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Incêndios florestais mudam o canto de pássaros, mostra estudo

Pesquisa realizada na Califórnia mostrou que as transformações na floresta interferem na forma como os pássaros desenvolvem os sons

Por Jennifer Ann Thomas Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 16 jun 2020, 14h07 - Publicado em 16 jun 2020, 09h34
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  • No mundo dos pássaros, os cantos são a forma de conquistar uma parceira ou de espantar um rival. Seja na guerra ou no amor, os sons transmitem importantes mensagens para a sobrevivência de uma espécie. Na Califórnia, nos Estados Unidos, um grupo de pesquisadores do Departamento de Pesca e Vida Selvagem gravou os cantos da espécie conhecida como mariquita-eremita (ou Setophaga occidentalis, o nome científico) e criou o primeiro conjunto de descrição e mapeamento dos sons. Cada indivíduo aprende o canto da espécie por imitação, o que pode fazer com que grupos distintos tenham variações culturais — como expressões e sotaques em português de diferentes regiões do Brasil. As canções foram divididas em 35 dialetos. Em 2019, os cientistas voltaram a dez áreas que haviam sido estudadas e analisaram os impactos causados por incêndios florestais.

    Enquanto no Brasil as queimadas remetem à prática de crimes ambientais na Amazônia, na Califórnia o fogo faz parte do ciclo do ecossistema. Ele é um mecanismo natural para a renovação das florestas. Por isso, a mudança que ocorreu no canto não representa, necessariamente, algo ruim. Contudo, com a interferência de mudanças climáticas e da ocupação humana, incêndios de grandes proporções, como a temporada de 2018 na Califórnia, a mais destrutiva da história, geram impactos negativos. De acordo com a bióloga do Observatório de Aves da Mantiqueira (OAMa), Luiza Figueira, a urbanização interferiu no ciclo natural do habitat. “O fogo foi suprimido durante anos e isso gerou um acúmulo de combustível, a matéria orgânica. Durante uma temporada muito seca, com tempestades mais fortes e incidência de raios, não há como evitar o incêndio e a proporção é muito maior”, explicou.

    Com dados coletados desde 2009, os pesquisadores perceberam que a diversidade de sons aumentava em áreas que haviam sido atingidas pelos incêndios florestais. Os resultados mostraram que três fatores impactaram nas canções: as queimadas, o efeito em massa de dispersão de pássaros, que abre espaço para indivíduos de outros grupos inserirem seus dialetos, e o intervalo de tempo. “A espécie é migratória. O fogo causa uma ruptura com a saída dos pássaros que não conseguem mais viver no local que foi destruído. Depois de alguns anos, eles podem voltar e existe um dialeto diferente”, explicou Luiza. Para a bióloga, a característica da ave é outro ponto que se diferencia da Amazônia. “Não existe queimada natural na Amazônia. Como as espécies não estão acostumadas com a dinâmica do fogo, o impacto pode ser maior. Além disso, elas não são migratórias. Quando a queimada acontece, ela destrói a ‘casa’ definitiva dos indivíduos”, explicou.

    Segundo os pesquisadores, a mariquita-eremita parece ser especialmente sensível ao fogo durante períodos de tempo mais curtos. No primeiro momento, o pássaro é impactado negativamente após os incêndios, mas reage positivamente no longo prazo, pois a floresta se reestrutura e há aumento na população de insetos. No caso da mariquita-eremita, o canto para a reprodução segue uma fórmula simples. Quando se trata de defender o território, os sons se tornam mais complexos, como se fosse literalmente uma disputa para ver quem sairá vencedor. Normalmente, uma única canção é dominante dentro de um determinado território.

    De acordo com o autor principal do estudo, Brett Furnas, a pesquisa sugeriu que os dialetos aumentaram em populações em diferentes tipos de florestas. “No longo prazo, o fogo causou a fuga de alguns pássaros e criou um vácuo sonoro para ser preenchido por outras aves. O resultado foi que algumas áreas têm pássaros cantando mais de um dialeto, resultando em uma complexa diversidade de sons na Califórnia”, afirmou. Entre 2009 e 2014, os cientistas gravaram 1.588 machos ao longo de 101 áreas de estudo.

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