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Amigo brasileiro muda versão sobre o passado marxista do pai de Kamala Harris

Motivação de colega de Donald Jasper Harris na Universidade de Brasília é evitar prejuízo à campanha da candidata à presidência dos EUA

Por Hugo Marques Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 6 out 2024, 16h55

No mês passado, durante o debate presidencial da ABC News, nos Estados Unidos, o candidato republicano Donald Trump chamou a vice-presidente Kamala Harris de marxista, vinculando a democrata ao pai dela, o economista aposentado Donald Jasper Harris. “Se ela fosse eleita, seria o fim do nosso país. Ela é marxista. Todo mundo sabe que ela é marxista. O pai dela é um professor marxista de economia, e ele a ensinou bem”, disse Trump durante o debate.

Alvo de Trump, o economista Donald J Harris deu aulas e participou de seminários na Universidade de Brasília (UnB) na década de 1990. Na época, ele já tinha escrito seu livro Capital Accumulation and Income Distribution (Acumulação de Capital e Distribuição de Renda, em tradução livre), de 1978, no qual faz uma dedicatória às filhas Kamala e Maya. No livro de 314 páginas, Don Harris cita Karl Marx e as teorias marxistas mais de 260 vezes, para fazer uma crítica às principais teorias econômicas.

O impacto dessa produção acadêmica ultrapassou a fronteira americana e está repercutindo no Brasil — mais precisamente na UnB, onde um amigo do pai de Kamala Harris, o professor emérito Joanílio Teixeira, tenta suavizar a pecha empregada por Trump.

Professor alterou organograma para excluir amigo do grupo de marxistas

O professor Joanílho Teixeira, que hospedou Don Harris durante três meses em Brasília, admite que alterou um organograma que fez de vários economistas e tendências de pensamento para retirar o pai de Kamala do grupo de marxistas. “Naquela época, eu coloquei ele num grupo de marxistas, mas foi um erro meu”, diz. “Na UnB, a aula dele era sobre economia política voltada para a distribuição, e aí entrava muito fortemente Marx”.

Hoje, o professor da UnB coloca o nome do amigo no grupo dos pós-keynesianos. “Nos dias de hoje, falar que é marxista, a pessoa sente algum tipo de dificuldade, um tipo de incômodo. As pessoas criticam o uso que foi feito do marxismo em países como a União Soviética, aquilo foi um desastre”. Joanílio se mostra preocupado com a possibilidade de a temporada de Don Harris no Brasil repercutir negativamente na campanha de Kamala Harris.

“Eu tenho que ter uma certa cautela. Eu tenho muito medo de criar algum tipo de transtorno, a filha dele é quase presidente, ela tem muita chance, e ele não está muito envolvido com a campanha dela, está se afastando’”, afirma o professor. “De certo modo, ela (Kamala) ficou preocupada porque ele (Don Harris) escreveu algumas coisas sobre marxismo. Muita gente associa isso a ele ser um marxista meio intransigente, ou coisa parecida, o que não é verdade, mas que pode prejudicar a campanha dela”.

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Em sua temporada brasiliense, Don Harris costumava ir a bares e restaurantes com grupos de alunos da UnB para tomar cerveja e bater papo sobre economia. À noite, as conversas eram na casa de Joanílio no Lago Sul, bairro nobre da capital. Lá, faziam churrasco nos finais de semana e ouviam muita MPB.

Professor da UnB naquela época, o ex-senador e ex-governador Cristovam Buarque também é cuidadoso ao classificar o trabalho do colega americano. “Eu acho que ele era marxista, keynesiano, mas não era um ortodoxo”, declara Cristovam. “Não era um ortodoxo dedicado a Marx não. Ele é um progressista de esquerda. Eu acho que é um homem que estuda economia com preocupações de como se dá a distribuição do produto da economia”.

Na biblioteca da UnB, há dois exemplares do livro Capital Accumulation and Income Distribution. Só um deles tem ficha de empréstimo anexada na última página. Desde 1986, apenas três estudantes pegaram emprestado o livro de Don Harris, que está na prateleira justamente dos livros de Karl Marx.

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