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Muro de arrimo

A tese da extensão de mandatos não teve espaço para prosperar

Por Dora Kramer Atualizado em 4 jun 2024, 14h03 - Publicado em 3 jul 2020, 06h00
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  • Eleição municipal adiada sem prorrogação de mandatos é um dado a ser valorizado no Brasil que ainda discute o valor da democracia, duvida de si diante do devaneio de um general de pijamas no papel de pitonisa de “consequências imprevisíveis” e, com razão, mobiliza esforços para lembrar às novas gerações que os anos de 1964 a 1985 foram de chumbo.

    O tema da consolidação do regime, por mais que devesse e parecesse encerrado, voltou à cena com a agenda regressiva de Jair Bolsonaro apoiada por uma estridente minoria (ora acuada, porém resistente) que levou o presidente a se sentir seguro para patrocinar retrocessos na proteção ao meio ambiente, na promoção da ciência, no patrocínio à cultura, na produção de pesquisas e de estatísticas, no controle de armas, no respeito aos direitos daqueles que não rezam pela cartilha dele e a cometer uma série de abusos pelos quais Bolsonaro paga preço alto e dos quais busca neste momento se distanciar.

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    Antes de prosseguir no tema adiamento de eleições, cumpre registrar que o presidente ainda tem léguas a percorrer antes de conseguir ser digno de alguma confiança. Precisaria desmentir as palavras ditas, revogar os próprios pensamentos, renegar a vida pregressa, rejeitar a fé de seus devotos, jogar tudo isso no lixo e nascer de novo.

    Desenhado o cenário do atraso, vamos ao exemplo de avanço que nos leva de volta às eleições municipais: a absoluta impossibilidade de que prosperasse o debate em torno da proposta de prorrogar mandatos dos atuais prefeitos a fim de se aproveitar do ensejo para unificar as datas dos pleitos municipais, estaduais e nacional a partir de 2022.

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    “Em tempos de cuidados com a democracia é de ressaltar o repúdio geral à prorrogação”

    Em duas ocasiões, 1976 e 1982, os prefeitos tiveram seu mandato prorrogado para 1982 e 1988, respectivamente. Lá também foi preciso aprovar emendas constitucionais. Diferentemente do momento atual, contudo, o Brasil vivia sob regime autoritário e daí se extrai que na democracia esse tipo de estratagema não cola.

    Agora barrados na tentativa de promoverem o mesmo tipo de baile, prefeitos e deputados a eles aliados tentaram pegar o atalho da lei de Gérson, buscando vantagens. No caso, um reforço ao caixa das prefeituras e a volta da propaganda partidária no rádio e televisão. Oportunismos rejeitados, mas com os quais anda assim vão deparar nas urnas os defensores de ambas as ideias.

    Alegavam que o adiamento de quarenta dias lhes renderia prejuízos porque os eleitores teriam ainda mais um mês de vivência na crise antes de votar. Como se no conjunto do período de pandemia isso fizesse diferente. Mas a percepção do público de que a pressão deles era para tirar proveito da situação pode fazer muita diferença na hora do julgamento eleitoral.

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    O comportamento de cada gestor na crise sanitária será o principal tema desta eleição, ao menos nas médias e grandes cidades. Em novembro valerá mais o trabalho comprovado que a conversa-fiada. E os deputados candidatos de 2022 que não se iludam: o efeito será duradouro.

    Publicado em VEJA de 8 de julho de 2020, edição nº 2694

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