Em entrevista a VEJA, o presidente dos Correios, general Floriano Peixoto, se diz um soldado do presidente Bolsonaro. Ele assumiu o cargo com a missão de acelerar o processo de privatização da empresa, gigante com quase 100 000 funcionários, que movimenta 18 bilhões de reais e acumula prejuízo igualmente extraordinário, fruto de uma combinação que inviabiliza a maioria das estatais brasileiras: má gestão, excesso de privilégios e corrupção.
Qual a missão que o senhor recebeu do presidente? Nossa equipe chegou há um ano. O presidente da República nos atribuiu a missão de fortalecer a empresa financeiramente e garantir a sua sustentabilidade operacional. Houve uma retração financeira muito grande em decorrência da pandemia, mas os problemas não são exclusivos dela. Atualmente, nós contabilizamos um prejuízo de 2,4 bilhões de reais. É um prejuízo que acumulamos ao longo do tempo por má governança da empresa.
Esses privilégios dos funcionários são exemplo disso? Eu diria que privilégio é uma palavra forte. Mas eles têm benefícios extra-CLT, e a gente entende que são bastante diferenciados dentro da realidade brasileira. O que tem de ficar claro é a diferença entre direitos e benefícios. A gente, evidentemente, está assegurando os direitos previstos por lei. Alguns benefícios estão sendo cortados porque a empresa não tem capacidade financeira nem condição de sustentar perante a sociedade a preservação deles em um momento tão difícil, de tantos sacrifícios.
Os funcionários ameaçam entrar em greve caso a direção insista em cortar os benefícios. Há empresas que estão demitindo, reduzindo os salários. Os Correios não pensam nessas medidas por enquanto e esperam que o bom senso da categoria nos permita manter essa postura.
O governo havia incluído os Correios na lista das primeiras estatais a ser privatizadas. Quando isso vai acontecer? Prefiro usar o termo desestatização. Quando falamos em privatização, já se infere que é isso que ocorrerá ao final, e a gente não pode assegurar essa possibilidade hoje. Durante o processo, pode-se concluir por outras alternativas. Os estudos são demorados, profundos e detalhados. Não estamos falando de vender um botequim na esquina, estamos falando de vender uma empresa enorme, e o processo vai ser um case internacional. Portanto, há de ser feito com muito critério, estudo e consistência. E é um estudo de elevada complexidade, porque tem implicações inclusive de continuidade dos serviços e dos compromissos que a empresa tem em âmbito internacional. Os Correios estão se modernizando, melhorando a governança e racionalizando as despesas para a melhor opção que venha a ser decidida no futuro.
O senhor é a favor da privatização dos Correios? O efeito que se espera é que haja uma melhoria de investimentos e que o regramento que se aplica a uma empresa privada traga benefícios. Não vou dizer que são amarras, mas recaem sobre as empresas públicas protocolos que dificultam e retardam determinados processos. Quando a gente compara empresa pública com privada, as diferenças são óbvias em termos de facilidade de estabelecer negócios e contratação. A proposta é tornar o Estado mais leve, mais moderno e permitir que ele se volte para setores em que a sua presença se faça mais necessária, como saúde, educação e segurança.
Os Correios, historicamente, foram alvo de ingerência política. Isso ainda acontece? Não identifico isso. O presidente da República, quando me designou para a missão, me atribuiu uma total isenção para conduzir a empresa da forma que eu julgasse necessário. Eu não tenho sofrido esse tipo de ação.
Publicado em VEJA de 29 de julho de 2020, edição nº 2697