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Helena Taliberti sobre tragédia de Brumadinho: “Essa luta me mantém viva”

Ex-funcionária pública de 66 anos, ela perdeu 5 familiares há 5 anos após o rompimento da barragem – e hoje virou uma ativista que briga por justiça

Por Felipe Branco Cruz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 7 Maio 2024, 16h06 - Publicado em 26 jan 2024, 16h00

Jamais vou me esquecer daquela sexta-feira, 25 de janeiro de 2019. Foi naquele dia que perdi meus dois filhos, Camila e Luiz Taliberti, de 33 e 31 anos, minha nora, Fernanda Damian, de 30 anos, grávida de cinco meses do meu neto, o Lorenzo, meu ex-marido, Adriano da Silva, de 61 anos, e a esposa dele, Maria Lourdes Bueno, de 58 anos. Eles foram cinco das 272 pessoas que morreram quando a barragem da Mina de Córrego do Feijão, da Vale, se rompeu em Brumadinho, em Minas Gerais. Exatos cinco anos após a tragédia, o luto não terminou e só acho que acabará quando houver um desfecho para essa situação. É um luto coletivo, que é compartilhado com todos os parentes das outras vítimas e, pior, por algo que poderia ter sido evitado. 

Até o dia da tragédia a questão ambiental era uma preocupação, mas depois se tornou a principal pauta da nossa atuação. Eu trabalhava o dia inteiro como funcionária pública da prefeitura de São Paulo e achava que não tinha tempo para nada. Eu sempre dizia aos meus filhos para aproveitarem a juventude e fazer o que gostavam. Eles estavam naquela idade maravilhosa, perfeita para curtir a vida. Luiz morava havia cinco anos na Austrália, trabalhando em um escritório de arquitetura. Ele acabara de chegar ao Brasil de férias, com a esposa grávida. O Luiz fazia aniversário em dezembro e a Camila em janeiro, era um período de comemorações para nós. Eu também estava radiante em ser avó e fazendo mil planos para quando o Lorenzo nascesse. Camila era advogada de direito digital e atuava como voluntária em orientações jurídicas a mulheres que sofreram violência doméstica. Ela também era muito engajada nas questões de preservação do meio-ambiente. Foi por meio da Camila que meu ativismo foi despertado. Só sobramos, meu marido e eu, aqui, é porque deve existir algum motivo, já que a família inteira se foi.

Seis meses após o desastre ambiental, os amigos da Camila e do Luiz criaram o instituto que leva o nome dos meus filhos, com o objetivo de não deixar a tragédia cair no esquecimento, cobrar justiça e também para atuar em defesa de mulheres vítimas de violência doméstica e pela preservação do meio ambiente. Em 2019, me aposentei e hoje me dedico integralmente, junto com o meu marido, ao instituto. É essa luta que me mantém viva. Mas não é uma luta fácil. Outras tragédias ambientais com minerações continuam ocorrendo. Como a de Herculano, em 2014, e a de Mariana, em 2015, ambas em Minas Gerais, e, agora, em Maceió. Em meio a esse furacão, me descuidei da saúde. Em 2020, senti uma dor muito forte no intestino que achei ser diverticulite, porém, descobri estar com leucemia, que continuo tratando até hoje, tomando um remédio fortíssimo. É por isso que costumo dizer que a tragédia só começou naquele dia 25 de janeiro, porque para as vítimas, trata-se de uma tragédia diária. Como é possível acordar todo dia de manhã sabendo que ninguém mais da sua descendência está vivo?

Eu não terei mais filhos, eu não terei mais neto, mas o instituto ficará. Desde então, no aniversário da tragédia, realizamos um ato por memória e justiça na Avenida Paulista. Neste ano, não foi diferente. Pelo quinto ano consecutivo, em parceria com a Avabrum (Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego Feijão Brumadinho), uma sirene soou no exato horário da tragédia, às 12h28, com discursos em homenagem às vítimas, cujos responsáveis ainda seguem impunes. Também inauguramos a exposição Paisagens Mineradas, no espaço Matilha Cultural, em São Paulo, composta por trabalhos de dez artistas visuais mulheres que tratam do tema mineração e seus impactos na sociedade e meio ambiente. Também relançamos o manifesto Basta de Impunidade – Justiça por Brumadinho, que já recolheu mais de 40 000 assinaturas. Sempre digo que eles tentaram nos enterrar, mas não sabiam que éramos sementes.

Helena Taliberti em depoimento dado a Felipe Branco Cruz

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