Em um interrogatório extenso, três testemunhas de acusação arroladas pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública foram ouvidas nesta terça-feira em júri popular que acontece no Fórum de Osasco. Durante o depoimento, elas falaram que uma testemunha chave, apelidada de “testemunha Beta”, apontou a participação do policial militar Victor Cristilder Silva dos Santos nas chacinas de Osasco e de Barueri ocorridas em agosto de 2015.
O policial Cristilder, como é mais conhecido, é acusado de ter trocado mensagens de celular com um guarda municipal para combinar sobre os horários da chacina. Além disso, ele teria dirigido um dos carros utilizados e efetuado disparos contra as vítimas. Ele é acusado por oito mortes e também por tentativa de homicídio.
No primeiro julgamento do caso, os sete jurados decidiram condenar os PMs Fabrício Emmanuel Eleutério e Thiago Barbosa Henklain, além do guarda-civil Sérgio Manhanhã. Fabrício Eleutério foi condenado a 255 anos, 7 meses e 10 dias de prisão e Thiago Henklain recebeu sentença de 247 anos, 7 meses e 10 dias. O guarda-civil Sérgio Manhanhã foi condenado a 100 anos e 10 meses.
Os dois policiais foram acusados de ter disparado contra as vítimas e respondiam por todas as mortes e tentativas de assassinato. Já o guarda-civil, segundo a acusação, teria atuado para desviar as viaturas dos locais onde os crimes ocorreriam e foi denunciado por 11 mortes. Eles responderam pelos crimes de formação de quadrilha e homicídio qualificado por motivo torpe, praticado por grupo de extermínio.
As mortes, segundo a acusação do Ministério Público, teriam ocorrido como forma de vingança pela morte de um PM e de um guarda-civil naquele mesmo mês. Segundo a acusação, os acusados se reuniram e decidiram fazer uma chacina “sem se preocupar com o fato de que as pessoas a serem eventualmente atingidas fossem completamente alheias aos motivos determinantes do crime”.
Depoimentos
O primeiro a falar foi o delegado Andreas Schiffmann, que iniciou as investigações sobre a chacina em Barueri. Em seu depoimento, falou que a investigação contra Cristilder teve como base o depoimento da “testemunha Beta”, que foi arrolada no júri popular, mas que, assim como outras duas testemunhas, não foi localizada e não será ouvida nesta oportunidade. No total, 20 pessoas serão ouvidas como testemunhas de defesa e de acusação nesta primeira etapa do júri, previsto inicialmente para terminar na próxima sexta-feira.
A “testemunha Beta” é um sobrevivente de uma chacina ocorrida dias antes em Carapicuíba, apontada como a “pré-chacina de Osasco”, no dia 8 de agosto. Ela estava com o amigo Michel em uma rua da cidade quando foi abordada por Cristilder, que disparou e matou Michel. Dias depois, essa testemunha reconheceu o carro utilizado por Cristilder na chacina de Carapicuíba como sendo o mesmo que foi utilizado na chacina de Osasco e de Barueri, no dia 13 de agosto de 2015.
Em depoimento durante a investigação, a testemunha apontou Boy, apelido de Cristilder, como um dos participantes dos crimes. A defesa de Cristilder, no entanto, tenta desacreditar o depoimento afirmando que Boy é também o apelido de outro policial, Rodrigo Rodrigues, parecido fisicamente com Cristilder e ressaltando que a “testemunha Beta”mentiu diversas vezes em depoimento, apontando carros e endereços que não seriam dele. Contudo, em seu depoimento, o corregedor Rodrigo Elias da Silva disse que a ”testemunha Beta” reconheceu Cristilder como sendo o verdadeiro Boy, quando os dois suspeitos foram colocados para reconhecimento.
No depoimento desta terça-feira, o delegado disse que logo suspeitou da participação de policiais na chacina porque, nas imagens de câmeras de segurança que registraram alguns dos flagrantes da chacina, os criminosos apresentavam comportamento típico de policial, aprendido em curso. “Eles só colocaram o dedo no gatilho na hora de atirar”, ressaltou o delegado, lembrando que isso é aprendido em um curso policial. Schiffmann disse, ainda, que acredita na culpa de Cristilder porque, durante a apreensão do celular do réu, a investigação encontrou mensagens trocadas entre ele e Sérgio Manhanhã, que foi condenado no julgamento anterior por participação nas mortes.
O terceiro a falar foi o delegado José Mario de Lara, do Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP). Segundo ele, a investigação no DHPP teve início quando o delegado Schiffmann apresentou ao departamento a “testemunha Beta”. Ele disse que houve também uma outra testemunha que teria visto dois carros da tropa de elite da Guarda Civil de Barueri passando pelo local de um dos crimes, momentos antes de passar um Sandero prata de onde teriam partido os tiros que mataram pessoas em frente a um bar. Isso indicaria, segundo a investigação, a parceria entre agentes da Guarda Civil de Barueri e de policiais militares na chacina.
Lara também disse que a “testemunha Beta”, em certa ocasião, quando participou de uma sessão de reconhecimento do criminoso, não confirmou Cristilder como tendo participado da chacina, mas que depois lhe informou que fez isso porque sofreu ameaça no dia anterior e teve medo de reconhecer o policial. Ele também disse que é “muito mais difícil e complexo” investigar crimes praticados por policiais, porque eles conhecem técnicas para dificultar a investigação.
Antes do início do julgamento, o promotor Marcelo de Oliveira comentou sobre o aparecimento de uma carta da “testemunha Gama”, que foi importante para a condenação de um dos policiais no julgamento anterior. Na carta, que só apareceu após o primeiro julgamento que condenou o policial, a testemunha volta atrás e diz que foi coagida pelo promotor a dar seu testemunho contra o policial. ”Aquela carta é a prova cabal de que a testemunha falou a verdade para mim e que, depois do resultado do julgamento, julgou ter de fazer algo para tentar reverter a condenação de 200 anos”, opinou.
(Com Agência Brasil)