Na quarta-feira 28 de novembro, os executivos do Carrefour estavam empolgados. Preparavam-se para anunciar a investidores um crescimento consistente em 2018: 40,5 bilhões de reais de receita de janeiro a setembro, 6,5% a mais do que no ano passado. O lucro líquido ajustado avançou 40%, para 1,12 bilhão de reais, o que motivou a empresa a planejar investimentos de 2 bilhões de reais em 2019. De repente, o vento virou. Pelas redes sociais, chegou a informação de que um segurança do hipermercado em Osasco matou, com uma barra de alumínio, um cachorro que circulava na frente do prédio. Mas foi na sexta 30 que a história viralizou. Surgiu o vídeo do crime, rapidamente republicado por celebridades como Tatá Werneck e influenciadores digitais ligados à proteção dos animais como Luisa Mell. Todos pedindo boicote ao Carrefour, em uma onda de indignação contra a marca. A resposta à revolta digital veio em tom analógico: no sábado 1º, por meio de uma nota impessoal, o Carrefour explicava que o segurança era terceirizado e, portanto, não fazia parte do quadro de funcionários, e que o cão Manchinha, o vira-lata charmoso, falecera por consequência da maneira como o Centro de Controle de Zoonoses lidara com o bicho. A revolta cresceu, e o Carrefour soltou mais duas notas. Na última, finalmente, reconheceu sua responsabilidade e prometeu construir uma nova política para a proteção e defesa dos animais.
O caso ilustra um fenômeno cada vez mais comum: a mobilização virtual. Em pouquíssimo tempo, uma multidão se manifesta nas redes sociais para atacar marcas ou pessoas que, no entendimento da massa, tenham cometido pecados imperdoáveis. Gigantes como o Carrefour, com mais de 600 pontos de venda no país, estão particularmente sujeitos a essa situação. Neste caso, o próprio Carrefour admite que foi lento na resposta ao público. “Não podíamos falar sem saber o que tinha acontecido. Faltou agilidade”, reconhece Stéphane Engelhard, vice-presidente no Brasil. Para compensar a falha, o próprio Stéphane entrou em contato com Luisa Mell e Tatá Werneck e pediu sugestões de como reparar o erro. A ideia agora é bancar a castração de cães abandonados em Osasco e doar ração a abrigos. É o que o consultor de gestão de crise Mario Rosa chama de “reação penitencial”. “A empresa precisa se preocupar com o público, mas também com seus funcionários, acionistas e com sua missão: vender alimentos. A turba quer que a companhia acabe, mas para a sociedade isso seria um desastre”, diz. O fato é que, no mundo de hoje, empresas sadias podem quebrar por não entender a dimensão de casos assim.
Publicado em VEJA de 19 de dezembro de 2018, edição nº 2613