A Polícia Civil de Goiás deve se basear em um único caso de abuso sexual para concluir o primeiro inquérito contra o médium João Teixeira de Faria, o João de Deus. A investigação está prevista para ser concluída até sexta-feira, 21, e vai mostrar que o líder religioso ofereceu presentes, como uma pedra de valor e um quadro religioso, para a vítima depois de tentar abusar da mulher, de aproximadamente 40 anos.
Inicialmente, a investigação tinha um rol de quinze casos, mas apenas um deles aconteceu recentemente e não perdeu seu prazo decadencial – período no qual a denúncia pode ser feita sem perder a punibilidade. Segundo a investigação, essa vítima teria sido abusada em outubro deste ano.
A mulher visitou a Casa Dom Inácio de Loyola, onde João de Deus fazia atendimentos espirituais, várias vezes e sempre acompanhada de um namorado. Em uma dessas ocasiões, ela ficou sozinha com o médium numa sala para a consulta espiritual. Com as luzes apagadas, João de Deus teria começado a tocar próximo à região íntima da denunciante que, neste momento, percebeu que ele estaria com o membro sexual para fora da roupa.
Aos policiais, a vítima contou que, quando percebeu qual era a verdadeira tentativa do médium, resistiu e fez menção de interromper qualquer contato físico. Nesse momento, João de Deus teria oferecido uma pedra de valor e um quadro religioso para a vítima. A reportagem apurou que, em seu depoimento à Polícia Civil, João de Deus disse não se lembrar de ter dado esta pedra, mas admitiu a oferta de “quadros”.
Os policiais envolvidas na investigação ainda resistem em dizer se o inquérito vai concluir que, efetivamente, João de Deus tentou silenciar a vítima com a oferta de presentes. Um delegado envolvido nos trabalhos disse que “provavelmente” essa será uma das provas a embasar a denúncia.
Apesar disso, como se trata apenas de um caso, a Polícia Civil de Goiás deve oferecer a denúncia de João de Deus por um único crime: o de “praticar ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima”, tipificação presente no artigo 215 do Código Penal. A pena prevista para esse crime é de até seis anos de reclusão, em regime fechado.
Ainda assim, a Polícia Civil e o Ministério Público de Goiás podem abrir novos inquéritos contra o médium a partir de novas denúncias. Somente o MP já recebeu mais de 500 relatos de abuso sexual e outros trinta casos foram formalizados por meio de depoimentos colhidos presencialmente nos Estados.
‘Remédio’ antes vendido deixa de ser cobrado
A prisão preventiva de João de Deus trouxe um impacto não apenas para o movimento da Casa Dom Inácio de Loyola, onde o médium costumava fazer os atendimentos, mas também em procedimentos do local. Cápsulas “energizadas”, antes vendidas a um preço de 100 reais, passaram agora a ser distribuídas gratuitamente. Funcionários do centro afirmaram que a mudança foi determinada pelo próprio médium, que costumeiramente indicava o remédio manipulado para mais de dois terços dos frequentadores.
A passiflora é preparada num laboratório que funciona na própria Casa Dom Inácio de Loyola. Na terça-feira, 18, o centro foi alvo de buscas pela Polícia Civil. De acordo com funcionários, as cápsulas são iguais para todos. O que muda seria a “energia” dispensada em cada frasco. Na ação de busca em imóveis de João de Deus, a polícia apreendeu armas e dinheiro vivo.
Para os fiéis, a energia do remédio é personalizada. O tratamento dura cerca de dois meses. Ao serem perguntados por que as cápsulas são vendidas a esse preço, funcionários afirmam haver custos para manutenção da fábrica – registrada no nome da mulher de João de Deus, Ana Keila Teixeira. Além disso, argumentam que as coisas são menos valorizadas quando são doadas.
A estimativa é que sejam vendidos mensalmente cerca de 8.000 frascos de remédio no centro. Isso significa que, somente com as cápsulas, a casa teria um faturamento bruto de 800.000 reais. Sem falar na pomada para dores, para queimaduras e o xarope. A ordem de gratuidade é apenas para a passiflora. De acordo com funcionários, ainda não se sabe se o remédio será dado de forma gratuita para todos. Embora sem custo, as filas para a retirada das cápsulas não foi grande.