
É atávico. Todos os anos, os brasileiros se surpreendem com os baixos índices na qualidade e na equidade como a educação é oferecida. Apesar de avanços, três brechas estão aumentando. Uma brecha social: mesmo com a evolução no número de matrículas na escola para os pobres, a qualidade cresce mais para a parcela rica. A brecha internacional: outros países avançam mais rapidamente, nos deixando para trás. E aumenta a brecha pedagógica: entre o que é ensinado e o que deveria ser ensinado para preparar um jovem para as necessidades de conhecimento que o mundo contemporâneo exige.
Além de observar os possíveis avanços do passado ao presente, a educação deve ser avaliada para medir a que distância ainda estamos de garantir a alfabetização para a contemporaneidade a todos os brasileiros. Falar, ler e escrever bem o idioma português, sendo capaz de entender os textos, fazer análises linguísticas e críticas literárias. Ser fluente em pelo menos um dos idiomas usados internacionalmente, especialmente em inglês. Sem isso, o jovem não estará integrado ao mundo. É crucial entender os fundamentos das ciências, geografia, história, matemática, sem o que ninguém é capaz de dispor do mapa necessário para caminhar na busca de sua felicidade nem das ferramentas para participar da construção de um mundo melhor e mais belo.
“Raras escolas brasileiras são capazes de assegurar alfabetização plena”
Como aprender a deslumbrar-se com as artes, ter competência e gosto para o debate sobre os temas de filosofia, política, antropologia e sociologia, sem educação? E como indignar-se diante da permanência da pobreza, da desigualdade social, do autoritarismo, da corrupção e dos preconceitos contra as minorias? Os caminhos são nítidos, e ficamos para trás. É fundamental saber usar com competência as ferramentas digitais necessárias para usufruir e trabalhar a partir delas. Formar-se em pelo menos um ofício que permita emprego e renda, independente de curso superior. Adquirir noções e gosto pela prática de solidariedade com vizinhos, compatriotas e toda a humanidade: respeito aos patrimônios cultural e natural e sua diversidade. Ter consciência para querer participar da construção de sociedades pacíficas, com zelo pelo desenvolvimento sustentável, democrático e justo. Ser capaz de obter educação continuada ao longo da vida, mesmo depois da escola, nestes tempos de limites, incertezas, revoluções tecnológicas e conceituais, transformações geopolíticas e metamorfoses. Garantir a todos que desejarem, com vocação e talento, a base necessária para concorrer a vagas nas melhores universidades e nos mais disputados cursos do ensino superior.
Raras escolas brasileiras são capazes de dar essa formação e assegurar a alfabetização plena. Sem um choque necessário, dos 2,5 milhões de brasileiros e brasileiras nascidos em 2024, no máximo 500 000 chegarão a 2042 com uma razoável educação para dispor do conhecimento necessário. O Brasil precisa criar um ministério dedicado aos assuntos da educação de base. Está mais do que na hora de definir e implantar uma estratégia que, ao longo de duas ou três décadas, crie um robusto sistema nacional para todos, independente da renda e do endereço das famílias.
Publicado em VEJA de 17 de abril de 2025, edição nº 2940