Ou, Amy Schumer, a comediante da moda X Melissa McCarthy, a comediante de verdade.
Amy Schumer dificilmente poderia ser acusada de modéstia: quando o assunto é ela mesma (e, com Amy, o assunto sempre é ela mesma), ela é adepta da doutrina do preemptive strike, ou “ataque preventivo”, celebrizada durante a Guerra do Iraque – a melhor defesa é a ofensiva, e a melhor ofensiva é aquela que se faz antes que alguém pense em atacar.
Em outras palavras: Amy é aquele tipo de pessoa que já sai fazendo todos os melhores elogios a si própria como forma de neutralizar possíveis críticas. Segundo Amy, a comédia que ela faz é “destemida” e “não tem barreiras”, e ela própria é uma “feminista intransigente”. Discordo um tantinho. O que Amy faz, no seu programa Inside Amy Schumer, no Comedy Central, e no longa Descompensada, que aqui sai diretamente em DVD, é se pintar como a garota que transa com todos (mas nunca duas vezes com o mesmo cara: questão de princípios), bebe até entrar em coma, ingere todo tipo de pó e comprimido e fala todos os palavrões – e daí diz, está vendo, sou uma mulher liberada e que, ainda por cima, afronta os padrões de beleza (não é bem assim: Amy apenas tem curvas, em vez daquela cara de esfomeada que se exige hoje em dia). Quanto à primeira parte, a de enfiar o pé na jaca, nenhum problema: cada um faz o que quer, e é material farto para uma persona cômica. Já caracterizar isso como trangressão feminista ou “pós-feminista” – aí já é pedir demais da boa vontade alheia. Até porque em Descompensada, que é dirigido pelo Judd Apatow, o dilema de Amy está em rever seu comportamento e aceitar que se apaixonou por um cara legal, interpretado por Bill Hader. Tudo que eu ouvi no filme foi “eu”, “eu”, “eu” e “eu”. Amy é um pouco menos estridente que Lena Durham, mas se acha tão espetacular quanto ela, o que em geral é um traço de personalidade dos mais antipáticos.
Já Melissa McCarthy – aí a história é outra. Quer ver uma comediante abrir mão do ego completamente, sem nenhum medo de expor tudo aquilo que as pessoas, no dia a dia, sem nem pensar, ridicularizam sem dó? E que, além disso, de fato tem um timing cômico sensacional e uma capacidade de improviso extraordinária? Então veja A Espiã que Sabia de Menos, em que Melissa faz uma analista da CIA, gorducha e de meia-idade, que vai fazer sua primeira missão em campo e descobre que não serve só para ficar no porão do quartel-general de Langley. Melissa faz aquela comédia tirada do desespero que Jim Carrey fazia nos seus melhores momentos, com um dinamismo e uma versatilidade, e uma vontade de bater bola com os outros atores que contracenam com ela – Jude Law, Jason Statham, Rose Byrne, o ótimo Peter Serafinowicz –, que são as marcas dos grandes comediantes. Aliás, é redutivo chamar Melissa de comediante: em A Espiã que sabia de Menos ou, por exemplo, em Mike & Molly ou Um Santo Vizinho, com Bill Murray, o que ela faz é tratar de tragédias. Só o que muda é o contexto – que às vezes é cômico, outras vezes não.
Trailers
Continua após a publicidadeA ESPIÃ QUE SABIA DE MENOS(Spy)Estados Unidos, 2015Direção: Paul FeigCom Melissa McCarthy, Rose Byrne, Jude Law, Jason Statham, Miranda Hart, Allison Janney, Peter Serafinowicz, Bobby CannavaleContinua após a publicidadeDistribuição: FoxDESCOMPENSADA(Trainwreck)Continua após a publicidadeEstados Unidos, 2015Direção: Judd ApatowCom Amy Schumer, Bill Hader, Brie Larson, Tilda Swinton, LeBron JamesDistribuição: Universal