Com hesitações e erros, Bolsonaro provocou curto-circuito no bolsonarismo
Além do fracasso de alguns dos seus candidatos e do divisionismo que estimulou nos aliados, enfrenta dificuldades por causa da alta rejeição nas pesquisas
Jair Bolsonaro provocou um curto-circuito no bolsonarismo, como é conhecido o agrupamento que gira em torno dele desde a eleição presidencial de 2018.
Eis algumas das razões das críticas dos aliados:
• A tibieza que demonstrou na campanha eleitoral em São Paulo, com sucessivos movimentos erráticos em relação à candidatura do prefeito Ricardo Nunes, do MDB, que tenta a reeleição com um candidato a vice escolhido pelo próprio Bolsonaro;
• A hesitação, exibida em flerte público com o derrotado Pablo Marçal, do PRTB, está sendo creditada ao negacionismo de Bolsonaro sobre o sistema político-partidário, e não questões particulares com o prefeito paulistano.
O resultado foi um tiro no pé, seja qual for a motivação. Por um lado, deu alento à um personagem controverso, que encontrou na delinquência um meio de projeção na política. Quando Bolsonaro percebeu o erro, era tarde. Pablo Marçal já contestava a liderança que até então ele preservava intacta numa fração do eleitorado no maior colégio eleitoral do país.
• A derrota de ampla maioria dos candidatos que escolheu no interior do Estado de São Paulo. Dos 20 para os quais se empenhou na campanha, 14 perderam a batalha.
O frágil desempenho no interior somado à vacilação na disputa da capital, abriu um espaço logo ocupado pelo governador Tarcísio de Freitas, que consolidou sua autonomia.
• O fracasso na própria base, a cidade do Rio. Bolsonaro hesitou na escolha do seu candidato e acabou dividindo os aliados ao optar pelo deputado federal Alexandre Ramagem, delegado federal que chefiou a agência de informações (Abin) no seu governo. Concentrou em Ramagem um quarto do bolo de recursos (cerca de 26 milhões de reais) reservado pelo Partido Liberal ao financiamento de candidatos nas capitais.
Resultado: assistiu a uma devastação dos seus principais redutos eleitorais no Rio pelo adversário local, o prefeito Eduardo Paes, do PSD. Ele se reelegeu no primeiro turno com 60,47% dos votos válidos, contra 30,8% obtidos por Ramagem. Paes alcançou 72% em áreas da Zona Oeste, como Santa Cruz, Pedra de Guaratiba e Sepetiba, onde o ex-presidente sempre foi bem votado, ocasionalmente com sete em cada dez votos apurados.
• Provocou divisionismo, também, em colégios eleitorais relevantes no Centro Oeste. Em Goiânia, onde obteve 64% dos votos na disputa presidencial de 2022, entrou em rota de colisão com o governador Ronaldo Caiado, primeiro líder conservador a desafiar a pretensão de liderança hegemônica de Bolsonaro. Caiado planeja se candidatar à presidência em 2026 pelo partido União Brasil. O segundo turno na capital de Goiás será um duelo entre candidatos de Caiado e de Bolsonaro.
• Em Campo Grande, tropeçou nos próprios pés. Em 2022, saiu das urnas com 62% dos votos na capital do Mato Grosso do Sul. Nesta temporada eleitoral, fez um acordo para apoiar o candidato do partido Progressistas, sob comando regional de sua ex-ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Uma semana depois, anunciou apoio ao adversário do PSDB. O candidato de Bolsonaro ficou fora do segundo turno, que será disputado entre o PP e o União Brasil.
Bolsonaro está inelegível até 2030 e enfrenta dificuldades adicionais para montar sua agenda na reta final das eleições em meia centena de cidades. A principal é a elevada taxa de rejeição, estampada em diferentes pesquisas. Na cidade de São Paulo, por exemplo, beira os 60%. Em Fortaleza fica próxima dos 70%.