A segurança pública é um dos grandes dramas do Brasil — e não apenas pelas lamentáveis 47 500 mortes violentas anotadas em 2022, ano com os dados completos já contabilizados (o levantamento de 2023 ainda não foi divulgado). O problema ganha relevo, e impõe decisões rápidas e vigorosas, dada a capilaridade das organizações criminosas. No Rio de Janeiro, as milícias dominam bairros inteiros em permanente jogo de chantagem. O autointitulado PCC saiu de São Paulo, onde brotou, para o Norte — e rege na marra as regiões de garimpo. Os bandidos, ao bel-prazer, controlam o tráfico de drogas e as penitenciárias de todo o país. Mandam e desmandam. No cotidiano, especialmente nas cidades grandes, os furtos de smartphones viraram norma. Não é aceitável que a sociedade viva à sombra do medo.
Diante desse cenário, a escolha do ministro da Justiça tem sido, já há alguns anos, uma decisão relevante para qualquer governo. O ministro Flávio Dino, a caminho do Supremo, dizia gastar 80% de seus dias com a segurança pública, parcela de tempo que mostra o tamanho do enrosco. Ao escolher Ricardo Lewandowski como o novo chefe da pasta, o presidente Lula pôs a seu lado um amigo de longa data — servidor que, durante o tempo no STF, se preocupou em achar saídas legais para os atropelos do petista nas denúncias da Lava-Jato e teve papel central na decisão pela soltura de Lula, depois de 580 dias de prisão em Curitiba, com a suspeição sobre a imparcialidade do juiz Sergio Moro e a anulação do processo porque a tramitação do caso ocorreu fora da jurisdição correta.
Há, porém, um imenso problema. Lewandowski tem comprovada experiência em assuntos do Judiciário e, claro, haverá de manter ótimo relacionamento com Lula. Contudo, parece inegável não ter desenvoltura com os nós da segurança, numa engrenagem que envolve a violência de armas em mãos, mais evidente, mas também a bandidagem eletrônica — e não por acaso o governo federal acaba de criminalizar o chamado cyberbullying. Os planos de Lewandowski na seara de proteção dos cidadãos ainda não estão claros, e nos primeiros dias ele foi lento demais na nomeação de profissionais que o ajudarão na empreitada. Por natural, o novo ministro pode vir a ter assessores que conheçam os intestinos do assunto — e, nesse aspecto, vale lamentar a saída do número 2 de Dino, Ricardo Cappelli.
Mas há sempre tempo de aprendizado, e Lewandowski, assim como sua equipe, pode vir a surpreender positivamente. É preciso, porém, ir com rapidez, porque a bandidagem já está instalada — e ao Ministério da Justiça cabe deixar um pouco de lado a ideologia, as disputas políticas, a toga e suas liturgias, e concentrar-se imediatamente nessa espinhosa — e urgente — missão. É o único modo de fazer retroceder o terror que anda pelas ruas. O zelo pela segurança pública é atalho para uma nação mais digna, um direito dos cidadãos que nela habitam e pagam impostos.
Publicado em VEJA de 19 de janeiro de 2024, edição nº 2876