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De buracos negros à singularidade: o legado de Hawking na ciência

Em seus estudos, o físico buscava integrar conhecimentos da mecânica quântica aos da relatividade geral – em uma tentativa de se aproximar da teoria de tudo

Por Leticia Fuentes Atualizado em 14 mar 2018, 18h20 - Publicado em 14 mar 2018, 18h15
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  • Diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica (ELA) aos 21 anos, o físico britânico Stephen Hawking morreu na madrugada desta quarta-feira em sua casa, em Cambridge, no Reino Unido. Além de ter ocupado o posto de professor lucasiano da Universidade de Cambridge – título que já foi ostentado por Isaac Newton, Charles Babbage e Paul Dirac – o cientista ficou conhecido por suas brilhantes teorias que revolucionaram a cosmologia moderna, como os teoremas da singularidade e a radiação emitida por buracos negros.

    Em seus trabalhos, Hawking buscava integrar conhecimentos da mecânica quântica à teoria da relatividade geral, proposta por Albert Einstein. “A mecânica quântica estuda a dinâmica de sistemas muito pequenos, menores do que átomos, enquanto a relatividade trata de sistemas muito grandes, como planetas e galáxias”, explica Roberto Costa, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (USP). A tentativa de unificar todos esses conhecimentos em uma única explicação foi batizada de Teoria de Tudo – o elusivo “manual” que explicaria toda a origem e evolução do Universo e que a ciência ainda busca.

    Buracos negros

    A principal contribuição dos cálculos de Hawking está em sua teoria sobre buracos negros. Durante muitos anos, os cientistas imaginaram que os buracos negros não emitiam nenhum tipo de radiação – eram completamente “escuros” do ponto de vista matemático (daí a origem do nome). Mas, conforme Hawking foi se aprofundando no tema, começou a desconfiar dessa afirmação.

    Ele conseguiu demonstrar, matematicamente, que os buracos negros podem emitir, sim, um tipo de radiação térmica – que foi batizada de radiação Hawking. Ela seria responsável por fazer esses corpos celestes perderem massa. E como os buracos negros têm massa finita, esse fenômeno pode fazer com que eles “evaporem” quando chegam ao ponto em que perdem mais matéria do que conseguem absorver.

    “A existência da radiação Hawking demonstra uma solução quântica para um problema que é relativístico”, diz Costa. “Isso nunca foi comprovado diretamente, são apenas demonstrações por meio de cálculos. Ainda assim, grande parte dos cientistas aceita essa teoria.”

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    Costa opina que, atualmente, não temos a tecnologia necessária para fazer esse tipo de comprovação científica – porém, dentro de algumas décadas, pode ser que sim. “As ondas gravitacionais, por exemplo, foram previstas por Einstein há cem anos e só puderam ser confirmadas agora, em 2016. Pode ser que o mesmo aconteça com a radiação Hawking.”

    “Se esse efeito fosse comprovado, ele ganharia um Nobel”, afirma Costa. De fato, Stephen Hawking sabia da importância de sua teoria e chegou a brincar com o fato de nunca ter ganhado o prêmio durante uma entrevista. Ele disse que só não havia recebido um Nobel ainda porque era uma descoberta muito difícil de confirmar, uma vez que buracos negros absorvem a luz que chega até eles e, por isso, não são visíveis a partir de telescópios e outros equipamentos.

    Singularidade

    Outra importante contribuição de Hawking para a ciência foram os teoremas da singularidade, que o físico desenvolveu junto ao matemático britânico Roger Penrose. Esse conjunto de teorias utiliza equações da relatividade aplicadas à evolução do Universo.

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    Apesar de ser uma ideia extremamente complexa, a singularidade pode ser resumida como um ponto de tamanho zero em que as variáveis físicas estão tão concentradas que se tornam infinitas.

    Essa ideia foi prevista inicialmente por Penrose enquanto ele estudava o colapso de estrelas. Segundo seus cálculos, toda a matéria de um astro em colapso fica presa dentro de sua superfície por causa da força de sua própria gravidade. Assim, conforme a estrela colapsa, sua superfície encolhe até o tamanho zero.

    No livro Stephen Hawking: As aventuras de uma vida (Benvirá, 459 páginas, 49,90 reais), a escritora americana Kitty Ferguson – que ajudou o físico britânico a escrever uma de suas obras –, afirma que ele pensou em aplicar esse mesmo raciocínio desenvolvido por Penrose para a evolução do Universo.

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    “Hawking percebeu que, se invertesse a direção do tempo para que o colapso se tornasse uma expansão, toda a teoria de Penrose continuaria válida”, escreve a autora. Grosso modo, ele pensou que, se o Universo está em expansão, como previu o físico russo Alexander Friedman (e posteriormente confirmou o telescópio Hubble), ele deve ter começado de um único ponto – de uma singularidade.

    Essa teoria também foi formulada com base em cálculos matemáticos e, por isso, não teve comprovação direta. “A relatividade geral prevê a existência de singularidades, mas no início dos anos 1960 poucos levaram a sério essa previsão”, escreve Ferguson, esclarecendo que a matemática sempre enfrentou dificuldades de lidar com números infinitamente grandes e equações que não têm solução.

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