A falta de recursos para projetos de combate aos efeitos das mudanças climáticas é um dos maiores obstáculos para o cumprimento de metas de descarbonização das economias mundiais, estabelecidas no âmbito do Acordo de Paris.
Neste sentido, é uma notícia muito positiva o lançamento da Plataforma Brasil de Investimentos Climáticos e para a Transformação Ecológica (BIP), anunciada em conjunto pelo Ministério da Fazenda do Brasil, Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática, Ministério de Minas e Energia e Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, em parceria com a Bloomberg Philanthropies, a Aliança Financeira de Glasgow para o Net Zero (GFANZ) e o Fundo Verde para o Clima (GCF).
Gerida pelo BNDES, a Plataforma será um “ponto de conexão” entre investidores interessados em financiar projetos para reduzir emissões de gases de efeito estufa e é uma inovação importante produzida pela presidência brasileira do G20. “Será essencial para a implementação do Plano Clima, atraindo investimentos de outros países para acelerar e dar escala à descarbonização da economia”, destacou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, durante o lançamento.
A meta atual brasileira é reduzir suas emissões em 53% até 2030 e inclui ações de combate ao desmatamento, práticas agrícolas sustentáveis, descarbonização industrial, soluções baseadas na natureza (ou NBS, da sigla em inglês para nature based solutions), fontes diversificadas de energia renovável, transporte sustentável e bioeconomia.
Alguns projetos-piloto já foram identificados pela plataforma como potenciais receptores de recursos, num total de US$ 10,8 bilhões em investimentos potenciais. Entre eles está o Corredores para a Vida, liderado pela Ambipar Environment e pelo IPÊ, que busca US$ 95 milhões para restaurar 75.000 hectares de Mata Atlântica, no Estado de São Paulo. Esse é apenas o começo de uma indústria com enorme potencial de geração de renda, empregos e conservação da biodiversidade.
A urgência em mitigar os efeitos das mudanças climáticas e adaptar a infraestrutura e os sistemas produtivos às novas realidades climáticas exige investimentos maciços. No entanto, o financiamento para essas iniciativas tem sido insuficiente, e os mecanismos de captação de recursos enfrentam barreiras significativas.
O Banco Mundial estima que os países em desenvolvimento vão enfrentar uma perda econômica de cerca de 10% de seu PIB até 2050 devido a impactos relacionados às mudanças climáticas, caso medidas eficazes não sejam implementadas. E a revista “Nature” fez um levantamento estimando essas perdas em US$ 38 trilhões anuais até 2049, o equivalente a 19% da renda mundial ou nada menos que quase 20 vezes o PIB brasileiro de 2022.
Apesar do cenário preocupante, o financiamento disponível para projetos continua aquém do necessário. Um relatório de 2023 da Climate Policy Initiative destacou que o financiamento climático global atingiu cerca de US$ 632 bilhões em 2021. Embora seja um aumento em relação a anos anteriores, essa quantia está longe do necessário. A ONU estima que serão necessários entre US$ 4 trilhões a 6 trilhões por ano para alcançar as metas climáticas globais e assegurar uma transição justa para uma economia de baixo carbono até 2050.
Nesse aspecto, a criação da BIP é um passo importante para o Brasil, que, com seu vasto território e recursos naturais, pode liderar iniciativas climáticas na América Latina e no cenário internacional. No entanto, o sucesso da plataforma dependerá de sua capacidade de atrair investimentos de longo prazo e de garantir que os projetos propostos sejam implementados de maneira eficaz. A transparência na gestão dos fundos, bem como o monitoramento contínuo dos impactos socioambientais dos projetos financiados, serão cruciais para o sucesso da BIP.
Outro fator crítico será a capacidade da plataforma de atrair investidores internacionais. Com a crescente demanda por investimentos ESG (ambientais, sociais e de governança), a BIP pode se posicionar como um hub estratégico para investidores que buscam apoiar iniciativas de impacto positivo no clima. No entanto, o desafio será garantir que os projetos selecionados apresentem retornos financeiros viáveis, além dos benefícios ambientais e sociais.
O Brasil é uma verdadeira potência no que diz respeito às NBS, soluções baseadas na natureza, com inúmeros projetos de captura de carbono que se valem de práticas naturais, envolvendo plantio e reflorestamento de áreas desmatadas; agroflorestas, que integram em uma mesma área árvores e culturas agrícolas, promovendo a retenção de carbono no solo e aumentando a resiliência do ecossistema; e manejo florestal sustentável, que incentiva a regeneração das matas.
Tratam-se de mecanismos fundamentais para que a humanidade possa atingir as metas do Acordo de Paris e superar a crise climática. Até 2030, algo entre 35% e 50% das reduções de emissões deverão vir única e exclusivamente desse tipo de solução. Sob esta ótica, a nova BIP, que contempla essas iniciativas como potenciais receptoras de crédito, é uma ótima notícia, já preparando o caminho para as múltiplas reuniões que se darão em Baku, no Azerbaijão, em novembro, quando acontece a 29ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP-29.
* Rafael Tello, Vice-presidente de Sustentabilidade da Ambipar e Plínio Ribeiro, Head de Decarbon da Ambipar Environment