Jair Bolsonaro e Lula resolveram desconsiderar e desqualificar a vontade de parte expressiva do eleitorado que se declara insatisfeita com o atual cardápio de opções para as eleições presidenciais do ano que vem.
Não é pouca gente. Cerca de 40% dos eleitores têm classificado como “ruins” ou “péssimas” as alternativas listadas nas pesquisas para 2022, lideradas por Lula e Bolsonaro.
É clara indicação de fadiga com a persistência do clima de confusão política, no qual se estimulam o ex-presidente e o presidente-candidato. Como num jogo combinado, ambos adotaram a mesma postura de desdém.
“Terceira via? O povo não engole isso aí”, disse Bolsonaro, acrescentando: “Não existe terceira via. Está polarizado.”
Lula foi ainda menos suave em texto divulgado: “A terceira via é uma invenção dos partidos que não tem candidato. Falam em polarização… O que tem de um lado é democracia e do outro é fascismo. Quem está sem chance usa de desculpa a tal da terceira via.”
É legítimo que se defendam nessa etapa do processo eleitoral, cujo desfecho só vai acontecer em 14 meses. Têm todo o direito de preferir um ao outro, como demonstram.
Porém, nada lhes custaria demonstrar um pouco mais de respeito pela vontade de significativa parcela dos eleitores que, hoje, se dispõem a rejeitá-los por outro candidato — aparentemente, alguém situado no centro do espectro político.
Lula e Bolsonaro poderiam pedir aos seus aliados de Minas Gerais, o segundo maior colégio eleitoral do país, para contar algumas histórias — quase todas verdadeiras — sobre a elegância com que Tancredo Neves tratava eleitores de todas as cores.
Numa época de clássico Atlético x Cruzeiro, coisa sobre a qual mineiros não hesitam, jornalistas combinaram encostar o candidato Tancredo na parede:
— Para qual time o senhor vai torcer? — intimou, em tom suave, um dos repórteres.
O candidato não perdeu a chance: — Eu sou América, meu filho, mas gosto muito do Atlético, do Cruzeiro e de todos os nossos valorosos times do interior.