É dia de filmão: cinco sugestões para ver na Netflix
De “O Nome da Rosa” a “A Missão”, bons filmes dos anos 80 que andavam meio sumidos
O Nome da Rosa (1986)
Na primeira metade da década de 80, todo mundo (quase não é exagero) leu o romance de estreia do ensaísta italiano Umberto Eco, sem nem querer esperar pela inevitável adaptação para o cinema – que coube ao francês Jean-Jacques Annaud, vindo então do sensacional A Guerra do Fogo. Caprichando nas locações medievais e na sujeira típica (que dá um novo sentido à expressão “idade das trevas”), Annaud fez um ótimo trabalho de condensar os revolteios do enredo policial muito saboroso e muito erudito, passado num mosteiro em que, repentinamente, a taxa de homicídios dispara para níveis de morro carioca. Um forasteiro, o monge cético, cínico e lógico Guilherme de Baskerville (Sean Connery, encarnando um excelente Sherlock Holmes de batina), é o encarregado de investigar os crimes e, de quebra, lidar com a Inquisição.
Tempo de Glória (1989)
A carreira de Denzel Washington disparou com esta história ao mesmo tempo comovente e cruamente violenta de um destacamento de negros libertos ou foragidos que, comandadados por um jovem e inexperiente oficial branco (Matthew Broderick), luta na Guerra Civil americana de 1861-1865 pelo lado da União, o Norte antiescravagista – mas é tão odiado pelos próprios nortistas quantos pelos Confederados sulistas. Sob a direção vigorosa de Edward Zwick (de Diamante de Sangue), Broderick, Washington e grandes atores como Morgan Freeman e Andre Braugher reencenam a ação que afinal tornaria célebre o 54º Regimento de Infantaria – um ataque suicida, morro acima e lama adentro, sob um poder de fogo fulminante.
Wall Street – Poder e Cobiça (1987)
“A ganância é boa”, diz o tubarão das finanças Gordon Gekko, em desempenho antológico de Michael Douglas, neste que é um dos grandes filmes da carreira do diretor Oliver Stone. Com sua história de homens viciados em dinheiro e em poder, Wall Street é o filme-síntese de uma década ela própria viciada em riqueza e ambição. A fábula de Stone calhou de se encaixar no momento mais relevante possível: foi rodada enquanto a economia mundial estava em um pico vertiginoso, e chegou aos cinemas algumas semanas depois de ela ter se atirado no despenhadeiro – o do violento crash de outubro de 1987. Ainda aturdida pelo tumulto geral, a plateia sentia na pele, com todas as cargas positivas e negativas de eletricidade, a emoção e a insensatez da ganância. Stone filma com voluptuosidade a trama sobre o corretor de valores novato, vivido por Charlie Sheen, que se deslumbra com as prestidigitações financeiras de Gekko. Mesmo tudo o que o filme tem de datado – as telas de computador arcaicas, os celulares enormes, os penteados pavorosos e as camisas de colarinho redondo – não consegue roubar da urgência que ele transmite.
Uma Janela para o Amor (1985)
O diretor (americano!) James Ivory dominou o segmento do “filme de bom gosto” nos anos 80 e início dos 90, com suas adaptações suntuosas de obras da literatura inglesa – como Maurice, Retorno a Howards End, Vestígios do Dia e este delicioso Uma Janela para o Amor, baseado no romance A Room with a View, de E. M. Forster. Na Florença do início do século 20, onde os ingleses iam se embriagar com a beleza e a paixão das latitudes mais ensolaradas, a jovem Lucy Honeychurch (Helena Bonham Carter, novinha de tudo) tenta se desprender das atenções aflitas de sua prima de meia-idade (Maggie Smith, toda pudor e excitação). Sua chance vem na oportunidade de trocar de quarto na pensão com excêntricos pai e filho (Denholm Elliot e Julian Sands), que continuarão a amizade meio deslocada na volta à Inglaterra, onde Lucy, teimosa, insiste na ideia de se casar com o tolo e pomposo Cecil (Daniel Day-Lewis, antes de ser “o” Daniel Day-Lewis). Filme de mulherzinha, sim, mas com honra.
A Missão (1986)
No meio da elétrica e vibrante produção dos anos 80, A Missão, com seus enquadramentos majestosos e ritmo ora contemplativo, ora tomado por transes de violência, não fez tão bonito quanto faz hoje em dia, em que volta a ser compensador apreciá-lo. Na história concebida pelo grande roteirista Robert Bolt (de Lawrence da Arábia, Doutor Jivago, O Homem que Não Vendeu Sua Alma e… precisa mais?), dirigida com convicção por Roland Joffé e passada nas selvas sul-americanas do século 17, os reveses sofridos por um capitão-do-mato truculento (Robert De Niro) fazem com que ele se transfira para as fileiras dos seus antigos inimigos – padres jesuítas como os interpretados por Jeremy Irons e Liam Neeson, que tentam impedir a escravização em massa dos indígenas pelos portugueses. É grandiloquente, sim. Mas é também grandioso e muito bonito, com um olhar para a natureza que impregna o filme com a sensação das coisas perdidas para sempre.