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Como os melhores fósseis do mundo sobreviveram ao tempo

Fósseis da “Pompéia Chinesa” devem menos as atividades vulcânicas catastróficas e mais a mágica serena da natureza, diz estudo

Por Marília Monitchele Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 6 nov 2024, 17h13

Voltemos no tempo, há mais de 120 milhões de anos. No que hoje é o nordeste da China, florestas temperadas e lagos abrigava um ecossistema vibrante que servia como o lar de uma diversidade de dinossauros e outras criaturas pré-históricas. Por milhões de anos, vestígios desse passado permaneceram ocultos, até que, nos anos 1980, moradores locais começaram a encontrar fósseis surpreendentemente bem preservados. Essas descobertas rapidamente atraíram a atenção, e os vultosos cheques, de colecionadores de todo o mundo. O lucrativo mercado de fósseis deu início a uma verdadeira “corrida do ouro” paleontológica, resultando em escavações tão extensas que eram vistas do espaço — possivelmente as maiores escavações já realizadas no planeta.

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Nos anos 1990, estudos realizados na formação Yixian, área das escavações, revelaram fósseis em um estado de preservação impressionante. Dali emergiram dinossauros, aves, mamíferos, insetos e tartarugas, muitos com órgãos internos, penas, pelos, tecidos moles e até restos de conteúdo estomacal. Entre as descobertas, destaca-se o registro dramático de um confronto mortal entre um mamífero e um dinossauro, preservados em plena ação, como uma fotografia congelada no tempo. Diversas espécies de dinossauros emplumados, encontradas na região, permitiram aos pesquisadores observar detalhes inéditos, como a cor das penas e o formato das asas. Essas descobertas foram cruciais para confirmar a ligação evolutiva entre os dinossauros e as aves modernas, expandindo o conhecimento sobre a aparência e a evolução desses animais pré-históricos.

Por que os fósseis de Yixian são tão bem preservados?

Por muito tempo, a hipótese dominante para a preservação dos fósseis de Yixian era a de que esses animais haviam sido sepultados por cinzas vulcânicas, em evento comparável à erupção do Monte Vesúvio que soterrou Pompéia em 79 d.C. Por esse motivo, a região foi apelidada de “Pompéia Chinesa”. 

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No entanto, uma nova pesquisa publicada na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (Pnas) refuta essa teoria. Nela, uma equipe internacional de cientistas liderada pelo Observatório Terrestre Lamont-Doherty, da Universidade de Columbia, utilizando técnicas avançadas de datação, concluiu que esses fósseis foram preservados não por uma erupção, mas por eventos cotidianos, como o desmoronamento de tocas e o acúmulo de sedimentos em períodos chuvosos que gradualmente cobriram as carcaças, mantendo-as em ambientes livres de oxigênio. “Estas são provavelmente as descobertas de dinossauros mais importantes dos últimos 120 anos”, disse em nota o coautor do estudo, Paul Olsen. 

A equipe analisou grãos de zircão dos fósseis e das rochas onde foram encontrados para identificar sua idade exata. Ao contrário da ideia de múltiplas erupções, a nova análise indicou uma rápida acumulação de sedimentos intensificada por períodos chuvosos.

 

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Representação artística de um dinossauro Psittacosaurus com filhotes sendo caçados por Repenomamus, um mamífero. Um conjunto fóssil da Formação Yixian preservou os restos dessas espécies em combate mortal, congelados em meio à ação. O dinossauro aqui é mostrado com proto-penas eriçadas em sua cauda — (Alex Boersma/Reprodução)
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Os fósseis da Formação Yixian costumam ser encontrado em duas variedades: esqueletos 3D intactos e perfeitamente articulados e carcaças achatadas, mas altamente detalhadas.Os pesquisadores acreditam que a primeira variedade seria resultado de desmoronamentos de tocas em terra firme, enquanto os fósseis achatados teriam sido preservados pela lenta deposição de sedimentos em lagos.

O fim da hipótese da “Pompéia Chinesa”

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Os pesquisadores descartam vulcanismo em vários apontamentos. Alguns estudos anteriores sugeriram que criaturas foram envoltas por lahars, lamas de movimento rápido, semelhantes a concreto, que fluem de vulcões após erupções. Mas os lahars são extremamente violentos, disse Olsen, e aptos a despedaçar qualquer coisa viva ou morta que encontrem, então essa explicação não funciona.

Outros disseram que fluxos piroclásticos — ondas rápidas de cinzas escaldantes e gases venenosos à la Monte Vesúvio — foram os responsáveis. Eles abateram moradores de Pompéia e então envolveram os corpos em camadas protetoras de material que os preservaram como estavam no momento da morte. Mesmo quando os restos mortais se decompuseram, permaneceram vazios nas cinzas, dos quais os investigadores fizeram moldes de gesso realistas. Os restos mortais são caracteristicamente curvados nas chamadas posições pugilísticas, torturantemente dobrados e com os membros severamente esticados, enquanto o sangue fervia e os corpos se amassavam no calor explosivo. Vítimas de incêndios modernos exibem poses semelhantes.

Embora existam de fato camadas de cinzas vulcânicas, lava e intrusões de magma na Formação Yixian, os restos ali não correspondem aos dos infelizes Pompeianos. Por um lado, penas, pelos e tudo o mais quase certamente teriam sido queimados em um fluxo piroclástico. Por outro, os dinossauros e outros animais não estão em posições pugilísticas; em vez disso, muitos são encontrados com braços e caudas confortavelmente dobrados em volta de seus corpos, como se estivessem dormindo.

Assim, a jornada para entender o passado da vida na Terra continua, revelando como fenômenos aparentemente comuns — chuvas, sedimentos e a quietude dos lagos — podem preservar a memória de criaturas que habitaram o planeta em tempos remotos. A história da “Pompéia Chinesa” é, na verdade, uma história sobre como a natureza faz sua mágica silenciosa, sem necessidade de eventos dramáticos ou grandes catástrofes.

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