
Foi um tempo glorioso, no início dos anos 1970, quando as lutas de boxe entre pesos-pesados eram tão indissociáveis da cultura dos Estados Unidos quanto a Guerra do Vietnã e o escândalo de Watergate. Muhammad Ali, Joe Frazier e George Foreman, numa combinação de cinco combates entre eles, tiravam o fôlego do país e do mundo, em transmissões pela TV de audiência recorde. Cada um deles tinha uma imagem atrelada à figura pública: Ali era o herói das causas civis e contra o racismo, uma espécie de Malcom X de luvas; Frazier, que ficou com o título, por Ali ter se recusado a servir no Exército, era o “Pai Tomás”, referência à Cabana do Pai Tomás, livro sobre o escravagismo, como se ele fosse subserviente aos brancos (não era); Foreman era o gigante invencível, uma colossal massa de músculos de 1,92 metro.
Não por acaso, em movimento atrelado a marketing inteligente, os duelos recebiam títulos superlativos. Ali contra Frazier, em 1971, foi “a luta do século”. Frazier e Foreman, em 1973, na Jamaica, foi “o confronto do sol”. E, então, houve o maior dos duelos, no Zaire — hoje República Democrática do Congo —, entre Ali e Foreman, em 1974, a “luta na floresta”, disputada na madrugada para atender às exigências das emissoras americanas. Foreman, aos 25 anos, era o campeão mundial, parecia improvável qualquer ser humano na face da Terra vencê-lo. Mas Ali, aos 32, tinha a genialidade a seu lado — e no oitavo assalto, depois de permitir que o adversário o encurralasse nas cordas, venceu por nocaute. “Foi o momento mais embaraçoso da minha vida”, diria Foreman. “Fui do orgulho à vergonha.” Sem o cinturão, ele abandonaria o esporte aos 28 anos. Em raro movimento no pugilismo, porque a história se repete como farsa, ele voltaria para retomar o cetro mundial, aos 45 anos, o mais velho da categoria.
Longe dos ringues, depois da aposentadoria, reinventaria uma nova vida, como empresário e garoto-propaganda de uma grelha portátil, a George Foreman Grill, e então se tornou mais popular do que nunca e riquíssimo. Sempre generoso, consciente do personagem que fora, de sorriso largo, elogiava a grandeza de seus rivais históricos entre quatro cordas, no tempo em que o boxe era ainda muito apreciado, se não a única maneira civilizada de liberar a violência inata do homem, com certeza a forma esportiva mais pura de atender ao instinto de domínio sobre o outro. Foreman morreu em 21 de março, aos 76 anos, em Houston. Frazier, em 2011, aos 67 anos. Ali, o maior de todos, em 2016, aos 74 anos.
Bom de ouvido

Político de celebrada capacidade de escuta e costura, Fuad Noman foi reeleito prefeito de Belo Horizonte, em 2024, com uma frente de coligações de esquerda para vencer Bruno Engler, do PL, em segundo turno. No início da trajetória como executivo de governo, ele foi secretário da Fazenda de Aécio Neves, do PSDB. A habilidade de trafegar entre grupos ideológicos distintos, sem jamais deixar de lado a capacidade técnica e a honestidade, o fez personagem querido.
Noman assumiu a gestão da cidade em 2022, depois que Alexandre Kalil, do Republicanos, renunciou ao cargo para concorrer ao governo do estado de Minas Gerais. Em tratamento contra um câncer linfático, um linfoma não Hodgkin, estava internado desde o dia 3 de janeiro. Teve insuficiência renal aguda e choque cardiogênico. Morreu em 26 de março, aos 77 anos.
Publicado em VEJA de 28 de março de 2025, edição nº 2937