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Isabela Boscov

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Se você leva série a sério, Succession e Peaky Blinders são indispensáveis

Um clã bilionário se digladia na série da HBO, enquanto a série ultracult estrelada por Cillian Murphy pega pesado na Inglaterra pós I Guerra Mundial

Por Isabela Boscov Atualizado em 24 out 2019, 15h38 - Publicado em 24 out 2019, 15h00
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  • Minha irmã viu antes e me avisou: é épico. E foi mesmo; o final da segunda temporada de Succession, da HBO, entrou direto na minha lista de momentos antológicos da televisão. Revi três vezes seguidas, de cara, e vi mais duas vezes no dia seguinte. Devo rever pelo menos mais um par de vezes hoje, porque são raros os momentos em que desenvolvimento dramático, direção e atuações – que atuações! – convergem de maneira tão fulminante quanto aqui. Não veio de graça: com uma temporada inaugural muito boa e uma segunda temporada fortíssima, Succession é dessas séries que põem você para trabalhar junto com ela. Cada episódio exige atenção exclusiva; a trama é densa, os diálogos são extensos e intensos e há uma grande quantidade de personagens em cena – cada um deles indo em uma direção diferente. É um cabo-de-guerra permanente, enfim, entre Logan Roy (Brian Cox), magnata de mídia muito claramente inspirado na figura de Rupert Murdoch, do conglomerado Fox, e seus quatro filhos – mais um sortimento de executivos, agregados, esposas, maridos e desafetos (esses, às pencas, porque Roy é uma figura detestada não só no seu setor, mas no cenário nacional).

    Succession
    (HBO/Divulgação)

    Os Roy são bilionários. Seu negócio de comunicação é gigantesco, mas setores dele estão rapidamente se tornando ultrapassados; e Logan tem 80 anos – bem sacudidos –, mas começa a primeira temporada com um problema grave de saúde (como vaso ruim não quebra, ele vai se recuperar). Connor (Alan Ruck), seu filho do primeiro casamento, é um perfeito idiota. Do segundo casamento, ele tem três filhos: o caçula, Roman (Kieran Culkin) é inteligente e incrivelmente desagradável. Shiv (Sarah Snook), a do meio, até engana, mas é uma cobra. E então há Kendall (Jeremy Strong), o mais velho dessa trinca, que começa a série apontado como sucessor do pai no comando da corporação. Kendall é o único da família que não é uma pessoa péssima por natureza – ao contrário. Como se esforça muito para ser tão brutal quanto os outros, porque essa é a medida de mérito no clã, ele tem sérios problemas com drogas e uma relação tortuosa e sofridíssima com o pai, que conta entre seus maiores prazeres manipular os filhos, jogá-los uns contra os outros, montar armadilhas para ver o quão completamente eles caem nelas e mudar de favorito várias vezes na semana. Previsivelmente, então, os filhos cresceram moral e psicologicamente deformados. Mas, em um dos desempenhos mais impressionantes que já vi em uma série, de rivalizar com James Gandolfini em Família Soprano, Jeremy Strong torna Kendall a alma da série – até no sentido de que o que será feito da alma dele, a única que não está verdadeiramente perdida, é o eixo de Succession.

    Succession
    (HBO/Divulgação)

    Kendall está no centro dos acontecimentos da primeira temporada, e ela é uma paulada. E aí vem a segunda temporada, e enche todos esses personagens de matizes inesperados, que confundem o espectador e agravam a ambivalência que ele sente por cada um deles. Se todos continuassem apenas se mostrando aquela gente de deixar os Lannister no chinelo, como na primeira temporada, seria mais fácil – e não que eles deixem de ser como eram (de jeito nenhum), mas sentimentos complicados e críveis entram em jogo. Para mim, o efeito foi dilacerante, e fez as apostas dispararem. E então – o que é aquele final! Tenho Adam McKay e Will Ferrell em alta conta como produtores (e McKay, também como diretor, de A Grande Aposta e Vice), mas Succession coloca a dupla em outro patamar.

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    Peaky Blinders
    Paul Anderson, Cillian Murphy e Finn Cole em Peaky Blinders (Netflix/BBC/Divulgação)

    Se Succession está rapidamente se tornando cult, Peaky Blinders, agora uma parceria entre BBC e Netflix, já é há algum tempo objeto de devoção em certos círculos (nos quais eu me incluo); na Inglaterra, é uma febre. E a quinta temporada, que entrou na Netflix há duas semanas, agravou o vício dos dependentes, porque está ombro a ombro com a fabulosa temporada inaugural, de 2013. Começando pelo começo: Tommy Shelby (Cillian Murphy) voltou da I Guerra Mundial com raiva. Aliás, com mais raiva: em Birmingham, os irmãos Shelby, meio ciganos, são desde a infância conhecidos (e também temidos e desprezados) pelo pavio curto, pelos métodos violentos e pela arruaça. Tommy, porém, está decidido a subir na vida; quer, a qualquer custo, dominar o submundo das apostas na cidade. Mas, desde o momento em que ele aparece montado num cavalo nas vielas cobertas de fuligem da cidade, com Nick Cave cantando Red Right Hand naquela voz cavernosa, fica claro: Peaky Blinders não é uma visita de rotina ao universo dos gângsters. Com Cillian Murphy estraçalhando e no seu mais ameaçador, uma trilha sonora genial (toda contemporânea, embora a série até aqui abranja da década de 1910 à de 1930), um cenário muito diferente do habitual e cortes de cabelo de matar um hipster de inveja (raspado dos lados, uma incrível variedade de topetes em cima), a série já começa com sensação de sangue novo. Prossegue com surtos de violência e de intimidação acachapantes, e pega fogo quando entra em cena uma jovem agente undercover – Annabelle Wallis, de magnífico nariz romano.

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    Peaky Blinders
    Sam Claflin como Oswald Mosley (Netflix/BBC/Divulgação)

    Muito chão vai ser coberto desde essa situação inicial, e não há um momento sequer em que o percurso não valha a pena na série criada pelo inglês Steven Knight, roteirista do assombroso Senhores do Crime. Mas a quinta temporada é um incêndio: Tommy galgou alturas impressionantes, mas pela primeira vez vai sentir medo de verdade de alguém – de Oswald Mosley, aristocrata e membro do Parlamento que no início dos anos 30 fundou a União Britânica de Fascistas e teve sua festa de segundo casamento na casa de Joseph Goebbels, o ministro da Propaganda nazista, com Adolf Hitler como convidado de honra (ele era amigão, também, de Benito Mussolini). Mosley era carismático, lindo e um grande orador, e era também uma pessoa nefasta e aterrorizante. Peaky Blinders volta e meia faz isso de colocar figuras reais no meio de sua história fictícia, mas aqui se superou. Muito do mérito é de Sam Claflin, de Jogos Vorazes e Como Eu Era Antes de Você, que está magnífico no papel de Mosley – até nos mínimos detalhes, como a dicção e a prosódia, impecavelmente copiados de um demagogo típico da década de 30. O elenco de Peaky Blinders é todo ele excelente (destaque também para Paul Anderson como o irmão mais velho e muito doido de Tommy), mas Claflin é o primeiro a ir para a briga pau a pau com o estupendo Cillian Murphy. E, de novo: o que é esse final! Por sorte, Peaky Blinders está garantida até pelo menos a sétima temporada.

     

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