Criada EM 1997, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, a reeleição foi um marco no sistema eleitoral brasileiro, ao permitir que presidentes, governadores e prefeitos concorram a um segundo mandato consecutivo. Em teoria, a medida daria maior continuidade às políticas públicas implementadas pelo então ocupante do cargo. Ao longo dos anos, no entanto, tornou-se evidente a ineficiência desse sistema em razão da intensa busca dos eleitos pelo segundo mandato, desde o início de sua gestão. Vivemos em eterna campanha. Foi o que aconteceu com Jair Bolsonaro e, ao que tudo indica, está se repetindo hoje com o presidente Lula, em sua terceira passagem pelo Planalto. O ponto fraco da reeleição é que, na maioria das vezes, o anseio por ela leva a uma atenção excessiva à dinâmica eleitoral em prejuízo do cumprimento efetivo de promessas e do atendimento às necessidades da população.
Não raro, a atuação dos políticos que perseguem o segundo mandato resulta em uma gestão marcada por medidas populistas e superficiais, cujo único objetivo parece ser sua manutenção no poder. Como sabemos, isso pode levar a um ciclo vicioso de promessas vazias, ações demagógicas com alto custo para o Estado e negligência das demandas reais da sociedade. A busca desenfreada pela reeleição também pode enfraquecer a democracia, ao concentrar o poder em poucas mãos e limitar a renovação política. São tantos os indícios de que o dispositivo não funciona que o próprio FHC reconheceu o erro em artigo assinado no jornal O Estado de S. Paulo, em 2020. Na ocasião, ele escreveu: “Seria preferível termos um mandato de cinco anos e ponto-final”.
Diante desse cenário, é urgente a deflagração de um debate sério sobre o tema. A discussão reacendeu com força no Congresso Nacional. O senador Marcelo Castro, do MDB do Piauí, elaborou três propostas de emenda à Constituição para mudar o sistema atual. Segundo uma das sugestões, teríamos mandatos de cinco anos sem reeleição para presidente, governadores, prefeitos e deputados a partir de 2030. Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, é um dos principais apoiadores. Obviamente, mesmo não sendo afetado (as regras valeriam para os próximos pleitos), o presidente Lula já avisou que é contra.
Embora seja fundamental uma análise mais profunda de suas implicações, tal medida poderia estimular uma renovação de ideias e nomes no processo eleitoral brasileiro. Além disso, contribuiria para um maior comprometimento dos candidatos com sua agenda de governo, já que impossibilitados de ter um segundo mandato. O fim da reeleição, vale ressaltar, não significa acabar com a possibilidade de um político ser eleito no futuro, mas, sim, limitar sua permanência no poder em um mesmo cargo executivo. Isso poderia ainda promover maior responsabilidade e transparência na gestão pública, reduzindo os incentivos para práticas clientelistas e corruptas. Em última análise, a máquina estatal talvez ficasse mais profissional. Chegou a hora de o país discutir essa mudança.
Publicado em VEJA de 8 de março de 2024, edição nº 2883