A companhia Novonor, que herdou a administração da construtora Odebrecht, respondeu nesta terça-feira, 26, à intimação feita pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli, após a decisão de anular provas obtidas no acordo de leniência com a empresa. Na manifestação, à qual VEJA teve acesso, a Odebrecht diz que não pretende se posicionar especificamente sobre o teor da decisão de Toffoli, mas entende que nenhuma das irregularidades debatidas nos autos pode ser atribuída à corporação. A empresa também defende que o acordo de leniência firmado se mantenha ativo, e argumenta que todas as cláusulas têm sido cumpridas integralmente, incluindo o pagamento das parcelas da multa bilionária, no valor de 3,8 bilhões de reais, em valores não corrigidos. O magistrado havia pedido o retorno da empresa há 15 dias.
Desde que a decisão de anular as provas foi tomada por Toffoli, a possibilidade de anulação do acordo em si tem sido ventilada. Até então, contudo, a colaboração firmada com a empresa segue ativa, e não houve nada que pudesse sacramentar, de fato, seu fim. A medida representou o mais recente baque da Lava-Jato, inclusive com críticas diretas à atuação de seus protagonistas, como o ex-procurador Deltan Dallagnol e o ex-juiz Sergio Moro, classificadas como “tortura psicológica” para “obter ‘provas’ contra inocentes”.
Na manifestação, a Odebrecht afirma que, “dentre outras obrigações, como a implementação de programa de monitoramento, o aperfeiçoamento das práticas de governança e dos programas de integridade da Companhia e pagamento de elevada quantia a título de multas e reparação de danos, a Odebrecht se comprometeu a colaborar de forma contínua com as autoridades”. E que o compromisso assumido “incluiu a entrega de uma série de elementos probatórios(…), o que cumpriu e se mantém cumprindo até a atualidade”.
A intenção da empresa, conforme o documento, é demonstrar que “evoluiu substancialmente nos últimos sete anos”, em termos de compliance, e defender a manutenção do acordo, que pretende cumprir de maneira integral. Se a colaboração for anulada, pode abrir margem para novas investidas contra a Odebrecht. O Tribunal de Contas da União (TCU), por exemplo, já sinalizou que pode desarquivar processos contra a empresa, encerrados após a assinatura do acordo. Internamente, a avaliação é de que a decisão de Toffoli aumentou a insegurança jurídica em torno da empresa.
“No entender da Companhia, a decisão da Peça nº. 1979 destes autos não determinou a continuidade de processos que estavam suspensos em razão do Acordo de Leniência, mas tão somente a imprestabilidade das provas provenientes da Suíça em razão da compreensão de que as autoridades não observaram os procedimentos adequados ao seu manejo. Nesse aspecto, importa ressaltar que o próprio Acordo de Leniência prevê, em sua Cláusula 9ª, que a perda dos benefícios ali acordados só ocorreria (i) em caso de descumprimento das obrigações previstas no Acordo ou (ii) se os Colaboradora e Aderentes desistirem unilateralmente, no todo ou em parte, do Acordo devidamente homologado”, argumenta a Odebrecht, no documento protocolado no processo.
Questionada por VEJA, a Novonor confirmou ter protocolado nesta terça-feira a manifestação em resposta à intimação proferida pelo ministro Dias Toffoli. E reforçou que “não guarda qualquer relação com os fatos que levaram à anulação das provas obtidas no bojo do acordo de leniência firmado com o Ministério Público Federal”.
“A empresa segue cumprindo com todas as obrigações previstas no acordo de leniência, o qual deve ser preservado em respeito à segurança jurídica. Por fim, a Novonor reforça seu compromisso com uma atuação ética, íntegra e transparente, materializado também por meio de sua nova governança empresarial e sistema de integridade, implementados e reconhecidos por um conjunto diverso de organismos no Brasil e no exterior”, diz o posicionamento da companhia.
CNJ investiga Moro
Na sexta-feira, o corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, determinou a instauração de reclamação disciplinar contra o ex-juiz Sérgio Moro, além dos desembargadores federais Loraci Flores de Lima, João Pedro Gebran Neto e Marcelo Malucelli, e a juíza federal Gabriela Hardt, todos do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4). A decisão veio após elementos obtidos em correição da Corregedoria Nacional de Justiça.
No relatório parcial da correição, foi encontrada “uma gestão caótica no controle de valores oriundos de acordos de colaboração e de leniência firmados com o Ministério Público Federal e homologados pelo juízo da 13.ª Vara Federal de Curitiba”, informa o Conselho Nacional de Justiça. Na reclamação disciplinar instaurada contra Sérgio Moro e Gabriela Hardt, a Corregedoria Nacional vai averiguar indícios de violação reiterada dos deveres de transparência, de prudência, de imparcialidade e de diligência do cargo em decisões que autorizaram o repasse de mais de R$ 2 bilhões à Petrobrás.
Hoje senador, Moro criticou a investigação. “Não sou mais juiz, tem que dizer isso. Deixei a toga que carreguei com muito orgulho, e tenho orgulho do que fiz na operação Lava Jato”, disse. Para interlocutores no Judiciário, no entanto, a mudança de função não pode tornar o congressista imune, e ele pode, sim, responder aos atos administrativos do passado como juiz, inclusive como alvo de uma ação por improbidade administrativa.