Prevê-se para esta semana, na Câmara, a votação de um projeto de lei para limitar os supersalários no serviço público.
No alvo está a elite da burocracia federal (cerca de 10% dos servidores), cujos ganhos são inflados artificialmente e ultrapassam o limite estabelecido na Constituição, de R$ 39,2 mil por mês.
Pelas contas do relator do projeto de lei, deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR), o corte nesse tipo de despesa com pessoal será de uns R$ 3 bilhões por ano. No Senado, calcula-se redução de até R$ 10 bilhões sobre a folha de pagamentos de União, que custou R$ 320 bilhões no ano passado.
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Essa diferença nas estimativas dos legisladores sobre o impacto financeiro na área federal confirma a folha de pessoal como um dos mistérios da República. Ela abrange 11,4 milhões de servidores ativos e inativos da União, dos Estados e dos Municípios.
Há pouca informação confiável, integrada e disponível sobre a gestão de pessoal nos três níveis da administração pública. Mas proliferam os indícios de balbúrdia promovida por interesses políticos e corporativos.
O governo federal, por exemplo, contabiliza 124 carreiras funcionais. No entanto, uma análise realizada pelo Banco Mundial no final de 2019, com dados de 25 ministérios, identificou 321 carreiras, gerenciadas a partir de 117 tabelas salariais.
Esse catálogo de pessoal possui, pelo menos, 179 formas de remuneração numa estrutura confusa replicada por Estados e Municípios, com peculiaridades. Foram identificados 405 tipos de gratificações, 167 delas “por desempenho”, extensíveis aos aposentados que, obviamente, não têm nenhum “desempenho” na prestação de serviços ao público pagante de impostos. São 105,5 mil os cargos federais de chefia.
A fragmentação funcional deriva, entre outras razões, da multiplicidade de carreiras sobrepostas nos Executivo, Legislativo e Judiciário federal e estaduais, com funções semelhantes e direcionadas especificamente a um ministério ou secretaria.
Essa confusão gerencial produziu uma elite burocrática: 44% dos servidores estão no topo da pirâmide de renda nacional, integrando a fatia dos 10% mais ricos.
Mais da metade desse grupo de elite do funcionalismo (53%) tem remuneração básica — sem penduricalhos— de até R$ 39,2 mil por mês. Em algumas carreiras, como as jurídicas, o salário de um iniciante ultrapassa R$ 20 mil mensais.
A nata da elite do funcionalismo (1%) vai além do limite constitucional, com supersalários, resultantes dos mais variados tipos de penduricalhos — gratificações, licenças-prêmio, auxílio-livro, diversos tipos de abonos de férias e até prêmios por tempo de serviço, ou seja, pelo fato do funcionário continuar no emprego.
Ano passado, durante a pandemia, as gratificações e os adicionais custaram R$ 317 milhões na folha do Ministério Público da União. Esses gastos foram recordes e não ocorreram por causa Covid-19, mas pelo pagamento de penduricalhos salariais, muito além do limite previsto na legislação sobre responsabilidade fiscal.
Como são despesas questionáveis, os procuradores federais foram ao Tribunal de Contas da União pedir que essas despesas não sejam consideradas remuneração, mas “verbas indenizatórias”. Ainda não há decisão. Se isso vier a acontecer, estima-se que uma bolada de R$ 5,4 bilhões atualmente pagos em gratificações e adicionais serão legitimados na folha de pessoal da União, com provável repercussão imediata nos Estados e nos Municípios.
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Os penduricalhos representam entre 15% (Alagoas) e 45% (Santa Catarina) da remuneração dos integrantes da elite da administração pública.
Esse tipo de distorção salarial acabou transformando os orçamentos públicos em instrumentos de iniquidade social. Em Alagoas, por exemplo, os supersalários proporcionam à casta de servidores renda média 60 vezes maior que a dos trabalhadores do setor privado, informa o Banco Mundial.
Com os supersalários, a casta da burocracia nacional transformou os orçamentos públicos em fábricas de iniquidades sociais.