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Dora Kramer

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Horizonte perdido

A ‘terceira’ não soube pavimentar sua via e hoje respira por aparelhos ligados à esperança

Por Dora Kramer Atualizado em 4 jun 2024, 12h18 - Publicado em 8 abr 2022, 06h00

A possibilidade de vingar uma candidatura alternativa ao embate entre Jair Bolsonaro e Luiz Inácio da Silva hoje respira por aparelhos. Todos eles ligados à expectativa do chamado centro democrático de que as manhas do imprevisível possam produzir uma boa surpresa. A esperança, sabemos, é a última a aderir a cerimônias de adeus.

Por isso o pessoal empenhado na construção de uma outra via não desiste, se movimenta e tenta de tudo para ver se há um caminho que evite a entrega da toalha de véspera. É provável? Difícil. É possível? Tudo na vida é, ainda mais na política brasileira, cujo histórico apresenta um robusto tributo ao inesperado, sempre à espera na esquina.

Se deslanchar, esse projeto terá desmentido as análises de cenário em vigor no mundo político. Já aconteceu algumas vezes. O exemplo mais recente ocorreu em 2018. No início daquele ano ninguém de bom senso apostava em Bolsonaro presidente.

Ainda assim, sejamos realistas. No mundo político, a avaliação corrente dá conta de um jogo sem volta. Tais análises não dão a Lula vitória certa. Já houve essa convicção. Na atual conjuntura, contudo, é tida como hipótese forte, mas incerta.

Por vários motivos, sendo o principal deles a exitosa entrega da articulação política nas mãos de Ciro Nogueira, ministro-chefe da Casa Civil e comandante do PP. O partido ganhou deputados, o PL atraiu Bolsonaro, tornou-se a primeira bancada da Câmara e, junto ao PTB, ao Republicanos e a outros pequenos satélites, o centrão conseguiu reunir na janela partidária cerca de 200 deputados num universo de 513 parlamentares. Era forte, ficou fortíssimo.

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Ganho inequívoco para quem não conseguiu criar um partido (Aliança pelo Brasil) e poucos meses atrás estava em dificuldade para se filiar a uma legenda. Até adversários admitem: Jair Bolsonaro está se deixando conduzir de modo eficiente — não necessariamente ético nem condizente com aquela conversa de “nova política” — pelos meios e modos da (triste) realidade brasileira no campo das concessões indevidas.

“A ‘terceira’ não soube pavimentar sua via e hoje respira por aparelhos ligados à esperança”

O presidente da República entregou o manejo do Orçamento da União e em troca obteve juras de fidelidade do Centrão com promessas de que na campanha o grupo não voltará a aderir a Lula. Pedra no caminho do PT, que, embora em posição menos confortável devido à queda no favoritismo, ainda segue no topo. Complicada mesmo tem sido a vida dos oponentes na luta para tentar se tornar minimamente competitivos. Basta ver o seguinte: as mexidas para cima e para baixo nos índices de Lula e Bolsonaro nas pesquisas não significaram transferência de intenções de voto para nenhum dos outros personagens citados nas consultas.

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Isso não ocorre por falta de exposição. Com variação no entra e sai de nomes, esse grupo está sempre no noticiário. Mais visibilidade que a do governador João Doria durante a pandemia, impossível. No entanto, está ele empacado nos 2%, 3%, no máximo 4% se considerada a margem de erro. O assunto terceira via é manchete, rende notícia ao menor movimento. No entanto, esse pessoal está ali empacado sem passar dos 8%, 10% nos melhores dias.

Onde a coisa enrosca? Será na falta de interesse do público nesse momento? Será mesmo a ausência de unidade entre os pretendentes e o problema? Desataria esse nó o anúncio de um nome com o apoio dos demais? O gesto teria o condão de conquistar o eleitorado, hoje refém de dois caminhos cheios de rejeição e sinais de que a guerra continuará com a reeleição de Bolsonaro ou a volta de Lula?

Respostas certeiras não existem. Razões isoladas tampouco. Menos arriscado seria apostar no conjunto da obra com um adendo crucial: a ausência de construção de um diálogo identificado com as demandas do público. Lula e Bolsonaro falam cada qual a bordo do capital amealhado no exercício das respectivas Presidências. Nesse aspecto, aos oponentes falta patrimônio, marca própria.

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Tiveram tempo, mas nenhum deles seguiu por trilha inovadora e atrativa. Ficaram todos — os desistentes e os persistentes — prisioneiros de expectativas: de um lado que o telhado de vidro e o antipetismo engolisse Lula e, de outro, que Bolsonaro fosse vítima de suas perniciosas circunstâncias.

A “terceira” não pavimentou a sua via, atuou referida nos dois personagens que por esta e algumas outras não lideram as pesquisas por acaso.

Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

Publicado em VEJA de 13 de abril de 2022, edição nº 2784

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