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Eduardo Giannetti: “Precisamos de menos Brasília e mais Brasil”

Entre outros assuntos, foram abordados os desafios econômicos e políticos enfrentados pelo país

Por Augusto Nunes Atualizado em 26 abr 2017, 17h47 - Publicado em 25 abr 2017, 19h30

O convidado do Roda Viva desta segunda-feira foi Eduardo Giannetti da Fonseca, um dos pensadores mais respeitados do país. Mineiro de Belo Horizonte, ele se formou em Economia e em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo e é PhD em Economia pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra. Publicada em vários idiomas, sua obra inclui os livros “Vícios Privados, Benefícios Públicos?”, vencedor do Prêmio Jabuti em 1993, e “Trópicos Utópicos”, premiado pela Associação Paulista de Críticos de Artes em 2016. Confira trechos da entrevista:

“A Dilma apertou o botão da aceleração da crise. Mas o custo econômico da incompetência do seu primeiro mandato é tanto que estaríamos em recessão mesmo se não existisse o problema da corrupção em larga escala”.

“O primeiro mandato do Lula foi surpreendentemente bom, uma continuidade do segundo mandato do Fernando Henrique Cardoso. Tudo começou a se deteriorar no segundo governo Lula e acabou de vez no primeiro da Dilma”.

“Entre os erros mais graves dos últimos governos estão o uso pouco transparente do BNDES para favorecer parceiros e o problema do setor elétrico, de petróleo e gás. Não imaginava que veria de novo um governo segurando a inflação com o congelamento artificial dos preços, como fez a Dilma. Foram muitas coisas erradas num período curto de tempo. Desde Ernesto Geisel não via isso”.

“O Brasil estava com um câncer assintomático. Não tínhamos ideia do que estava acontecendo nessa imbricação entre público e privado. É altamente positivo e salutar, por mais doloroso que seja, saber disso, porque nos dá uma chance inédita de corrigir essa deformação patrimonialista do Estado brasileiro. Nunca se explicitou com tanta crueza a incestuosidade entre público e privado na condução dos negócios do país. O governo usando o setor privado para se perpetuar no poder e importantes segmentos do setor privado buscando atalhos. Em vez de enriquecer e crescer no mercado, oferecendo bens e serviços pelos quais existe uma demanda genuína, eles encontravam junto aos governantes um atalho de enriquecimento, e compravam favores, medidas provisórias, proteção, subsídios. Só a Lava Jato não basta para corrigir isso. Ela precisa vir acompanhada de uma reforma política”.

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“Os empreiteiros estão presos, os doleiros estão presos e os políticos estão soltos. A primeira medida necessária é acabar com o foro privilegiado. Precisamos ver os políticos envolvidos na cadeia. A Justiça está devendo isso à sociedade”.

“A falta de legitimidade do governo Temer para fazer as reformas é um problema. O Michel Temer no fundo é a continuação do governo Dilma. Ele não existiria sem ela. Quem se aliou a esse grupo foram os lulopetistas. Mas temos um Estado pelo qual transitam anualmente 45% da renda brasileira e que gasta com investimentos apenas 2,5% do PIB. Não vemos esse dinheiro sendo usado para melhorar o bem estar da população. Metade dos domicílios não têm saneamento básico, a saúde e a educação são deploráveis. Cadê o dinheiro?”.

“O Brasil gasta com previdência o mesmo que o Japão, mesmo tendo uma quantidade de idosos muito menor”.

“O que aconteceu com a aposentadoria do setor público no Brasil é inaceitável. Ela é cinco vezes maior que a do setor privado. Legislaram em causa própria e passaram a conta para o contribuinte”.

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“Boa parte da chamada esquerda usa um discurso de esquerda para a manutenção dos seus privilégios. Igualdade de oportunidades é fundamental para que a liberdade prevaleça. O que adianta dizer a um analfabeto que ele é livre para ler Machado de Assis? Sem capacitação a liberdade é vazia. Não dá para entender como um Estado deste tamanho não consegue dar igualdade de oportunidades”.

“Meu lema hoje é menos Brasília e mais Brasil. Não vejo por que o dinheiro público precisa ir até Brasília e depois voltar para os estados. Ele deveria ser gasto o mais próximo possível de onde é arrecadado. O cidadão mora no município, precisamos dar poder aos governos locais. Isso é cidadania tributária. A quem interessa o dinheiro que nós pagamos ir para Brasília e depois voltar?”.

“Tenho enorme respeito e admiração pela figura da Marina Silva. Mas ela precisa definir se é líder de um movimento, como Gandhi ou Martin Luther King, que projeta valores e não tem que se posicionar sobre temas espinhosos. Ou se é uma candidata a chefe do Executivo. Alguém que não vai fugir de definições que não agradarão a todos. Os dois caminhos são válidos, mas é preciso optar por um e isso tem que estar claro”.

“O candidato que falar que as reformas não são necessárias vai repetir a Dilma, que cometeu um estelionato eleitoral em 2014. Durante a campanha, vendeu um país completamente desconectado com a realidade e, no primeiro dia de governo, deu uma guinada no caminho oposto”.

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“O Brasil precisa deixar de ser uma caricatura de mercado e uma caricatura de democracia. Os principais grupos econômicos do país, com raríssimas exceções, tiveram sucesso não no mercado, mas porque pegaram um atalho com a ajuda de grupos políticos”.

“O Brasil vive uma situação paradoxal na qual precisa de menos e mais Estado ao mesmo tempo. O Estado está onde não deveria estar e não está onde deveria estar”.

“Outro dia me deparei com uma frase do Fernando Pessoa que dizia: ‘Nós nos extraviamos a tal ponto, que devemos estar no bom caminho’. Fiquei cheio de esperança no Brasil quando li isso”.

“Estou surpreso com o silêncio das ruas diante da enormidade dos fatos que apareceram nas últimas semanas. O que mobiliza e leva a grandes manifestações é realmente inesperado”.

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A bancada de entrevistadores reuniu os jornalistas André Lahóz Mendonça de Barros (Exame), Alexa Salomão (Estadão), Érica Fraga (Folha), João Gabriel de Lima (Época) e Sergio Lamucci (Valor). Com desenhos em tempo real do cartunista Paulo Caruso, o programa foi transmitido ao vivo pela TV Cultura.

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