“Caminhando contra o vento” e outras notas de Carlos Brickmann
O Congresso se apronta para, apesar de renovado, provar que continua o mesmo: Renan na Presidência do Senado é uma probabilidade real
Publicado na Coluna de Carlos Brickmann
O presidente eleito Jair Bolsonaro está quase pronto para o trabalho do ano que vem. Já preencheu vinte dos quinze ministérios que tinha prometido, e os dois últimos, que acertam a conta, estão no forno (pode ser até que, quando esta coluna for lida, já saibamos todos os 22 que eram 15).
A oposição está quase pronta para seu trabalho do ano que vem. Qual delas? Há duas: uma, PT mais PCdoB mais penduricalhos, liderada por Lula, ou Haddad, ou Gleisi, que se opõe à outra, PSB mais PDT mais não se sabe quem. Essa outra talvez até prefira Bolsonaro a Lula ─ afinal, Bolsonaro derrotou Ciro Gomes, mas não tentou manobras por baixo do pano para atrapalhar suas alianças nem sua candidatura. Mas, seja qual for, há oposicionistas se mexendo: já condenaram Bolsonaro por ser submisso aos EUA, ao prestar continência a John Bolton, assessor de Segurança Nacional de Trump; e por ter desrespeitado os EUA, ao servir ao mesmo John Bolton o café da manhã na cozinha de sua casa, com o bolo já cortado em fatias, numa mesa ─ horrorizem-se! ─ sem toalha.
O Congresso se apronta para, apesar de renovado, provar que continua o mesmo: Renan na Presidência do Senado é uma probabilidade real. Renan, apesar de tudo, não é o símbolo maior do Congresso. Símbolo mesmo é um ex-deputado, Valdemar Costa Neto, que cumpriu pena pelo Mensalão e é o cacique do PR. E é justo com Valdemar que Bolsonaro troca ideias hoje.
A chave do cofre
Mesmo com grande número de parlamentares não reeleitos, o Congresso foi o primeiro a colocar as cartas na mesa pensando no próximo governo. Já aprovou um belo aumento para o Supremo, que aumenta o gasto público, a partir de 2019, em algo como R$ 4 bilhões por ano. Por que aumentar os gastos com o Judiciário e deixar a Educação, por exemplo, com a mesma verba? Nossos congressistas são previdentes: sabem perfeitamente que, ao deixar a cadeira, pouquíssimos irão à escola. E são profissionais, gente do ramo: sabem que Bolsonaro tende a ignorar os partidos e a privilegiar áreas de influência, sejam governos estaduais, sejam segmentos econômicos ou religiosos. E se preparam para mostrar que, sem eles, o governo não anda.
O extremo centro
Quem ainda vai brigar muito para decidir onde fica é o PSDB. Fernando Henrique disse que cabe ao partido a posição de “centro radical”, afastado tanto de Lula quanto de Bolsonaro e mantendo posição critica diante do governo, embora podendo apoiar medidas específicas com que concorde. O governador paulista João Doria, estrela ascendente no tucanato, não apenas deu apoio a Bolsonaro no segundo turno (e assistiu tranquilo à campanha do “Bolsodoria” no primeiro) como, logo após as eleições, viajou para um encontro com o presidente eleito ─ a propósito, não foi atendido. Alckmin, que lançou João Doria na política, mas hoje não o vê com bons olhos, deve ficar com Fernando Henrique ─ mas é um candidato derrotado, sem o peso político que já teve. Aécio, hoje, não conta. Mas Tasso Jereissati conta: se conquistar a Presidência do Senado, dirá para onde vai o partido. Mas sua chance de manter a união tucana é mínima: o PSDB deve se dividir.
Dúvida 1
O articulador político do futuro governo, deputado Ônyx Lorenzoni, disse que a Funai passará do Ministério da Justiça para o da Agricultura. A dúvida: e que é que a Agricultura tem a ver com a população indígena?
Dúvida 2
Bolsonaro assistiu ao jogo Palmeiras x Vitória, no estádio palmeirense, entregou as medalhas aos campeões, abraçou os jogadores de seu time. Que terão dito seus médicos? Ele ainda está com os intestinos ligados a uma bolsa externa e a cirurgia que deveria realizar no dia 12 foi adiada por falta de condições. O presidente eleito não terá abusado de sua saúde? E comer cachorro-quente, por melhor que seja a salsicha, é adequado para ele?
Dúvida 3
Bolsonaro aproveitou bem a conquista do Brasileirão pelo Palmeiras. Apareceu bem, sorridente, foi homenageado por torcedores aos gritos de Mito, vestiu a camisa do seu time. Mas fica bem um presidente eleito usar camiseta com propaganda comercial? Poderia ter usado camiseta apenas com os símbolos do clube. Para sua imagem, seria bom do mesmo jeito.
O poder do ministro
No avião, antes da decolagem, um cidadão que reconheceu o ministro Ricardo Lewandowski disse que o Supremo era uma vergonha e que ele tinha vergonha de ser brasileiro. O ministro o ameaçou de prisão, o cidadão insistiu. Lewandowski chamou a Polícia Federal para prendê-lo. Os federais entraram no avião mas não prenderam ninguém: o cidadão prometeu não dizer mais nada ao ministro nem tumultuar o voo de forma alguma, e foi liberado para viajar. A ordem de prisão ─ bem, deixa pra lá.