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Eliziário Goulart Rocha: Inimigos reais e imaginários

Um dos grandes nós que os brasileiros terão de desatar nos próximos tempos é o da polarização exacerbada

Por Augusto Nunes Atualizado em 30 jul 2020, 20h57 - Publicado em 8 abr 2017, 07h12
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  • Muro em Brasília divide manifestantes contra e a favor do Impeachment
    Muro em Brasília divide manifestantes contra e a favor do Impeachment (Beto Barata/AFP)

    Doutrinas estranhas ao corpo de uma sociedade tendem a vicejar somente na contenda. Como no gesto de uma criança que conversa com amigos imaginários para driblar a solidão em um mundo ao qual não sente pertencer de fato, a tentativa de construção de um sistema ideológico hegemônico implica a existência do ente radicalmente oposto. Não havendo um grupo inimigo genuíno, trata-se de criá-lo. O adversário invisível passa a ser depositário de tudo que for contrário aos preceitos dominantes, ainda que este domínio seja eventual, transitório e, na maior parte das vezes, forçado. A partir daí, quem não reza pela cartilha estabelecida é considerado inimigo e rotulado com qualquer adjetivo que pareça desabonador aos olhos do poder, mesmo que muitos dos rotulados não tenham afinidade alguma com os rótulos a eles destinados, ou sequer compreendam seu significado, fenômeno recorrente também em quem os impinge.

    Um dos grandes nós que os brasileiros terão de desatar nos próximos tempos é o da polarização exacerbada, robustecida pela busca desta hegemonia ao longo de muitos anos. O que muitos chamam de Fla-Flu (variando de acordo com a região, no sul, por exemplo, usa-se o termo “grenalização”, também em alusão ao maior clássico do futebol local), a eterna disputa entre “nós” e “eles”, evidentemente, não é uma praga exclusiva do Brasil, tampouco deriva única, ou prioritariamente, de disputas político-eleitorais. Entre as muitas causas deste fenômeno que atinge países mundo afora, o advento da internet e, principalmente, das redes sociais é, por óbvio, a principal.

    O mundo digital deu voz a todos, para o bem e para o mal. Como disse Umberto Eco, “as redes sociais dão o direito à palavra a uma legião de imbecis que antes falavam apenas em um bar e depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a coletividade. Normalmente, eles eram imediatamente calados, mas, agora, têm o mesmo direito à palavra do que um Prêmio Nobel. A TV já havia colocado o ‘idiota da aldeia’ em um patamar no qual ele se sentia superior. O drama da Internet é que ela o promoveu a portador da verdade.” Muito rude? Elitista? Talvez, mas alguém precisava dizer isso com todas as letras neste mundo politicamente correto.

    Aliás, a era do politicamente correto foi muito bem-vinda, pois urgia se travar um combate incessante ao racismo, à homofobia, ao machismo, à misoginia e a tantas formas de agressão – no mínimo moral e emocional, tão terríveis quanto na forma física, e que deixa marcas por vezes muito mais profundas – até então disfarçadas, no dia a dia, como “apenas brincadeira”, “só uma piada”, “nada demais, que bobagem”. Uma vez a porta aberta, é claro que por ela começaram a passar exageros de todo tipo, mas é um preço a ser pago, e bem baixo, considerando-se as opções. Palavras apenas não resolvem tudo, mas a pressão acaba por levar à conscientização e à adoção de ações concretas, à aprovação de leis de proteção às minorias e etc.

    A era do politicamente correto e o crescimento da internet, não por acaso eventos que se encontraram no tempo, ajudaram a polarizar as discussões de boa parte do mundo ocidental, ao menos. A consolidação das redes sociais fez com que muitos usuários passassem a se sentir sob efeito de, utilizando-se um termo da moda, uma espécie de condução coercitiva para opinar, sob pena de se sentirem excluídos do grande debate do mundo virtual, que quase sempre acalora discussões sobre tudo, e no fundo sobre o nada, e que, na maioria das vezes, jamais levará a resultados edificantes.

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    Alimentado por tais razões, o maniqueísmo – ele sempre existiu, diga-se – é um fenômeno global, e por vezes pode ser específico, como no caso dos americanos divididos entre amar Trump e odiar Trump. No Brasil, o longo período dedicado à construção de uma ideologia hegemônica acabou por estabelecer um abismo entre irmãos. A criação do inimigo a ser combatido, essencial no processo, encontra um exemplo claro na falsa questão petistas x tucanos. No fundo, todo mundo sabe que, embora o PSDB tenha muitos simpatizantes e antipatizantes, como qualquer partido de grande porte, e o mesmo vale para o PMDB, e já valeu para tantos outros, fato é que no Brasil de hoje o único partido com grande contingente de militantes apaixonados, muitas vezes fanáticos, uma verdadeira torcida organizada, é o PT.

    E isso é mérito do PT, sem dúvida alguma. A seu modo, o partido fez por merecer isso, tanto quanto os demais não o fizeram. Foi competente onde os outros se mostraram incompetentes. Por isso, querer polarizar a discussão entre petistas e “tucanos” é forçar a barra. Para o bem e para o mal, somente o PT tem esta torcida. Quem acompanha Fórmula 1 sabe que, por mais que todas as equipes possuam simpatizantes, a maioria de ocasião, só a Ferrari conta com uma torcida verdadeira. Existem os “ferraristas”, mas não existem “maclarenianos” ou “mercedistas”. O que se formou no País nos últimos anos não foi uma gigantesca trupe de “tucanos”, que de fato são proporcionalmente poucos, por inépcia deles, mas um numeroso bloco anti-PT, por uma série de razões. Ao inimigo imaginário, o PT batizou de “tucano”. Era a via mais óbvia, uma vez que os dois partidos têm sido os protagonistas nas últimas seis eleições presidenciais.

    Rótulos à parte, pois eles maquiam situações e não abrigam soluções, ao contrário, o grande desafio do Brasil atual é fechar as trincheiras, derrubar os muros, parar de alimentar discussões que racham cada vez mais nossa precária estrutura social. Todos precisam parar para pensar nisso com seriedade. A divisão só interessa a quem quer tirar proveito pessoal da ruptura. Para a grande maioria dos brasileiros, que nem sabe o que significa ser chamado de tucano, que conhece apenas aquela ave bicuda, pouco importam ideologias, conceitos e rótulos. Esta maioria quer paz, mais desenvolvimento, empregos, renda, menos impostos, menos burocracia, um estado menos obeso pelas calorias do compadrio e, sobretudo, menos roubalheira, venha de onde vier. Neste caminho, é essencial que se diminua a polarização, que se despolitize qualquer postagem em redes sociais, que se pare de ver ideologia até na foto de um encontro no boteco.

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