaro — No dia em que eu for ditador deste país, vamos resolver esse problema. Pode ter certeza disso aí. Democraticamente, não vamos resolver nunca. É a mesma coisa de chover no molhado.
Assim como os senhores, acredito na pena de morte.
Marcola — Estou há quatorze anos preso. Nesse tempo, passei por muita coisa horrível na prisão. Já fui morto mais de dez vezes na prisão. Preferiria que tivessem me aplicado uma injeção quando lá cheguei aos dezoito anos. Assim, não estaria aqui agora e não teria sofrido o que sofri. Para mim, teria sido um alívio a pena de morte, embora eu não tenha cometido nenhum crime que a merecesse. Não tenho nenhum homicídio, nem nada que justifique a pena de morte.
Jair Bolsonaro — Sou contra a política de direitos humanos neste país.
Marcola — O senhor é contra?
Jair Bolsonaro — Sou contra. Direitos humanos é para seres humanos. Já fui candidato a Presidente da Comissão por uma vez e perdi por um voto: só tive o meu voto. Não está aqui a Deputada Zulaiê Cobra, pois eu gostaria de falar perto dela, e ainda mais porque vou falar a respeito de um Governador que já faleceu, o Mario Covas. No seu Governo, foi proposta indenização aos familiares dos 111 mortos do Carandiru. Peguei aleatoriamente a ficha de apenas dez daqueles que morreram e vi que tinham cometido vinte e dois crimes. Fazendo a projeção…
Marcola — Mas muitos não tinham sido nem condenados.
Jair Bolsonaro — Tudo bem. Mas muitos tinham sido condenados também.
Marcola — O Estado não tem esse direito.
Jair Bolsonaro — Se for feita uma projeção por baixo, havia mais ou menos cem familiares. Esses 111 presos deixaram viúvas e órfãos sem recursos. Infelizmente, esses garotos, sem pais, vão entrar na criminalidade no futuro. Até o Paulo Maluf disse: “Estupra, mas não mata.” E o pessoal desce o pau no Maluf por causa disso. Agora, tantos crimes hediondos acontecem. Se houvesse a pena de morte, com toda certeza muitos desses crimes deixariam de acontecer.
Marcola — Mas acho que deveria começar de cima.
Jair Bolsonaro — Tudo bem. Começa por onde começar, mas tem que começar.

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