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100 Loucos Anos

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Um século da aventura olímpica parisiense

Episódio 7: E Coco Chanel inventou o breaking

A mais celebrada das estilistas desenhou os figurinos de um balé que reinventou a cenografia e fez mexer os corpos que hoje dançam na Place de La Concorde

Por Fábio Altman Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 7 ago 2024, 06h58 - Publicado em 7 ago 2024, 06h50

Este blog segue com a ideia original, a de buscar uma história de 100 anos atrás, do tempo da Olimpíada de 1924, e costurá-la com um evento ou uma prova de agora. A cada postagem uma piscadela para ontem e outra para hoje. 


Um acontecimento de 1924…

Naquela sexta-feira, 20 de junho de 1924, a cidade parou para ver – ou então para comentar, no caso de quem ficou do lado de fora – a estreia no Théâtre des Champs-Élysées do balé Le Train Bleu. Era mais uma das provocações da companhia itinerante Les Ballets Russes, do russo Serge Diaghilev. A ideia era sempre transgredir, transpor para o palco, para a dança, a ruptura que as pinceladas cubistas levavam às telas. A música era de Darius Milhaud, com libreto de Jean Cocteau, e protagonismo de Bronislava Nijinska, a irmã menos famosa do mais notável bailarino daquele tempo. A cortina – sim, a cortina – de cena havia sido pintada por Pablo Picasso dois anos antes, Deux Femmes Courant Sur la Plage. 

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O desenho de Picasso que serviu de cortina de cena: gènios para Le Train Bleu (//Divulgação)

E então, quando o pano subia, despontavam as cores quentes de uma praia na Riviera Francesa, em cenografia que ainda hoje soaria moderna. O trem azul que dava nome ao espetáculo era a locomotiva que, nos anos 1920, ligava Calais e Paris às praias ensolaradas do sul da França. Coisa chique, luxuosa, de gente fina e influente. Ninguém mais se espantava ao encontrar, a bordo, passageiros como Cole Porter e Winston Churchill. O enredo da apresentação era quase banal: os flertes, as dores e os amores em um balneário. O vaivém ensolarado e atlético do banho de mar, das partidas de golfe e tênis. Mas como vestir o corpo de baile, de modo que soasse adequado, tanto para quem estava na plateia quanto para quem se exibiria ao lado de Nijinska? A solução: Coco Chanel, a estilista de 41 anos, celebrada pelo pretinho básico que oferecia na butique da Rue Cambon e pelo Chanel nº 5, que um dia, lá na frente, vestiria Marilyn Monroe na cama. Os figurinos desenhados por Chanel para Le Train Bleu, tal qual Picasso na pintura, Hemingway na literatura, representaram uma faísca inaugural, um sopro de novidade, um passo sem volta. 

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Le Train Bleu, performed by Serge Diaghilev's Ballets Russes, June 1924, 1924. Private Collection. Creator: Unknown photographer. (Photo by Fine Art Images/Heritage Images via Getty Images)
O balé, aqui em preto e branco: cores e cortes nunca vistos até então no teatro (Fine Art Images/Getty Images)

Inspirada na campeã de tênis Suzanne Lenglen, que hoje dá nome a uma das quadras de Roland Garros, ela criou um conjunto completo em branco associado à raquete e bandeau para a franja. Para a personagem do jogador de golfe, costurou um suéter inspirado no príncipe de Gales. O restante do elenco usava maiôs de banho feitos de malha listrada sobrepostos por pulôveres até a altura da coxa. Como acessórios de banho, imaginou toucas de natação. Tudo muito leve, quase banal aos olhos do século XXI, mas um passeio na vida há 100 anos conta uma outra história. Eis o que escreveu o mandachuva da trupe, Diaghilev, no texto de apresentação de Le Train Bleu: “A poesia das máquinas, do arranha-céu, do transatlântico já é conhecida. Aceite agora a poesia de rua, leve a sério suas melodias banais. Não tenha medo da banalidade, dê toda sua atenção a essa música emergente que será a de amanhã. Os Ballets Russes, a vanguarda artística do mundo, não podem ficar parados, vivendo a vida de ontem, nem mesmo a de hoje. Eles devem prever o amanhã, guiar as multidões e descobrir o que ninguém descobriu ainda”.

 

… e um de agora

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O amanhã é hoje. Basta sair do Théâtre des Champs-Élysées, subir a Avenue Montaigne, pegar à direita o Champs-Élysées e voilà – estamos na Place de La Concorde. O mítico endereço, que recebe as provas de basquete 3 x 3, ciclismo BMX e skate, será palco do torneio de breaking, nos estertores da Olimpíada. Não seria inadequado imaginar que a revolução deflagrada pelos Ballets Russes – “aceite agora a poesia de rua” – tenha agora chegado ao ritmo e aos uniformes das B-Girls e dos B-Boys. Há quem faça muxoxo, incomodado com a presença da modalidade na Olimpíada. Mas façamos um teste: o que conversa mais com os humores do mundo, hoje? A luta greco-romana ou o breaking? O estilo de dança urbana nasceu nos Estados Unidos nos anos 1970. Com raízes na cultura hip-hop, tomou forma nas block parties, as festas de quarteirão no bairro do Bronx, em Nova York. Nunca mais parou de evoluir, em movimentos acrobáticos cada vez mais difíceis e mais estilizados, ao ritmo imposto pelo DJ e o MC, o mestre de cerimônias, durante as batalhas. 

PARIS, FRANCE - DECEMBER 25: A breakdancer performs a street show at the Champs-Elysees as the people celebrate Christmas ahead of the New Year's eve in Paris, France on December 25, 2023. (Photo by Bruno Thevenin/Anadolu via Getty Images)
Os passos urbanos: na Place de La Concorde, a modalidade inédita que não estará em Los Angeles (Bruno Thevenin/Getty Images)

Convém aproveitar os dois dias de competição, porque a concórdia durou pouco. O breaking está no calendário de Paris, agora em agosto de 2024, mas não irá a Los Angeles, por paradoxal que seja, barrado pelos organizadores dos Jogos de Los Angeles em 2028. Mas por quê? As contas não fecharam, os patrocinadores preferiram outros caminhos, o dinheiro é que manda, e deu-se o improvável, o sumiço do esporte (sim, é um esporte) no país onde nasceu, sinônimo de um estilo de vida. Talvez retorne na Olimpíada de Brisbane, na Austrália, em 2032.

No episódio de sexta-feira, 9 de agosto, a turma que adora flanar por Paris, de mãos dadas com Charles Baudelaire e Paavo Nurmi

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