Geraldo Alckmin não está mais se sentindo em casa no partido que ajudou a fundar e pelo qual foi deputado, governador de São Paulo por quatro mandatos e duas vezes candidato à Presidência (2006 e 2018). O tucano hoje se sente traído pelo grupo ligado ao governador João Doria e caminha para disputar pela oposição o comando do estado, que é o berço do PSDB, a sua cidadela eleitoral há 26 anos e que será estratégico para a disputa presidencial em 2022, quando a sigla enfrentará o bolsonarismo e o petismo.
A mágoa de Alckmin tem um motivo: o partido não lhe franqueará as portas para tentar o quinto mandato. O candidato deverá ser o vice-governador Rodrigo Garcia, que trocou o DEM pelo PSDB e vai assumir o Palácio dos Bandeirantes em abril, caso avance o plano de Doria de sair de lá para tentar a Presidência (ele precisa ainda vencer as prévias do partido, agendadas para novembro). Com a porta da candidatura fechada, Alckmin está abrindo a de saída. Ele negocia com o DEM para disputar pela legenda, em um movimento que embute a expectativa de uma dupla vingança contra Doria: a de Alckmin e a de ACM Neto, presidente do DEM, que fixou isso como meta desde que o governador levou Garcia para o PSDB. Outra opção é o PSD de Gilberto Kassab. Segundo políticos próximos ao ex-governador, Alckmin já se vê e se movimenta nos bastidores como se estivesse fora do PSDB: passou as últimas semanas costurando apoios a sua candidatura.
Para segurá-lo, a cúpula do PSDB propôs a realização de prévias estaduais, abrindo mão da tradição de que quem está no cargo tem prioridade para ser candidato. Alckmin não mordeu a isca, pois sabe que seria difícil vencer Garcia sem a máquina do governo nas mãos. Outra tentativa seria convencê-lo a concorrer ao Senado, mas José Serra não abre mão de disputar a reeleição. O PSDB sabe que, se Alckmin sair, levará prefeitos e diretórios de cidades grandes. Sem contar que ele lidera as pesquisas, seguido por Márcio França (PSB), o seu ex-vice. Já Garcia perde até para nomes da esquerda. A VEJA, bem ao seu estilo, Alckmin disse não ser hora de falar de política. “Vamos deixar mais para a frente.” Por mais que disfarce publicamente, o tucano que hoje é um estranho no ninho se prepara para bater asas.
Publicado em VEJA de 9 de junho de 2021, edição nº 2741