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Disputa eleitoral de Curitiba é marcada por troca de farpas nos bastidores

A seis meses da votação, corrida tem pulverização dos votos e conflitos até dentro da mesma sigla

Por Laísa Dall'Agnol Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 3 jun 2024, 17h12 - Publicado em 21 mar 2024, 18h58

O eleitorado de Curitiba tem uma tradição recente de decidir rápido quem irá administrar a cidade. Desde 1992, quando passou a ter dois turnos nas eleições municipais, em quatro oportunidades o eleitor liquidou a disputa na primeira votação, inclusive na última, quando reelegeu Rafael Greca (PSD) com 60% dos votos. Na disputa deste ano, no entanto, pelo menos na largada, o cenário parece diferente: nada menos que cinco pré-candidatos estão empatados tecnicamente, segundo levantamento divulgado na quinta, 21, pelo Paraná Pesquisas. A esse congestionamento incomum no grid de largada soma-se ainda o clima para lá de quente — também inusual para Curitiba —que tomou conta dos bastidores dos principais partidos nos últimos dias, marcados por caneladas, não só entre adversários, mas até entre companheiros do mesmo partido.

A disputa se acirrou muito pelo fato de personagens relevantes terem mexido peças no tabuleiro. Uma das movimentações que provocaram mais barulho foi a não filiação do ex-governador Beto Richa, que decidira trocar o PSDB pelo PL de Jair Bolsonaro. Pega de surpresa, a cúpula do PSDB mandou avisar que não daria carta de anuência e que, se ele fizesse essa movimentação, perderia o mandato de deputado. No PL, a provável chegada gerou dedo na cara e gritaria. O ápice foi o vazamento de um vídeo — atribuído ao deputado estadual Ricardo Arruda (PL), pré-candidato à prefeitura e que agora corre risco de expulsão — que mostrava Richa saindo do encontro com Valdemar Costa Neto, chefe do PL, e Bolsonaro. Em meio ao barulho, Richa desistiu de mudar de legenda, mas segue pré-candidato. “Estava tentando construir um leque maior, com mais tempo de TV, estrutura, militância e vereadores do nosso lado. Foi quando vazaram o vídeo e azedou a situação”, diz o tucano que tentou bater asas, mas segue tucano.

ORDEM DE CIMA - Gleisi e Humberto Costa: o PT intervém no diretório local
ORDEM DE CIMA - Gleisi e Humberto Costa: o PT intervém no diretório local (Pedro França/Ag. Senado)

Em uma sinalização de que até as rusgas são democráticas em Curitiba, na mesma semana o clima esquentou pelos lados do petismo. Uma comissão nacional chefiada pelo senador Humberto Costa (PT-PE) decidiu intervir no diretório local para determinar que a decisão sobre a eleição local seja tomada pela Executiva Nacional. A ideia é sacramentar uma aliança com o ex-­prefeito Luciano Ducci (PSB), o que poderia resultar no apoio socialista a uma eventual candidatura de Gleisi Hoffmann, presidente da sigla, ao Senado caso Sergio Moro (União Brasil-­PR) seja cassado pela Justiça. A intervenção despertou a fúria de alguns petistas, como Zeca Dirceu (PT-PR), líder do partido na Câmara e pré-candidato à prefeitura. “Fiquei sabendo pela imprensa”, afirmou.

O personagem-chave da corrida, no entanto, não está na esfera de influência do bolsonarismo e muito menos do petismo. O governador Ratinho Jr. (PSD), cuja gestão é aprovada por 75% dos curitibanos, apoia o vice-­prefeito Eduardo Pimentel, que é do PSD, também sigla de Greca, que tem 73% de aprovação. Com esses padrinhos, ele aparece numericamente à frente na pesquisa. A candidatura dele pode atrair ainda o apoio do bolsonarismo, pois Paulo Martins, que pleiteia a vaga, tem cargo na gestão de Ratinho e ainda pode disputar a eventual vaga de Moro — ele ficou em segundo em 2022 e, caso o ex-juiz seja cassado, assume o posto até nova eleição.

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Outro embate curioso envolve os escombros da outrora poderosa “República de Curitiba”, epíteto que a cidade ganhou nos tempos da Lava-­Jato. Após perder o mandato de deputado por uma decisão do TSE, o ex-chefe da força-tarefa, Deltan Dallagnol, está no páreo curitibano graças à Justiça Eleitoral, mas do Paraná. Ao julgar uma ação do PT contra a inclusão de Dallagnol nas pesquisas, ela concluiu que ele não está inelegível. Se for candidato, vai enfrentar um dos caciques que a Lava-Jato mandou para as grades — Richa foi preso duas vezes pela operação e viu seu cacife entrar em declínio com a investigação.

arte curitiba

Com várias candidaturas do centro à direita — herdeiras do lavajatismo ou do bolsonarismo ou apoiada na popularidade de Ratinho e Greca, a esquerda acredita que pode até vencer, algo que não consegue desde 2012, com Gustavo Fruet (PDT) — o PT nunca governou Curitiba. “Quanto mais esse campo estiver dividido, mais chances a esquerda terá de levar uma candidatura ao segundo turno”, acredita Angelo Vanhoni, presidente do diretório municipal do PT.

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Palco dessa disputa, Curitiba ganhou projeção nas últimas décadas como um lugar de boas ideias urbanísticas, sociais e ambientais que ajudaram a melhorar a vida no local. Ela ostenta o quarto melhor IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) entre as capitais brasileiras e tem uma das mais baixas taxas de homicídios entre grandes metrópoles. Para decidir quem irá comandar a partir de 2025 uma cidade tão pacata e organizada, o clima nunca foi tão quente.

Publicado em VEJA de 22 de março de 2024, edição nº 2885

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