Os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro apontam a contradição entre o bom número de pessoas que costumam recebê-lo com entusiasmo nas ruas país afora e os números não tão bons das pesquisas de intenção de voto. Mas não há antagonismo entre os dois achados.
A base bolsonarista está mais mobilizada que os adversários nas ruas e nas redes sociais, é visível, e 35% ou 40% dos votos válidos é uma baita multidão. Mas seria errado acreditar que todas as pesquisas estão furadas no que têm em comum: hoje, Luiz Inácio Lula da Silva lidera com alguma margem, no primeiro e no segundo turnos, no voto espontâneo e no estimulado.
E lidera, basicamente, porque o presidente está encaixotado na fatia de mercado que esteve com ele no primeiro turno de 2018, cerca de um terço do total dos eleitores. A liderança de Lula se dá por Bolsonaro apresentar a esta altura um teto baixo, apesar do piso alto. Tem um belo estoque fidelíssimo de votos, mas acrescenta pouco fora do círculo mais fiel.
E por que um contingente de eleitores numa ordem de grandeza equivalente à que só aderiu ao capitão no segundo turno em 2018 vem resistindo à reeleição? Houve um período em que isso se deveu ao desconforto com as palavras, talvez mais que com as ações, dele na pandemia. Hoje o nó parece concentrar-se na economia. E mais no futuro que no passado dela.
“Não dá para ficar no ‘a situação é difícil mesmo, mas a culpa pelos números ruins não é minha’ ”
As mesmas pesquisas mostram o eleitor até que distribuindo a responsabilidade pelas dificuldades econômicas, especialmente a inflação. A ideia de a pandemia e a guerra na Europa terem criado dificuldades que pressionam os preços encontra receptividade entre os votantes. Mas o eleitor não parece estar atrás, principalmente, de apontar culpados.
O eleitor está em busca de quem possa apresentar soluções. De preferência imediatas. Ou, pelo menos, um plano capaz de enfrentar os problemas. Candidato a presidente em campanha é tipo um CEO que se apresenta diante dos acionistas da empresa. Não dá para ficar no “a situação é difícil mesmo, mas a culpa pelos números ruins não é minha”.
Boa parte da inflação brasileira é importada? Sim, mas essa explicação não resolve a vida de quem vê o salário comprar cada vez menos. E há o teatro do absurdo nos combustíveis, com Bolsonaro indo para o quarto presidente da Petrobras, mas sem conseguir influir na política de preços da companhia, apesar de o governo ser o acionista majoritário.
A paridade com os preços internacionais é um sucesso entre os acionistas minoritários da petrolífera e, aparentemente, entre o público que se identifica com o desejo de uma terceira via na corrida eleitoral. É pouca gente, talvez consigam eleger alguns deputados.
Não que Lula tenha sido objetivo no tema, apesar de prometer “abrasileirar” o preço do combustível na bomba.
Nem precisa. Como o presidente não apresenta, até agora, caminhos para aliviar o peso dessa despesa no bolso do povão, o petista pode jogar parado, esperando que prevaleça o “se Bolsonaro não está resolvendo, por que não dar uma chance ao Lula, que já esteve lá e deve saber o que fazer?”.
Publicado em VEJA de 8 de junho de 2022, edição nº 2792