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É Tudo História

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O que é fato e ficção em filmes e séries baseados em casos reais
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O que é verdade e o que é ficção na Hollywood de Ryan Murphy

Série imagina como seria a vida de Rock Hudson, Anna May Wong e outras minorias se a indústria cinematográfica tivesse ido por caminhos mais gentis em 1940

Por Amanda Capuano Atualizado em 22 Maio 2020, 11h13 - Publicado em 22 Maio 2020, 09h23
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  • Depois de aventurar-se pelo mundo dos musicais, crimes reais e sátiras políticas, Ryan Murphy mergulhou na história do cinema em Hollywood, produção com o selo Netflix. Como seria Hollywood se, nos anos de 1940, negros pudessem protagonizar blockbusters, astros não precisassem esconder a homossexualidade e minorias não fossem reduzidas a estereótipos? Essas questões fundam as estruturas da Hollywood dos sonhos de Murphy — uma utopia com ares críticos, que mescla realidade e ficção, para imaginar como teria se desenrolado a vida de nomes conhecidos do cinema se tudo tivesse acontecido de forma diferente na cidade dos sonhos.

    Confira o que é real e o que é ficção na série:

    Jack Castello não existiu, mas é um combo de galãs conhecidos

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    David Corenswet como Jack Castello em cena de Hollywood (Reprodução/VEJA)

    A série acompanha o veterano de guerra Jack Castello em sua jornada ao estrelato na Hollywood dos anos 1940. Mas o aspirante a galã, interpretado por David Corenswet, nunca existiu de fato. Apesar de ficcional, o ator revelou ao site Entertainment Weekly que para compor o protagonista, Murphy baseou-se em três figuras bem conhecidas do público: os galãs Marlon Brando, Montgomery Clift e James Dean, que revolucionaram os padrões de masculinidade “bruta” nas produções hollywoodianas.

    Escapadinhas no posto de gasolina

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    Ernie West em frente ao famoso trailer do Golden Tips (Reprodução/VEJA)

    Quando Jack (David Corenswet) aceita a proposta de Ernie West (Dylan McDermott) para trabalhar no Gas Tip, não imaginava que o posto de gasolina vendia bem mais do que combustível. O estabelecimento, na verdade, é um prostíbulo disfarçado, cuja especialidade é fornecer a figurões de Hollywood homens dispostos a satisfazer seus anseios sexuais em segredo — já que muitos deles viviam no armário. Embora pareça hollywoodiano demais, o local realmente existiu, mas o nome do posto era Richfield. O local era gerenciado por Scotty Bowers, figura real que serviu de inspiração para Ernie. Em seu livro de memórias, Full Service, ele detalha a história do “negócio”, que começou com um trailer estacionado nos fundos do posto e atraiu clientes como Rock Hudson, Cole Porter e George Cukor, mencionados na série.

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    Rock Hudson, o astro no armário

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    Rock Hudson (Jake Picking) com o namorado Archie Coleman (Jeremy Pope) ao fundo (Reprodução/VEJA)

    Quando Rock Hudson (Jake Picking) surge na estreia de Meg de braços dados com o roteirista Archie Coleman (Jeremy Pope), fotógrafos se recusam a fotografá-los e ouve-se burburinhos e vaias da multidão. Apesar disso, o astro não hesita em revelar o romance e parece radiante com a decisão. Na vida real, no entanto, a história de Rock Hudson é bem mais triste. O ator, de fato, ganhou o nome artístico ao se tornar cliente de Henry Willson (na série, interpretado por Jim Parsons) e até o tratamento dentário a que o agente o submete é real, assim como o seu desastroso primeiro teste. Mas o galã passou a vida toda no armário e, apesar dos boatos existirem anteriormente, sua homossexualidade só foi revelada ao mundo pouco antes de sua morte, em 1985, quando tornou-se a primeira celebridade a assumir publicamente a luta contra a Aids — que na época, acreditava-se, erroneamente, ser uma doença restrita a homens gays. “Ninguém com uma mente sã sairia do armário. Era a morte da carreira. Todos fingíamos ser heterossexuais”, revelou Lee Garlington, tido como o grande amor do astro, em entrevista à revista People.

    Negro ganha Oscar, mas não senta com os brancos na cerimônia

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    Queen Latifah em cena como Hattie McDaniel (Reprodução/VEJA)

    Em uma cena emocionante do último episódio de Hollywood, Hattie McDaniel — vivida brilhantemente por Queen Latifah — relembra a noite em que tornou-se a primeira mulher negra a ganhar um Oscar. Em uma conversa com Camille Washington (Laura Harrier), ela conta que foi impedida de entrar no teatro para assistir à cerimônia e, depois de esperar no saguão, foi colocada para dentro apenas momentos antes de anunciarem seu nome como vencedora. Na vida real, a história é bem parecida. Em 1940, Hattie McDaniel foi indicada para a cobiçada premiação por seu trabalho como a empregada doméstica Mammy, no clássico …E o Vento Levou. As leis de segregação racial ainda estavam em voga nos Estados Unidos e, inicialmente, ela foi impedida de comparecer à cerimônia. Por estar entre os indicados, uma autorização permitiu sua presença — desde que em uma mesa à parte no fundo do salão, afastada de todas a estrelas brancas. Assim como conta na série, ela só apareceu diante do público no momento de receber a estatueta, empossada com um discurso emocionado.

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    O fim trágico de Peg Entwistle é real 

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    Letreiro construído para o filme Meg em Hollywood (Reprodução/VEJA)

    A história trágica de Peg Entwistle infelizmente aconteceu. Seu nome verdadeiro era Millicent Lilian Entwistle, mas a aspirante a atriz escolheu “Peg” como alcunha para o estrelato que nunca chegou a conquistar. Em 16 de setembro de 1932, aos 24 anos, ceifou a própria vida ao saltar da letra “H” do famoso letreiro de Hollywood, em Los Angeles, que na época ainda era Hollywoodland. Mas o filme sobre a sua morte trágica, Peg – que depois foi renomeado como Meg, e é o centro da trama de Hollywood – nunca foi produzido. 

    O teste perfeito não foi suficiente para Anna May Wong

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    Michelle Krusiec como Anna May Wong durante cena de Hollywood (Reprodução/VEJA)

    Em 1935, começaram os testes para a adaptação cinematográfica do best-seller The Good Earth — que rendeu à autora Pearl S. Buck um Pulitzer em 1932. Anna May Wong, a primeira estrela de ascendência chinesa de Hollywood, era a mais cotada para dar vida à ex-escrava O-Lan, no que seria o seu primeiro papel não estereotipado até então. Segundo o livro Perpetually Cool: The Many Lives of Anna May Wong, a atriz fez diversas audições para o papel, mas foi descartada pelo produtor Albert Lewin, que afirmou que ela merecia consideração pela interpretação, mas não era suficientemente bonita. Em entrevista à Vanity Fair, o produtor de Hollywood, Ryan Murphy, afirmou que “seu teste foi tão bom que fez homens adultos chorarem”. Apesar disso, como retratado na produção, Anna May (vivida por Michelle Krusiec na série) foi preterida pela alemã Luise Rainer, que deu vida a O-Lan abusando do yellowface (uso de maquiagem para forçar uma aparência asiática) — e foi recompensada com um Oscar de melhor atriz pelo trabalho. Já Anna May Wong, ao contrário do final feliz imaginado por Murphy — que deu a ela um Oscar por Meg —  seguiu com o alcoolismo e morreu de infarto, aos 56 anos, sem nunca ter sido sequer indicada a uma estatueta.

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    Censura hollywoodiana

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    Filme queimado pelos censores (Reprodução/VEJA)

    Nos anos de 1920, uma série de polêmicas e escândalos em Hollywood levou à criação da Associação de Produtores e Distribuidores de Filmes da América, presidida pelo presbiteriano Will H. Hays, para melhorar a imagem da indústria hollywoodiana perante a sociedade americana. No início da década, todas as produções já passavam pelo crivo moral de Hays, mas em 1930, as regras de censura foram oficializadas no código batizado com o seu sobrenome. Daí até 1966, as produções que se enquadravam nas regras recebiam um selo de aprovação, enquanto as renegadas não eram distribuídas pelo órgão e amargavam prejuízos comerciais dolorosos — além de uma multa de 25.000 dólares aos estúdios rebeldes. Na série de Murphy, a cartilha conservadora é citada exaustivamente por proibir casais inter-raciais nas telas — o que impedia o protagonismo das minorias. A regra, de fato, existiu, e era uma das principais proibições do código, que impedia ainda nudez, piada com religiosos ou funcionários públicos, referência a doenças venéreas, romantização de vícios, detalhes de ações criminosas, dentre outros conservadorismos.

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