‘Lobisomem’ faz terror sobre ‘machos-alfa’, mas mais late do que morde
Filme de terror estrelado por Julia Garner e Christopher Abbott recupera o monstro do Universal Studios para história sobre família em crise

Em 1941, o ator húngaro Béla Lugosi largou o traje de Drácula, se vestiu de cigano e abocanhou Lon Chaney em frente às câmeras do estúdio Universal, dando origem ao que seria O Lobisomem, um dos vários monstros clássicos do estúdio — mas longe de ser o mais famoso. Eclipsado pelo colega vampírico e pelo monstro de Frankenstein, a figura não resultou em tantas produções cinematográficas de sucesso massivo. Para o diretor Leigh Whannell, porém, o desafio de lhe dedicar um novo blockbuster parecia apropriado após O Homem Invisível (2020), com o qual brilhou ao trazer outro dos protagonistas sobrenaturais da empresa para um público contemporâneo. Nasceu assim Lobisomem, que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, 16 de janeiro.
Desta vez, quem passa pela transformação é o escritor Blake (Christopher Abbott), que fica em casa cuidando da filha pequena Ginger (Matilda Firth), enquanto a esposa Charlotte (Julia Garner) garante o sustento da casa como jornalista. Criado por um pai severo no interior de Oregon, o protagonista cresceu com medo do genitor e decidiu jamais exercer a mesma influência sobre outra pessoa. Inofensivo, vive na cidade e não liga para papéis de gênero. Após a confirmação da morte do pai, porém, tem que voltar para a casa onde cresceu. No caminho, passa por um acidente de carro na floresta e é mordido por uma criatura misteriosa, iniciando uma metamorfose grotesca que transformará sua personalidade, força e dieta.
Em 2025, a sinopse é oportuna. Mesmo que mulheres corram com os lobos segundo a autoajuda feminina, nunca antes homens utilizaram tantas denominações lupinas para reafirmar sua virilidade graças a coaches como Andrew Tate, que instigam massas de seguidores com o sonho da identidade “alfa”. Para seus discípulos, a violência masculina imposta é sinal de honra e ancestralidade, danem-se as mulheres ao redor e os parceiros de gênero mais fracos, chamados “betas” ou “ômegas”. O lobo selvagem seria a essência do homem e a domesticidade, aberração. Reside nesta ideia a maior força de Lobisomem, que a rebate com elegância. Por meio da estrutura do horror, Whannell demonstra uma família saudável corroída pela retomada de uma figura paterna agressiva. O argumento é sofisticado, a execução, tacanha.
Promissora, a trama é prejudicada por uma direção letárgica, que se limita a espaços escuros e melancolia incessante. Um momento delicado entre lobisomem e vítima é suficiente para comunicar a tragédia que acomete o clã, mas o efeito perde a força a cada repetição. Enquanto O Homem Invisível esbanjava dinamismo lacerante, Lobisomem é só soturno e parece pouco interessado no gênero do horror, sem ao menos oferecer uma boa cena de transformação — sacrilégio para o cânone de homens-lobos do cinema.
Sob muita maquiagem, Abbott se mostra capaz, mas não escapa da monotonia. Garner, por sua vez, tem que trabalhar dentro dos parâmetros genéricos de esposa hollywoodiana — independente, mas ainda afável e amorosa, jamais incongruente com o dever de mãe. Apesar de se dedicar a uma mudança de paradigma, Lobisomem tem tanto medo de surpresas que deixa de provocá-lo no público. Mais fácil se arrepiar com uma placa de “cão bravo”.
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