O Prêmio Nobel de Química de 2024 foi concedido nesta quarta-feira a três figuras de destaque internacional no estudo da bioquímica: David Baker, da Universidade de Washington, Demis Hassabis e John Michael Jumper, da Google DeepMind.
Seus trabalhos revolucionários na utilização da Inteligência Artificial para a predição de estruturas de proteínas abriu uma nova era para a biologia molecular, permitindo avanços antes impensáveis em áreas como a medicina e o desenvolvimento de novos medicamentos.
Mas o que é essa predição de estruturas de proteínas e por que ela é tão importante? Como a IA funciona nesse contexto e como isso pode transformar a ciência e a saúde?
As proteínas são as “máquinas” que existem dentro das células, desempenhando papéis fundamentais em praticamente todos os processos biológicos. Suas funções estão intimamente ligadas à forma como elas se dobram em estruturas tridimensionais específicas. Entender a forma exata de uma proteína é muito importante para compreender seu funcionamento, desenvolver medicamentos, e projetar tratamentos personalizados para doenças complexas.
No entanto, determinar essas estruturas é um desafio gigantesco. Tradicionalmente, essa tarefa é realizada por técnicas laboratoriais como cristalografia de raios-X e ressonância magnética nuclear, que são técnicas muito demoradas e caras. É aqui que a inteligência artificial, impulsionada pelos avanços de Baker, Hassabis e Jumper, muda o jogo completamente.
A capacidade de prever rapidamente como uma proteína se dobrará a partir de sua sequência de aminoácidos tem implicações enormes. Em vez de levar um tempo enorme para descobrir a estrutura de uma proteína, como acontecia anteriormente, os sistemas de IA podem realizar essa tarefa em dias ou até horas. Esse ganho de tempo é muito importante para áreas como a pesquisa de medicamentos, onde a identificação rápida de proteínas-alvo pode acelerar a descoberta de novas terapias.
Além disso, a IA oferece uma precisão surpreendente na predição, muitas vezes competindo com métodos experimentais tradicionais. Ao combinar aprendizado profundo com grandes volumes de dados proteicos, as redes neurais treinadas por esses cientistas conseguem capturar padrões complexos que determinam como uma proteína se dobrará, algo que seria quase impossível de identificar manualmente.
O trabalho de David Baker, Demis Hassabis e John Jumper no desenvolvimento do AlphaFold, uma IA revolucionária, é o exemplo perfeito de como esses sistemas funcionam. O AlphaFold é alimentado com dados sobre proteínas conhecidas, e a partir disso, consegue prever a estrutura de proteínas desconhecidas com alta precisão.
Isso é possível graças ao uso de redes neurais profundas, que aprendem a partir das estruturas de proteínas já conhecidas para gerar previsões baseadas em novas sequências de aminoácidos.
Eles também utilizaram princípios semelhantes para projetar proteínas artificiais com formas e funções específicas, algo que tem imenso potencial em diversas áreas da biotecnologia.
Essas IA são treinadas com bilhões de combinações possíveis, aprendendo a identificar quais dobramentos são mais prováveis com base nas interações entre os aminoácidos. Esse processo de aprendizado contínuo permite que os sistemas se tornem cada vez mais precisos, refinando suas previsões conforme mais dados são introduzidos.
A predição de estruturas de proteínas com IA tem aplicações extraordinárias em várias áreas. Na medicina, por exemplo, ela pode ser usada para criar medicamentos mais eficazes e com menos efeitos colaterais, já que a precisão das previsões ajuda os cientistas a entender melhor como os compostos interagem com proteínas específicas no corpo humano.
Outra área promissora é a biotecnologia, onde proteínas artificiais projetadas com IA podem ser usadas para criar novos materiais, como bioplásticos ou enzimas que decompõem resíduos plásticos. Além disso, a IA na predição de proteínas pode ajudar a resolver problemas globais, como a resistência a antibióticos, fornecendo insights sobre novas formas de combater infecções.
*André Silva Pimentel, Cientista do Nosso Estado da FAPERJ e professor associado do Departamento de Química do Centro Técnico Científico, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)