Aos 27 anos e ator desde os 10, quando fez um papel em Peter Pan, o londrino George MacKay é o centro de 1917, com um desempenho memorável que combina resistência física e emoção contida, mas intensa. Ele contou a VEJA como foi participar do processo singular idealizado pelo diretor Sam Mendes.
Nunca se viu um filme em que as dimensões físicas e a disposição geográfica dos cenários fossem definidas pelo tempo dos diálogos, e em que os atores tenham colaborado tão de perto com a equipe técnica. Como foi participar dessa experiência? Por inacreditável que pareça, foi muito gradual e também confortável, mais ou menos como construir uma casa em equipe. Primeiro implantamos as fundações, depois levantamos as paredes, então construímos o telhado, cuidamos dos acabamentos — e aí fomos morar na casa. O que é realmente interessante é que os vários departamentos da filmagem não estavam prestando serviços uns aos outros, mas sim chegando juntos às decisões. Atores, câmeras, figurinistas, construtores, técnicos de áudio — todos trabalhamos ombro a ombro, e todos opinamos no trabalho uns dos outros.
A intensidade emocional exigida de você e de Dean-Charles Chapman é imensa. Ao mesmo tempo, as marcações de cena eram de uma dificuldade extraordinária. Como conciliar essas duas demandas enquanto a câmera está rodando e nenhum erro pode ser cometido? Sem exagero, baixava uma euforia quando a ação começava. Depois de tantos meses ensaiando, a fisicalidade de cada cena já tinha virado uma espécie de segunda natureza — e, com ela, o estado emocional e psicológico vinha naturalmente também. Pode parecer um paradoxo, já que o trabalho de um ator é convocar determinadas emoções em um certo momento, mas descobri que o melhor era não tentar demais, e sim me deixar levar. Só um porém: cometemos muitos erros, sim. Alguns deles — uns poucos — ficaram tão bons que entraram na montagem final.
Sam Mendes se inspirou no avô dele, que foi mensageiro nas trincheiras da I Guerra. Fazer este filme neste momento também seria um comentário dele sobre a realidade atual? O clima que se vive no mundo traz à mente as circunstâncias que desembocaram na I Guerra, mas Sam não falou sobre isso conosco, e entendo por quê. Chamar a atenção para implicações sociais ou políticas reduziria o filme em vez de ampliá-lo: é quando se é lançado na experiência de ver o filme, sem distrações de qualquer ordem, que 1917 funciona na plenitude.
Esse método incomum de trabalho mudou algo na sua maneira de encarar o ofício de ator? Nós, atores, em geral nos prendemos demais à ideia de que esse é um trabalho que tem de ser feito em isolamento para reter certa pureza, sem se misturar além do necessário aos aspectos técnicos envolvidos em um filme. Mas mudei totalmente de opinião, e não vejo mais muito sentido nessa hierarquia. Quanto mais se tem a chance de influenciar o filme em que se está, mais rica e tridimensional é a criação de um personagem.
Publicado em VEJA de 29 de janeiro de 2020, edição nº 2671