O maior animal que caminhou na Terra pode estar enterrado na Patagônia
Há uma escavação ainda em andamento que talvez tenha deparado com os restos de um titanossauro da subordem saurópode
Há milhões de anos, a Patagônia, região do extremo sul do continente americano que cobre parte da Argentina e do Chile, era santuário de répteis chamados hoje titanossauros — denominação pertinente a animais de proporções titânicas como os seres ancestrais da mitologia grega. Descobertas recentes no campo da paleontologia têm ajudado a fixar a imagem daqueles herbívoros do tamanho de arranha-céus, que parecem saídos dos filmes de Steven Spielberg, caminhando morosamente sobre uma vegetação que costumava ser menos fria do que é agora. Encontrado na Província de Neuquén, na parte argentina da Patagônia, um novo conjunto de fósseis deve trazer à luz mais um espécime dessa fauna pré-histórica. Os responsáveis pela descoberta sugerem que os petrificados ossos podem ter pertencido ao maior de todos os animais terrestres conhecidos, superando até mesmo o atual recordista, que nossos vizinhos batizaram, em evidente autodeferência, de argentinossauro.
Publicado no periódico científico Cretaceous Research, o estudo do conteúdo parcialmente desenterrado mostra que o paleontólogo argentino Alejandro Otero e sua equipe podem ter deparado com os restos de um titanossauro da subordem saurópode: herbívoros com pescoço e cauda compridos e cabeça pequena. Os fósseis foram descobertos em 2012, em um acidente geográfico chamado Formação Candeleros, criado a partir de sedimentos da inundação de um rio durante o período Cretáceo Superior, cerca de 98 milhões de anos atrás.
O trabalho, assinado por Otero e mais cinco especialistas, analisa o que se encontrou até agora no local: as primeiras 24 vértebras da cauda, parte da cintura pélvica e a escápula esquerda do animal. Com essas evidências, os pesquisadores conseguiram ter uma ideia da magnitude deste que pode ter sido o maior entre os maiores na planície que deveria ser chamada de Terra de Gigantes. Há ocorrências de titanossauros saurópodes em outras partes do mundo, como Estados Unidos, Europa e Ásia, mas especialistas acreditam que o Cone Sul tinha o clima ameno e a vegetação abundante que favoreciam a multiplicação da espécie. Na análise, estima-se que o dinossauro ainda sem nome deve ser de 10% a 20% maior que seus parentes mais próximos: superior ao patagotitã (um dinossauro de outra província da Patagônia) e talvez grande o bastante para desbancar o exemplar de argentinossauro descoberto em 1987 e escavado em 1989 (com 40 metros de comprimento e 110 toneladas).
Ainda há muito do dinossauro sob o terreno, que deve ser revisitado em breve para que os paleontólogos possam desenterrar todas as partes do esqueleto petrificado. Especialista nesse tipo de animal, Max Langer, paleontólogo da Universidade de São Paulo, explica que só assim será possível compará-lo melhor com outros espécimes e determinar se ele é apenas um argentinossauro maior ou um exemplar de uma nova espécie.
Ossos como o fêmur e o úmero, fundamentais para as medições, não foram encontrados na primeira etapa da escavação. “É a partir do fêmur, por exemplo, que calculamos peso e altura, além de estabelecer a idade aproximada”, explica Rodrigo Santucci, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Paleontologia. Temendo visitas de curiosos, os argentinos não informaram a localização do fóssil. Ao que parece, a verdade completa ainda demorará para ser desenterrada.
Publicado em VEJA de 17 de fevereiro de 2021, edição nº 2725