O ex-âncora de programa popular da TV que virou favorito em Belo Horizonte
Mauro Tramonte acena ao eleitor de centro e ganha apoio de políticos rivais na eleição municipal
Dez anos depois de estrear como apresentador do Balanço Geral, programa de forte apelo entre as camadas mais populares, o jornalista Mauro Tramonte (Republicanos) elegeu-se como o deputado estadual mais votado de Minas Gerais em 2018. Seis anos e uma reeleição depois, o capital político consolidado por aparições diárias na TV — da qual se afastou em junho deste ano — continua dando frutos. Mesmo com apenas cinquenta segundos no horário eleitoral e sem apoio de Lula ou de Jair Bolsonaro, que polarizam a cena política nacional, o apresentador está na liderança da disputa pela prefeitura de Belo Horizonte, terceiro maior colégio eleitoral do país, com 30% das intenções de voto, segundo pesquisa Quaest (veja o quadro). Com isso, virou o adversário a ser perseguido em uma corrida que estava absolutamente embaralhada até a sua entrada no páreo, em maio.
Tramonte chegou à liderança com um perfil construído longe da radicalização. Embora tenha se beneficiado da onda de renovação de 2018, quando se apresentou como um outsider e foi eleito deputado com 516 000 votos, o jornalista se autodefine como um político de centro. Seu afastamento da polarização nacional é apontado por ele mesmo como o motivo da queda expressiva na votação em 2022, quando foi reeleito com 110 000 votos. Neste ano, pretende se manter longe das discussões que envolvem lulistas e bolsonaristas, mesmo porque os dois grupos têm candidatos próprios na capital mineira: o deputado federal Rogério Correia (PT) e o deputado estadual Bruno Engler (PL). Tramonte, por outro lado, conseguiu atrair para seu palanque dois nomes de peso no estado: o governador Romeu Zema e o ex-prefeito da cidade Alexandre Kalil.
Embora tenha construído seu capital político narrando crimes, episódios excêntricos da vida cotidiana ou histórias variadas de apelo popular, a plataforma de Tramonte para a prefeitura se escora em sua vida política. Como cartão de visita, mostra projetos que apresentou como deputado, como o de tombamento da Serra do Curral, além da destinação de emendas para escolas, hospitais e defesa civil. Ele evita temas ligados aos costumes, que mobilizam o eleitorado mais à direita. Questionado sobre aborto, por exemplo, diz apenas que vai “cumprir a lei”. A aposta é na guinada do eleitor belo-horizontino para a centro-direita nos últimos anos, depois de eleger cinco prefeitos de centro-esquerda, do PSDB ao PT. “Desde 2016, com Kalil, o eleitor pendeu para o lado conservador, e isso se reflete na lista de candidatos, com quatro da centro-direita e dois da centro-esquerda”, avalia Carlos Ranulfo, cientista político e professor da UFMG. Segundo Tramonte, o tempo à frente do programa foi importante para se tornar conhecido, mas não será suficiente para garantir o triunfo. “A imagem ajuda, mas as pessoas não querem saber só do apresentador de TV, por isso estamos gastando sola de sapato pela cidade”, afirma.
A estratégia dos adversários se apoia em duas frentes. Uma é jogar luz exatamente sobre sua carreira como deputado, que eles consideram pífia. Outra é apostar no peso de Lula e Bolsonaro. Dono do maior tempo de TV, Bruno Engler (PL) usa à exaustão a imagem de Bolsonaro, que foi a Belo Horizonte apoiá-lo em um ato de rua. Rogério Correia (PT) se sustenta em Lula, que gravou vídeos para o candidato. “Ele vai apanhar dos eleitores do Lula pela ligação com Zema, e dos eleitores de Bolsonaro por causa do apoio do Kalil”, aposta Correia.
O uso da TV para entrar na política não é um fenômeno raro no Brasil. Nomes como Clodovil, Wagner Montes, Jorge Kajuru, Celso Russomanno e Roberto Jefferson são alguns exemplos de condutores de programas populares que foram sucesso nas urnas. Nos últimos anos, até pela concorrência com as celebridades da internet, isso tem se tornado mais difícil. Um exemplo é José Luiz Datena, ex-âncora de programas como Cidade Alerta (Record) e Brasil Urgente (Band), que patina na disputa em São Paulo, em especial depois da ascensão de um fenômeno gerado nas redes sociais, o coach Pablo Marçal (PRTB). Alavancado pela TV, o desafio de Tramonte é manter seu ibope em alta em meio ao pelotão de concorrentes que pretendem desafiá-lo até o horário nobre da eleição: o dia da votação.
Publicado em VEJA de 6 de setembro de 2024, edição nº 2909