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As (poucas) diferenças entre realidade e ficção em ‘Ainda Estou Aqui’

Trama é bem fiel ao livro de memórias de Marcelo Rubens Paiva, mas tem alguns pontos sutis de divergência

Por Amanda Capuano Atualizado em 11 nov 2024, 19h30 - Publicado em 11 nov 2024, 18h22

Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, conta a história da família Paiva sob o ponto de vista de Eunice (Fernada Torres/Fernanda Montenegro) — mãe que teve de assumir o cuidado dos cinco filhos e a luta por justiça depois que o marido, Rubens Paiva (Selton Mello), foi torturado e morto pela ditadura militar, em janeiro de 1971.

Baseado no livro de memórias homônimo de Marcelo Rubens Paiva, único filho homem do casal, a trama é bem fiel à realidade. Rubens foi de fato dirigindo o próprio carro para o depoimento do qual nunca voltou; Eunice e a filha Eliana, de apenas 15 anos, foram levadas encapuzadas para as dependências do Exército; a casa da família passou dias ocupada por militares; um policial realmente disse a Eunice, pouco antes de liberá-la do DOI-Codi, que não concordava com o que acontecia ali; e a certidão de óbito de Rubens Paiva só foi emitida 25 anos depois de sua morte, em 1996. Há, no entanto, algumas poucas liberdades poéticas. Confira a seguir:

Pimpão, o cachorrinho da família

Adotado pelos Paivas depois de ser encontrado na praia por Marcelo, o animal não existiu na vida real — ao menos não em sua forma canina. A inspiração para o pet, na verdade, foi um gato de rua que aparecia no escritório do Rubens e na casa da família com certa frequência e que passou a ser chamado de Pimpão por eles. Em entrevista a VEJA, Eliana contou que o animal desapareceu depois que Rubens foi levado pela polícia e não voltou mais. Filmar cachorros, no entanto, é mais fácil do que trabalhar com gatos — já que o temperamento dos felinos costuma ser mais arredio e hiperativo.

Carro no pátio do quartel

Marcelo Rubens Paiva escreve no livro que a mãe contou a todos que viu o carro de Rubens, um Opel vermelho, no pátio do DOI-Codi, o que comprovaria que ele foi levado preso para lá, assim como ela e Eliana. No filme, Eunice volta ao local para buscar o carro do marido, com a desculpa de levar remédios de diabetes para ele. Quem resgatou o carro de Rubens, na verdade, foi sua irmã mais velha, no dia 4 de fevereiro, quando levava medicamentos e roupas para o ex-deputado — que estava morto havia quase duas semanas. Os militares entregaram o carro a ela junto com um recibo que atestava que o automóvel estava no DOI — mesmo assim, eles alegaram que Rubens não foi detido na unidade.

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Veroca cinegrafista

Filha mais velha de Eunice e Rubens, Vera faz diversas imagens com uma câmera super-8 durante o filme e chega a enviar um vídeo relatando sua estadia na Inglaterra pouco antes de o pai ser levado para a morte. A adição das filmagens foi uma ferramenta para dar mais destaque às memórias da família.

Professora no livro de suspeitos

Eunice Paiva ficou doze dias presa no DOI-Codi. Interrogada diversas vezes, ela foi obrigada a encarar um livro com a foto de procurados e presos políticos, a fim de ceder e apontar algum conhecido. No filme, a esposa de Rubens identifica a professora das filhas entre as fotos, mas diz não saber o que ela estava fazendo ali. O agente, então, segue contando que a mulher foi pega com cartas para Rubens ao voltar de uma viagem do Chile em que visitara exilados.

Na vida real, Eunice também precisou encarar o livro de fotos, mas não cedeu. “Minha mãe identificou a foto da professora das minhas irmãs, Cecília, no álbum de presos. Mas não disse nada”, escreveu Marcelo em seu livro de memórias. Meses depois, em junho de 1971, Cecília enviou a Eunice uma carta — que é reproduzida em detalhes no filme –, na qual contava que ficou presa com Rubens no DOI-Codi e que ouviu o ex-deputado repetir o próprio nome e clamar por água, outra testemunha da prisão do ex-deputado.

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