Mino Carta, um criador de revistas
Fez parte fundamental da história da imprensa brasileira antes do surgimento da internet. Morreu em 2 de setembro, aos 91 anos

O jornalista Demetrio Giuliano Gianni Carta, o Mino Carta, nascido em Gênova, na Itália, tinha já uma carreira de sucesso quando foi convidado pelo fundador da Editora Abril, Victor Civita, a ser o diretor de redação de uma revista semanal de informações que seria lançada em setembro de 1968. Carta comandaria VEJA desde o número inaugural até 1976. Antes, pilotara Quatro Rodas, no início dos anos 1960, com uma particularidade: nunca soube dirigir e tampouco gostava de automóveis. Convidado a criar um caderno de esportes para o Estadão, esteve na gênese do Jornal da Tarde. De lá saiu para o nascimento de VEJA.
De inteligência rara, rigoroso e de personalidade forte, foi sempre corajoso no combate aos desmandos da ditadura militar — em especial na lida contra a censura a que foi submetida VEJA. De humor afiado e aguda ironia, foi dele a ideia de cutucar as autoridades que vigiavam o jornalismo profissional, tentando calá-lo. Carta idealizou subterfúgios para marcar posição, que virariam marca mesmo após sua saída. Depois de uma reportagem sobre o Chile, que atravessava o tempo de Augusto Pinochet, foram publicadas cartas em uma coluna sob o título “Circunstâncias”. Assinadas por profissionais da equipe, despontavam obviedades e lugares-comuns, com o propósito de chamar a atenção dos leitores. Um exemplo, ou dois: “Sr. Diretor: Como leitor assíduo de sua prestigiosa revista, sinto-me compelido a observar que o Chile tem uma população composta de homens, mulheres e crianças, dado omitido na reportagem do número 286”; “Sr. Diretor: A respeito da reportagem ‘O longo drama chileno’, gostaria de observar o seguinte: o Chile é um país comprido”.
Carta criou um estilo de chefia que seria depois reproduzido por muitos outros profissionais de imprensa no país, e que ele mesmo levaria para as revistas IstoÉ, Carta Capital e Jornal da República, criações de sua lavra. De Carlos Maranhão, no livro Roberto Civita — O Dono da Banca: “Elegante, irônico, mordaz, de gênio explosivo, tinha grande cultura e texto tão inconfundível como o corte de seus paletós de tweed com reforço de couro nos cotovelos. Adorava a culinária e os vinhos italianos, para ele indiscutivelmente superiores aos franceses. Conhecedor de história da arte, pintava quadros figurativos. Em 1957, realizara em Milão sua primeira exposição individual. Além de jornalista de reconhecida competência, considerava-se um bom designer de revistas”. Fez parte fundamental da história da imprensa brasileira antes do surgimento da internet. Morreu em 2 de setembro, aos 91 anos.
Publicado em VEJA de 5 de setembro de 2025, edição nº 2960