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A revolta do estresse

Por que o corpo resiste no momento de descanso?

Por Lucilia Diniz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 09h29 - Publicado em 19 jan 2024, 06h00
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  • “É só parar que tudo vem.” Quantas vezes você já ouviu, ou disse, uma variante dessa frase? É só chegar aquela semana de descanso que, com ela, chegam também uma dor aqui, uns espirros ali, uma queda de pressão ou aquela moleza. No fim de ano, um conhecido meu passou por isso. Na hora de fechar as malas para viajar, febre alta. A bateria de exames às pressas para descartar Covid e outros contágios não encontrou nada. Só alguns dias depois, já no destino escolhido para o réveillon, o corpo entendeu que podia, sim, descansar.

    Estimulado pelos hormônios que produz para lidar com o estresse, o corpo não sabe como reagir quando para. A resposta, muitas vezes, é um mal-estar súbito e, aparentemente, sem explicação. A ciência já estuda esse fenômeno há alguns anos. Em 2001, um pesquisador holandês, Ad Vingerhoets, já falava em “síndrome do lazer”. Mas ela se tornou tão comum que, em inglês, ganhou um apelido. É o let down effect. O nome é curioso e inteligente, porque sugere mais de um significado — e cada um deles permite um ponto de vista diferente sobre a questão.

    “Se você não conseguiu desacelerar antes de parar, talvez o melhor seja mesmo não parar”

    No dicionário, o primeiro sentido de let down é decepcionar. É como se, diante da mudança repentina de ritmo, o corpo, decepcionado, não soubesse como lidar e se queixasse: “O que eu faço com toda a adrenalina e o cortisol que joguei na sua corrente sanguínea para você dar conta de tudo?”. O que o corpo faz é pedir cama. Quando um veículo em velocidade máxima tem de brecar, a inércia faz com que ele continue em movimento por uns metros. E aí pode acontecer um acidente. Da mesma forma, o corpo frenético, ao ver toda a atividade cortada, sofre uma espécie de bug. No caso, a “freada brusca” é o segundo sentido de let down: relaxamento.

    Seguindo nessa metáfora, a saída pode vir do que fazemos quando estamos de fato dirigindo um carro: desacelerar antes de frear. O ideal seria não bater com ímpeto total no portão de embarque, mas ir diminuindo o ritmo nos dias prévios à parada total. E não só do mundo das máquinas e engrenagens vêm os sinais. Mesmo a natureza alterna seus ritmos; como dizem os versos de Octavio Paz, até “o sol dorme, e a luz descansa / sobre a curva do dia”. Porém nem sempre é possível “programar” essa desaceleração como definimos, na agenda, uma parada para descansar. O mais comum é fazer tudo na última semana. O que o let down sugere é que seria bom, além de manter alimentação, sono e exercícios na rotina, espaçar os compromissos e reservar pequenas doses de relaxamento.

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    Ironias da língua, o mesmo termo que descreve o problema traz embutida uma outra solução. Let down também significa “permitir uma descida gradual”. É o avião se aproximando da pista de pouso suavemente. Portanto, se você não conseguiu desacelerar antes de parar, talvez o melhor seja mesmo não parar. Ao menos, não de uma vez. Nos primeiros dias de descanso, exercícios curtos e regulares — uma caminhada, uma corrida de poucos minutos — podem dar uso aos hormônios que, em excesso, sobrecarregam o sistema. Exercitar a mente também ajuda, e nisso valem quebra-cabeças, palavras cruzadas e similares. Não decepcione seu corpo. Coloque o descanso como um objetivo, não como uma boia de resgate.

    Publicado em VEJA de 19 de janeiro de 2024, edição nº 2876

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