Black Friday: Assine a partir de 1,49/semana

O teste de fogo de trazer de volta o auxílio sem implodir ajuste fiscal

O Executivo e parlamentares chegam a acordo para votar a prorrogação do benefício, desde que atrelada a medidas de contenção do gasto público

Por Thiago Bronzatto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 13h34 - Publicado em 19 fev 2021, 06h00

Desde a posse de Jair Bolsonaro, as condições nunca foram tão favoráveis à agenda liberal e aos projetos de modernização do Estado. Vacilante na primeira metade de seu mandato, o presidente voltou a defender essas bandeiras e conseguiu eleger aliados para as cúpulas das duas Casas do Congresso. Além disso, o deputado Arthur Lira (Progressistas-AL) e o senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) — os novos comandantes da Câmara e do Senado — dedicaram o início de suas gestões a reuniões com o ministro Paulo Guedes, com o objetivo de destravar pontos da pauta econômica. Essa sintonia fina já rendeu um fruto: a aprovação da autonomia do Banco Central. O primeiro grande teste dessa nova aliança, no entanto, ocorrerá nos próximos dias, quando o governo e os chefes do Legislativo tentarão convencer os parlamentares a chancelar um acordo que prevê a retomada do pagamento do auxílio emergencial desde que atrelada a medidas de contenção do gasto público. A ideia é mostrar responsabilidade social, por meio da renovação do benefício que garantiu a sobrevivência dos mais pobres durante a pandemia de Covid-19, e também um forte compromisso com o equilíbrio das contas públicas. Ou seja: fazer um agrado à política, e outro à área econômica.

PACTO - Parlamentares: eles se comprometeram a aprovar o projeto que vai manter o equilíbrio das contas -
PACTO - Parlamentares: eles se comprometeram a aprovar o projeto que vai manter o equilíbrio das contas – (Michel Jesus/Câmara dos Deputados)

O plano costurado por Guedes com Lira e Pacheco prevê a inclusão de uma cláusula de calamidade pública na proposta de emenda constitucional (PEC) do pacto federativo, considerada pelo ministro o mais importante dos projetos em tramitação. Essa cláusula funcionaria como uma espécie de botão de emergência e permitiria gastos extraordinários, como o próprio auxílio emergencial, em situações excepcionais — por exemplo, crises sanitárias e guerras. No roteiro dos sonhos de Guedes, o benefício só começará a ser pago depois da promulgação da PEC, mas, como Bolsonaro anunciou a intenção de retomá-­lo já em março, há a possibilidade de o desembolso sair antes da votação do pacto federativo. Isso poderá ser feito com a liberação de um crédito extraordinário por meio de medida provisória. Essa alternativa não agrada ao ministro porque representaria o aumento imediato do endividamento público, ficando a compensação em cortes de gastos pendente de aprovação. Ou seja: o agrado à política, certo e cristalino, sairia antes do agrado à equipe econômica, incerto e no aguardo de uma futura votação. “O desafio é transformar uma recuperação cíclica, baseada em consumo, porque auxílio emergencial é consumo, numa retomada do crescimento sustentável, com base em investimentos”, disse Guedes a VEJA. “Por isso, temos de ter um novo marco fiscal, se não o investimento não vem. O novo marco fiscal é o seguinte: ataque o problema da saúde sem comprometer as futuras gerações”, acrescentou. A PEC do pacto federativo tramita no Senado desde 2019 e prevê a descentralização dos recursos da União para estados e municípios e a flexibilização de gastos mínimos em educação e saúde. Hoje, os municípios, por exemplo, são obrigados a destinar 15% da receita corrente líquida para a saúde e 25% para a educação. A ideia é manter a destinação total de 40% da receita corrente líquida, mas deixando a cargo do prefeito a decisão de quanto gastar em cada uma das duas áreas. A proposta de flexibilização partiu dos próprios governantes municipais e estaduais, com os quais o governo conta para convencer deputados e senadores a votarem a favor do novo pacto federativo. “É fundamental uma cláusula de calamidade pública na PEC do pacto federativo para que haja auxílio no Brasil”, declarou Rodrigo Pacheco.

PROMESSA - Guedes e os líderes do Congresso: “Se estabelecermos um novo marco fiscal, o Brasil será outro” -
PROMESSA - Guedes e os líderes do Congresso: “Se estabelecermos um novo marco fiscal, o Brasil será outro” – (Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

A maior preocupação de Guedes é impedir que despesas e ajudas oficiais extraordinárias se tornem permanentes. Evitar isso, segundo o ministro, seria demonstrar compromisso com as gerações futuras. “Durante a pandemia, demos 140 bilhões de reais a estados e municípios, com repasses de recursos, rolagem de dívida, transferência para fundos. O que exigimos em troca? Que esse dinheiro não poderia virar aumento de salário para funcionários públicos nos próximos dois anos”, relembrou Guedes. “Assim, as despesas transitórias com a saúde não se tornaram permanentes e economizamos 140 bilhões de reais. Essa é a mentalidade da proteção das futuras gerações. O novo marco fiscal, portanto, será um monumento à boa política”, acrescentou. Ainda não está definido o novo modelo do auxílio emergencial, que beneficiou 69 milhões de pessoas no ano passado, a um custo de 330 bilhões de reais. Pelo acordo selado entre o governo e a cúpula do Congresso, o valor pago às famílias carentes ficará entre 250 reais e 300 reais, por um prazo de quatro meses. Após esse período, entraria em vigor o novo programa de transferência de renda, um Bolsa-Família turbinado, que se tornaria viável apenas com o avanço das reformas estruturantes. Só com a reforma administrativa, o Ministério da Economia espera economizar cerca de 300 bilhões de reais em dez anos.

Continua após a publicidade

Quando o auxílio emergencial foi extinto, em dezembro passado, Bolsonaro disse que não pretendia prorrogá-lo, sob a alegação de que não havia recursos para tanto e de que a pandemia estava no “finalzinho”. A perda de popularidade recente — provocada pelo fim do benefício e o agravamento da crise sanitária — e a pressão dos políticos levaram o presidente a mudar de entendimento. Em um almoço na residência oficial do Senado, no último dia 12, o anfitrião Rodrigo Pacheco e os convivas Guedes e Arthur Lira se debruçaram sobre as alternativas que permitiriam a volta do auxílio. À mesa, eles concordaram que o gasto extraordinário deveria ser compensado com um ambicioso pacote de cortes de despesas, como forma de evitar o aumento da dívida pública. No encontro, foi manifestada ainda a preocupação com um suposto repique inflacionário que poderia ocorrer com a volta do pagamento do benefício. Para evitá-lo, decidiu-se que o novo auxílio terá valor menor e beneficiará menos gente. A tendência é que o número de assistidos caia para algo entre 30 milhões e 40 milhões de pessoas.

VAI VOLTAR - Auxílio emergencial: acordo prevê a distribuição do benefício para até 40 milhões de pessoas carentes -
VAI VOLTAR – Auxílio emergencial: acordo prevê a distribuição do benefício para até 40 milhões de pessoas carentes – (L. Adolfo/Futura Press)

No almoço, Guedes mostrou que ainda não entende bem os sinalizadores da política. Entusiasmado com as perspectivas de entendimento com o Congresso, ele declarou que 2022 seria o ano da retomada vigorosa da economia do país. Foi imediatamente advertido pelos parlamentares. Eles deixaram claro que o esforço tem de ser feito para destravar a economia o mais rápido possível, para plantar em 2021 e colher em 2022, sob pena de as urnas mandarem para casa os governistas. “Deixa eu te falar do calendário político, Guedes: para a classe política, ou este ano bomba, ou ano que vem está todo mundo morto. O que tiver de acontecer tem de ser este ano. Se for plantar no ano que vem, morreu de fome. Entendeu?”, ponderou Lira. Guedes ainda foi orientado a incluir gordura em suas propostas em tramitação no Congresso, a fim de ter margem para negociação. Recebeu o conselho de dividir seus textos em partes azuis, aquelas que devem ser defendidas a ferro e fogo, e partes vermelhas, das quais o governo desistirá para fingir que fez concessões durante as tratativas com os parlamentares. A sugestão parece uma obviedade, mas se tornou necessária diante de um precedente.

Continua após a publicidade

Na reforma da Previdência, em 2019, o governo planejava economizar 1,2 trilhão de reais em dez anos. Durante a tramitação, várias concessões foram feitas, chegando ao ponto de o ministro ameaçar pedir demissão se o Congresso votasse um projeto que resultasse em economia menor que 800 bilhões de reais. O texto aprovado, por pouco, não ficou abaixo disso. Nessa nova fase, o governo precisará negociar muito para destravar sua agenda, que é tão necessária quanto ambiciosa. Dela também fazem parte a reforma tributária, a privatização da Eletrobras e uma série de projetos destinados a incentivar o investimento privado no país. “Os próximos dias serão decisivos. Se não aprovarmos o novo marco fiscal, os juros vão para a lua. Se os juros subirem, os investimentos não virão e não teremos criação de empregos e renda. Vamos continuar com desemprego em massa e estagnação econômica. Vai virar uma bola de neve. Mas, se estabelecermos um novo marco fiscal, o Brasil será outro, com mais investimentos”, disse Guedes. Será, de fato, o grande teste de fogo para a gestão Bolsonaro.

Publicado em VEJA de 24 de fevereiro de 2021, edição nº 2726

Publicidade

Imagem do bloco
Continua após publicidade

4 Colunas 2 Conteúdo para assinantes

Continua após publicidade

Vejinhas Conteúdo para assinantes

Continua após publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

BLACK
FRIDAY

MELHOR
OFERTA

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de 5,99/mês*

ou
BLACK
FRIDAY
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba 4 Revistas no mês e tenha toda semana uma nova edição na sua casa (menos de R$10 por revista)

a partir de 39,96/mês

ou

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.