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Mas que Polícia Federal, que nada!

TEXTO PUBLICADO NO ESTADÃO DESTA QUARTA-FEIRA José Nêumanne O Departamento de Polícia Federal (DPF), subordinado ao Ministério da Justiça, tem sido um ai-jesus do marketing eleiçoeiro nestes sete anos e dez meses das gestões petistas de Lula. Vende-se a ideia de que, na “nova administração”, os agentes encarregados de reprimir contrabando e tráfico de drogas, […]

Por Branca Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 13h48 - Publicado em 27 out 2010, 16h20

TEXTO PUBLICADO NO ESTADÃO DESTA QUARTA-FEIRA

holmes

José Nêumanne

O Departamento de Polícia Federal (DPF), subordinado ao Ministério da Justiça, tem sido um ai-jesus do marketing eleiçoeiro nestes sete anos e dez meses das gestões petistas de Lula. Vende-se a ideia de que, na “nova administração”, os agentes encarregados de reprimir contrabando e tráfico de drogas, entre outros delitos de sua alçada, tornaram-se, de repente, mãos armadas pelo Estado brasileiro, pela primeira vez sob controle popular, para prender e algemar criminosos contra os interesses do povo trabalhador. Como num passe de mágica, a estrutura repressiva, truculenta e corrupta de antes da República pete-lulista se teria transformado num instrumento incorruptível e implacável de justiça, que passou a povoar seus xadrezes com políticos e burgueses inescrupulosos que fazem fortuna se apropriando do parco pão dos pobres. Será essa a expressão da verdade ou mera propaganda enganosa?

A pergunta tornou-se inevitável após as notícias da investigação feita pelos federais sobre a quebra de sigilo fiscal e bancário da filha do candidato da oposição à Presidência da República, José Serra, do PSDB, do marido dela e de outros tucanos de alta plumagem, entre os quais o vice-presidente nacional do partido, Eduardo Jorge Caldas Pereira. A duas semanas do segundo turno da eleição presidencial, em que a sorte da candidata do presidente, Dilma Rousseff, do PT, será lançada, os investigadores descobriram o óbvio: o sigilo foi quebrado por servidores da Receita Federal, que tinham em comum a carteirinha do PT. Só que com a conclusão factual veio um palpite, que virou veredicto, de que não havia conexão entre a quebra de sigilo de tucanos por petistas e o pleito, apesar da feroz disputa deste por vítimas e algozes. Nem o dr. Watson seria capaz de explicar ao detetive Sherlock Holmes a lógica da teoria de que, além das aparências, as evidências também enganam. Ou seja, a prova definitiva de não ter havido motivação partidária na prática do delito seriam os laços dos servidores delinquentes com o partido no poder e dos contribuintes lesados com o partido do opositor renitente.

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Algum desavisado pode imaginar que esse absurdo da prática investigativa tenha sido um mero tropeço numa caminhada de acertos da polícia cidadã de que tanto os ex-ministros da Justiça Márcio Thomaz Bastos e Tarso Genro sempre disseram se orgulhar. Uma radiografia isenta e desapaixonada das operações com denominações escalafobéticas do DPF, porém, conduz à conclusão exatamente oposta.

O militante petista Waldomiro Diniz foi filmado e gravado achacando o “empresário” da jogatina Carlos Augusto Ramos, conhecido como Carlinhos Cachoeira. Em 2002, ano da primeira vitória eleitoral de Lula para a Presidência, ele abordou o referido doador potencial para lhe pedir dinheiro para as campanhas eleitorais de Rosinha Matheus (PMDB, ex-PSB), Benedita da Silva (senadora do PT), do Rio de Janeiro, e Geraldo Magela (PT), de Brasília. Em contrapartida, ofereceu ao interlocutor a possibilidade de modificar a seu bel-prazer um edital da Loteria do Estado do Rio de Janeiro (Loterj), estatal que presidia naquela ocasião. Mas, seis anos e oito meses depois da denúncia do caso pela revista Época, o DPF não conseguiu produzir um inquérito capaz de servir de base para o Ministério Público processar o ex-encarregado por José Dirceu das negociações do Palácio do Planalto com as bancadas governistas no Congresso. A impunidade por ele gozada agora é perpétua, pois, já prescrito, seu crime ficará impune para sempre.

De Waldomiro Diniz para cá, o DPF tem brilhado nas páginas dos jornais com prisões de empresários, banqueiros e políticos sem relevância de regiões remotas do imenso território brasileiro. De 2003 a 2004, no primeiro governo Lula, foram realizadas 292 operações, nas quais 153 políticos tiveram a vida devassada. Em 2007, 54 políticos foram investigados em 188 operações. Em 2008, 101 em 235; e em 2009 e 2010, 69 em 288. Entre 2003 e outubro de 2010, 393 políticos tiveram de se explicar aos agentes federais do DPF. Entre eles, o único figurão do governo federal que virou alvo dos policiais foi o ex-presidente da Empresa de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero) Carlos Wilson Campos. A diferença entre o governista e seus colegas da oposição indiciados é que, enquanto os outros foram autuados, ele foi “dispensado”: afinal, tinha morrido.

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Dois anos depois do achaque ao “bingueiro”, o DPF, sob Lula, tentou prender o financista Daniel Dantas na Operação Chacal, deflagrada por uma fraude – um CD-ROM produzido pela sócia italiana que disputava com ele o controle da Brasil Telecom foi entregue aos federais como “prova” de que o acusado tinha contratado a empresa de consultoria americana Kroll para espionar sócios e autoridades. Foi provado pela perícia oficial que não houve crime. Mas o DPF não descansou até prender o gestor de fundos, tendo como base outra fraude – o vídeo produzido pela equipe do repórter César Tralli, da Globo, procurando exibir a hipotética tentativa de suborno do delegado por dois pretensos emissários de Dantas. A Procuradoria de Milão, ao investigar fraudes da Telecom Italia, constatou que ela subornou autoridades da República e policiais brasileiros para defenderem seus interesses. O próprio DPF processou o delegado encarregado do caso, Protógenes Queiroz, o que não impediu que ele se elegesse deputado federal com sobras dos votos do palhaço Tiririca, e isso lhe garantirá, entre outros benefícios, foro privilegiado.

Dois lembretes antes de concluir: Lula pediu que o ex-presidente FHC mandasse o DPF investigar o assassinato de Celso Daniel, em 2002. E garantiu à viúva de Toninho “do PT” que, no poder, tudo faria para punir quem matou o marido dela, em 2001. Algum leitor arguto pode informar em que, nove anos depois do assassínio do prefeito de Campinas e passados 106 meses da execução do de Santo André, o DPF contribuiu para os inquéritos que apuram estes dois casos?

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