Por que Jesus Cristo foi tão revolucionário, segundo Frei Betto
Em seu último livro, o frade e escritor examina, por meio de um dos Evangelhos, como a figura maior do cristianismo rompeu diversos paradigmas sociais

Rebelde, militante, revolucionário… e amoroso. Essas são as facetas de Jesus que Frei Betto se propõe a analisar, através dos quatro Evangelhos, numa tetralogia que deve ser concluída ainda este ano e vem sendo publicada pela Editora Vozes.
Em cada um desses livros, o teólogo e escritor realiza uma leitura comentada dos textos que integram o Novo Testamento, contextualizando e refletindo sobre as vivências, lições e legados de Cristo – e inúmeras vezes fazendo pontes com o momento presente.
Em Jesus Militante, o frade dominicano parte do Evangelho de Marcos para examinar o “projeto político do Reino de Deus”. Em Jesus Rebelde, o Evangelho de Mateus é o pano de fundo da ruptura com o judaísmo.
Já em Jesus Revolucionário, o último publicado até aqui, somos apresentados a um homem que prega a igualdade em meio à contradição de classes e à desigualdade de gênero. O Evangelho de Lucas, o que mais valoriza as mulheres, oferece o roteiro para Frei Betto dissecar questões que ainda hoje mobilizam a sociedade.
Nesse itinerário, marcado pela adesão do teólogo ao pensamento de esquerda e a nomes como o educador Paulo Freire, nenhuma elite ou entidade poderosa está imune a críticas – a própria Igreja Católica receberá as suas.
Mas, muito além disso, o que a leitura dessa obra fornece é uma chave de compreensão e interpretação de um texto fundamental para o cristianismo – com mensagens que resistem ao tempo tocando o indivíduo e o coletivo.
Até o fim do ano, o autor pretende encerrar a publicação da tetralogia. E adianta à coluna o título e a abordagem do volume final, que mergulhará no Evangelho de João: “Será Jesus Amoroso”.
Com a palavra, Frei Betto.
No livro, o senhor mostra que Jesus é revolucionário em diversos sentidos. Em nossos tempos de guerras, reais e comerciais, mudanças climáticas e vida (e depressão) entre telas, qual seria a mensagem mais urgente de Jesus?
Creio que seria a mensagem da paz como fruto da justiça, segundo palavras do profeta Isaías 700 anos antes de Cristo. Hoje, os senhores da guerra acreditam que a paz virá no equilíbrio de forças. Por isso ainda investem em arsenais nucleares capazes de destruir o nosso planeta inúmeras vezes.
No Evangelho de Lucas, analisado no último livro, qual episódio melhor reflete o poder revolucionário de Jesus?
A Parábola do Bom Samaritano, que está no capítulo 10. Jesus critica a visão oportunista do teólogo judeu, interessado na vida eterna, e o traz para esta vida, descrevendo um episódio de violência, extorsão e preconceito. Citar o bom exemplo do samaritano equivale, hoje, a citar para um judeu fundamentalista a atitude de um palestino como mais agradável a Deus. E Jesus ressalta a opção pelos pobres e acentua que o próximo não é quem encontramos em nosso caminho, e sim aquele pelo qual somos capazes de mudar o nosso caminho para prestar solidariedade.
Podemos dizer que Jesus também foi um revolucionário feminista e, por que não, alguém que já pregava o respeito à comunidade que hoje chamamos de LGBT+?
Sim, o Evangelho de Lucas é o mais feminista dos quatro evangelhos. O único que cita os nomes das mulheres que integravam o grupo de Jesus. E ressalta Maria como revolucionária ao descrever seu cântico Magnificat, que diz ter Deus “derrubado os poderosos de seus tronos e despedido os ricos de mãos vazias”. Além disso, nenhum Evangelho se refere a qualquer preconceito de Jesus a pessoas gays.