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Sempre ao lado do poder, Baleia Rossi é incógnita na estreia na oposição

Na luta pelo Congresso, ele enfrenta o candidato governista com o apoio da esquerda

Por João Pedroso de Campos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 14h37 - Publicado em 8 jan 2021, 06h00

O deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP) está na política desde os 20 anos, quando se tornou vereador de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, em 1992. Na sua trajetória, sempre teve atuação discreta, mas foi subindo degraus na carreira parlamentar e chegou a Brasília, onde está no segundo mandato. No caminho, galgou cargos na estrutura partidária até se tornar, em outubro passado, o presidente nacional da sigla após a derrocada de velhos caciques da legenda. Nos últimos dias, deu um salto político ainda maior ao arregimentar o apoio de dez partidos, além do MDB, incluindo boa parte da esquerda, e se tornar o candidato da oposição à presidência da Câmara contra Arthur Lira (PP-AL), apoiado por Jair Bolsonaro.

Apesar da polarização que representam, os dois rivais são muito semelhantes: filhos de políticos, foram vereadores e deputados estaduais até se elegerem com 40 e poucos anos à Câmara. Discretos e conciliadores, aliaram-se aos governos Dilma Rousseff e Michel Temer e viraram líderes de siglas importantes. Apoiaram Bolsonaro em 2019 e 2020, sobretudo na economia, mas, enquanto Lira assumiu o figurino de candidato do governo, Baleia (apelido irônico que ganhou na adolescência, por ser magro e branco, e incorporou ao nome) viabilizou a candidatura junto ao grupo do presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-­RJ), desafeto de Bolsonaro.

O terreno da oposição, no entanto, não é nada natural para Baleia, que fez carreira sempre ao lado do poder, seja de esquerda, seja de direita. O seu currículo inclui apoio a Antonio Palocci entre 2001 e 2002, quando Baleia era vereador de Ribeirão Preto e o petista comandava a cidade, e uma relação tranquila com os governos do PSDB quando foi deputado estadual (de 2003 a 2015). Por ironia, o seu mais conhecido lampejo de opositor foi efêmero ao aderir ao rompimento do MDB com Dilma e engrossar o coro do impeachment. Após a queda da presidente, apoiou Temer, seu padrinho político. Na gestão Bolsonaro, Baleia voltou ao seu hábitat: segundo a consultoria Arko Advice, ele se mostrou até aqui mais alinhado ao Palácio do Planalto do que Arthur Lira: votou com o governo em 90,24% das propostas em 2019 e 77,82% em 2020, enquanto o rival apoiou, respectivamente, 86,29% e 70,59% dos projetos.

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PADRINHOS - Temer e Maia: fundamentais na ascensão política do emedebista – (Jorge William/Agência O Globo)
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Esse comportamento foi um dos motivos que dificultaram as articulações junto à oposição. “Baleia não seria o nome mais querido das oposições, mas acabou sendo o possível”, diz o presidente do PDT, Carlos Lupi. No PT, passou por um placar apertado: 27 votos a 23. Siglas ainda em dúvida se vão ou não aderir a ele fazem críticas públicas ao candidato. “Temos diferenças profundas, não confiamos nele, seria um voto de oposição, contra Lira”, diz Sâmia Bomfim, líder do PSOL, partido que ainda não decidiu quem apoiar. Outra semelhança com seu opositor é um passado um tanto enrolado (com menos fios soltos que Lira, diga-se). Baleia foi investigado no escândalo da “máfia da merenda” em São Paulo, mas o caso acabou sendo arquivado em 2018 por falta de provas. Ele ainda é alvo de um inquérito que apura se a Odebrecht lhe pagou caixa dois em 2014 por meio da produtora de seu irmão, Paulo Luciano Tenuto, o Palu, a Ilha Produções.

Habilidoso no trato com os políticos, Baleia se tornou um cacique nacional do MDB, que abrigou lideranças históricas como Tancredo Neves e Ulysses Guimarães. Um de seus orgulhos, por sinal, é uma foto com Ulysses tirada em 1992, ano da morte dele, que ilustra o seu perfil no WhatsApp. O deputado e seu pai — Wagner Rossi, ministro da Agricultura dos ex-presidentes Lula e Dilma — foram e são, sobretudo, aliados de Michel Temer, que apoiou a ascensão de Baleia ao comando da sigla. Foi também sob o guarda-chuva de Temer que Wagner Rossi assumiu a Codesp, responsável pelo Porto de Santos, área de influência do ex-­presidente. O pai de Baleia foi preso em 2018 na Operação Skala, que apurava corrupção no setor portuário. Rossi passou três dias detido. Em 2014, aliás, Temer repassou à campanha de Baleia um cheque de 150 000 reais doados pela JBS, cuja delação à Lava-Jato quase levou o ex-presidente à lona anos depois. Daqui por diante, porém, Temer diz que guardará mais distância do afilhado em meio à disputa na Câmara. “Baleia se tornou candidato do Rodrigo Maia, contra Bolsonaro. Michel não quer se envolver por ter boa relação com o presidente”, diz um amigo do ex-presidente.

Embora tenha dado um grande salto político, há um mar revolto no horizonte de Baleia — com o perdão do trocadilho. Em campanha firme junto aos parlamentares e com a força das nomeações federais por trás, Lira não será um adversário fácil. Além disso, a oposição só foi conquistada após a assinatura de um documento que inclui desde a defesa da democracia até a facilitação de instrumentos que podem complicar o governo Bolsonaro, incluindo a análise de pedidos de impeachment. O acordo foi fechado, mas as desconfianças continuam. A presidência do MDB e a liderança do partido na Câmara aproximaram Baleia de ministros como Luiz Eduardo Ramos. Diante da adesão do PT e de outras siglas a ele, o Planalto suspendeu as tratativas sobre cargos, que ajudam Lira, e mantém diálogo com o emedebista. Assim, enquanto faz juras de fidelidade à esquerda, Baleia ainda pisca de vez em quando para a situação — um desses casos que só existem na excêntrica fauna política brasileira.

Publicado em VEJA de 13 de janeiro de 2021, edição nº 2720

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