Carta ao Leitor: A riqueza das nações
Desafio da produtividade passa por investimento em educação, uma área em que — entra governo, sai governo — continuamos sendo reprovados
A frase do economista americano Milton Friedman (1912-2006), um dos mais inteligentes defensores da crença na liberdade individual e na livre-iniciativa, deveria soar como mantra e alerta: “A riqueza de uma nação não está nas riquezas do governo, mas na produtividade de seu povo”. É constatação fundamental em um momento decisivo da humanidade, em que as populações envelhecem de modo acelerado e as taxas de natalidade não param de cair. Segundo estudo do Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (IHME) da Universidade de Washington, até 2100, populações em 198 de 204 países do mundo devem encolher. No Brasil, a bem-vinda janela do bônus demográfico, que se abre quando o ritmo do crescimento da população em idade ativa supera o de crianças e idosos, deve se fechar por volta de 2035, cinco anos antes do esperado. Nenhum país conta para sempre com superávit de jovens, mas o problema brasileiro é que eles minguaram sem que a economia tenha se beneficiado como poderia — nó que VEJA tem acompanhado de perto, em sucessivas reportagens. Nação mais envelhecida, o Japão, por exemplo, escalou a um patamar de renda alto antes de acumular cabeças brancas. Por aqui, estamos envelhecendo antes de ficarmos ricos.
A fresta de oportunidades prestes a ser selada chama atenção por exigir cuidados — com as pessoas, e não apenas com as cifras, na trilha de Friedman. Convém sempre entender o que houve lá fora entre populações que já atingiram o novo momento. As lições são relevantes. Em boa parte do mundo desenvolvido, duas abordagens fundamentais para tentar reverter a curva não têm funcionado como se esperava: o incentivo financeiro e as políticas de promoção de igualdade entre homens e mulheres. O Japão investiu cerca de 22 bilhões de dólares em subsídios para partos e famílias, e nada — o número de bebês nascidos caiu pelo oitavo ano consecutivo. Na Espanha, a ampliação da licença-paternidade para dezesseis semanas — antes eram duas —, igualada à das mães, foi medida insuficiente.
Não se trata, é evidente, de sugerir que se retroceda ao tempo do descontrole, sinônimo de pobreza — no Brasil, nos anos 1960, a taxa de fecundidade era de 6,3 filhos por mulher (hoje está em 1,62) —, mas de zelar pelo equilíbrio entre os que ainda trabalham e produzem e os que precisam de cuidados. A solução mais rápida seria a imigração: buscar mão de obra em países em que ela é abundante. Infelizmente, estamos na contramão dessa possibilidade no momento. No século XX, o Brasil recebeu levas de imigrantes que vinham tentar a sorte num país continental e com muito por fazer. Hoje, é o contrário. Nossos jovens saem em busca de oportunidades em outros lugares. As outras respostas passam por prolongar o tempo das pessoas no mercado de trabalho e apostar em tecnologia (principalmente inteligência artificial e robótica), aumentando a produtividade de quem permanece empregado. Mas, para isso, é preciso haver investimento em educação, uma área em que — entra governo, sai governo — continuamos sendo reprovados.
Publicado em VEJA de 12 de abril de 2024, edição nº 2888